“Para se discutir livremente deve-se arrebatar tempo e espaço aos imperativos sociais. Em suma, o diálogo é inseparável da luta. É inseparável materialmente (para falarmos devemo-nos subtrair ao tempo imposto e agarrar os espaços possíveis) e psicologicamente (os indivíduos adoram falar daquilo que fazem, pois só então as palavras transformam a realidade).” – Ai Ferri Corti
Nestes 3 anos desde o último Encontro Anarquista do Livro do Porto temos a impressão de que o mundo inverteu os seus pólos. Desde a “crise” pandêmica, que justificou e agravou a crise “endêmica” do capitalismo, à recente mobilização militarista dos impérios decadentes, parece ser difícil encontrar pontos de referência e momentos de discussão que fujam à polarização imposta a partir de cima.
Momentos como este demonstram, mais uma vez, a necessidade do debate contínuo entre indivíduos que partilham um mesmo projeto, uma mesma vontade, um mesmo ideal (apesar das diversas formas que ele possa assumir). Um debate que fuja à artificialidade do digital, principal responsável pela degradação da capacidade de análise (e pela consequente propagação de um consenso estéril), pela presente leviandade do que é dito e pela auto-suficiência ativista por trás de um ecrã.
Neste mundo que avança a passos largos para a completa desmaterialização da vida e onde os significados das palavras são constantemente manipulados na tentativa de apagar qualquer vestígio de um pensamento minimamente crítico, impõe-se a questão de fazer ou não sentido despender energia a organizar mais um Encontro Anarquista do Livro. Para nós a resposta é óbvia.
Porque continuamos a reconhecer a palavra escrita e impressa como parte de um arsenal a explorar, o livro como algo com potencialidade de nos abrir um vasto campo de debate que vai para além da discussão efêmera e fútil das redes sociais modernas e do imediatismo da opinião formatada pela propaganda midiática.
Porque através da leitura continuamos a encontrar, no passado e no presente do “sonho anarquista”, centenas e centenas de exemplos de companheiros e companheiras que nos inspiram e nos mostram que, apesar de todas as adversidades, sempre fomos capazes de desenvolver uma crítica e prática antiautoritárias contra este mundo, de planejar o assalto aos céus, sem nunca pedir autorização a nada nem ninguém. Exemplos inspiradores de quem pensou e agiu enquanto havia quem esperasse o amadurecimento das condições ideais!
Tendo como pressuposto a recusa da espera pelas ditas condições e valorizando, de certo modo, a criação de alternativas práticas que nos permitam sobreviver no sistema vigente no imediato, decidimos nesta edição alargar o Encontro do Livro a projetos de autoprodução. Projetos que vão desde a autonomia alimentar à impressão, mostrando que a vontade de emancipação se pode traduzir em opções válidas mesmo nos tempos sombrios que vivemos.
No entanto, somos conscientes que projetos baseados meramente num impulso de autonomia em relação ao mercado têm por definição certos limites e que podem, até mesmo, representar apenas uma solução confortável para criar somente mais um novo estilo de vida, deixando intacta toda a estrutura de dominação existente. Nesse sentido, o nosso objetivo ao incluir a questão da autoprodução é encontrar os pontos onde a vontade de autonomia e a necessidade de revolta e subversão se tocam.
Assim, vemos estes 2 dias como um espaço de debate claro entre companheiros e companheiras e como momento público de divulgação desse amplo espectro de ideias e práticas que constitui o “espaço anarquista” e o define como o movimento de negação multiforme para a subversão da ordem social e pela apropriação das nossas próprias vidas.
Estas Jornadas Anarquistas do Livro e da Autoprodução são, pois, uma tentativa de arrancar tempo e espaço ao quotidiano do poder, de os definir nos nossos próprios termos, de criarmos um momento de contágio. Um momento de encontro e debate pela criação de novas afinidades rebeldes e de reforço de laços antigos entre companheiros e companheiras, na esperança de acabarmos estes dois dias com motivações renovadas para enfrentar os tempos difíceis que já cá estão.
Contato: encontroanarquistaporto@riseup.net
FB: https://www.facebook.com/JAnarLAP/
agência de notícias anarquistas-ana
uma folha salta
o velho lago
pisca o olho
Alonso Alvarez
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!