“Agora, o governo declara que “os protestos da Geração Z causaram vítimas e danos à propriedade do Nepal”, culpando os “anarquistas” para se esquivar da responsabilidade.”

[Texto escrito em 09 de setembro de 2025]

Nos últimos dias, houve uma série de protestos no Nepal. Em todo o mundo, isso foi reduzido a uma resposta reacionária dos jovens a uma “proibição das redes sociais”. Isso é uma ofuscação superficial da situação real, que vem se acumulando há muito tempo em todo o país contra a corrupção, o nepotismo e a política autoritária que o povo vê no governo, que há 10 anos centraliza a sua base de poder e a infraestrutura política e suspende o processo democrático conforme a sua vontade.

A atual onda de protestos se transformou em uma revolta em resposta às tentativas do governo de silenciá-la brutalmente. A polícia passou de equipamentos antimotim e barricadas a canhões de água e balas de borracha, veículos militares e armas de fogo, resultando em assassinatos premeditados. O movimento é predominantemente de jovens, sendo que 19 já foram assassinados e mais de 400 gravemente feridos.

É claro que há os habituais protestos contra a “intervenção externa”, as “influências ocidentais” e os “infiltrados anárquicos que fazem o movimento parecer uma gangue” e assim por diante, comentários globais que procuram enquadrar a situação de maneira a servir aos seus interesses, geralmente provenientes de pessoas cuja imagem do Nepal se limita a uma grande colina, uns sherpas e umas vagas referências esotéricas efêmeras. Na verdade, as cenas dramáticas que agora se desenrolam são o resultado de anos de violência policial. Elas são orgânicas e pertencem ao povo do Nepal.

Com isso em mente, aqui está uma série de comunicações de camaradas da região.

Atualização do protesto da Geração Z no Nepal

Principais reivindicações: combate à corrupção, governança e liberdade de expressão. A mídia internacional, no entanto, se concentra somente nas proibições nas redes sociais.

1. A polícia agiu com brutalidade e atirou na cabeça e no peito dos estudantes da Geração Z, em protesto silencioso ontem. Até o último relatório, 19 mortos, mais de 50 em estado crítico, além de muitos feridos.

2. Ontem à noite, governo suspendeu as redes sociais.

3. O ministro do Interior renunciou, assim como alguns outros ministros do governo de coalizão que representam o Congresso Nepalês, o maior partido com 89 cadeiras. KP Sharma Oli, primeiro-ministro do Nepal, lidera o Partido Comunista do Nepal (Marxista-Leninista Unificado) (CPN-UML), o segundo maior partido, com 78 cadeiras.

4. Foi imposto toque de recolher nas principais cidades do Nepal desde ontem à tarde. Jovens e pessoas continuam protestando em todo o Nepal, desafiando as ordens de toque de recolher e pedindo a renúncia do primeiro-ministro KP Sharma Oli após a morte de estudantes inocentes.

5. A casa de Sher Bahadur Deuba (ex-primeiro-ministro) e presidente do Congresso Nepalês, o maior partido, foi atacada hoje de manhã por jovens em Katmandu.

6. A casa de Pushpa Kamal Dahal Prachanda (ex-primeiro-ministro) e presidente do Partido Comunista do Nepal (Centro Maoísta) foi atacada hoje de manhã. Ele é o líder do partido da oposição.

7. Postos policiais e escritórios de diferentes partidos políticos foram incendiados pela GenZ em todo o Nepal.

8. O número exato ainda não foi divulgado, mas houve muitos tiros. Além disso, a permissão era para o uso de balas de borracha, mas a polícia armada usou balas reais.

9. Mataram um menor, com uniforme escolar, com balas reais na cabeça e no peito. Isso não é só defesa. É uso excessivo da força.

10. Hoje também há protestos em alguns lugares, mas a grande área do município de Katmandu está sob toque de recolher desde ontem.

O Nepal está passando por uma crise política. A situação nos próximos dias é incerta. Perdemos tragicamente vidas inocentes que estavam exercendo direitos democráticos à liberdade de expressão e reunião pacífica. Precisamos, agora, do apoio da imprensa e da mídia internacionais, que escrevem falsamente que o protesto é contra a proibição das redes sociais, mas é contra a corrupção.

Atualização anônima

Em 5 de setembro de 2025, o governo do Nepal baniu 26 plataformas de mídia social, como Facebook, Instagram, WhatsApp, X, YouTube e Reddit, alegando que não seguiam a Diretiva para Regulamentar o Uso de Mídias Sociais, 2080 (2023/2024), para impedir o “discurso de ódio”. Sejamos honestos: isso foi feito para nos silenciar. As redes sociais são a nossa tábua de salvação, utilizadas por 70% dos jovens do Nepal. É assim que 2 milhões de trabalhadores no exterior conversam com as famílias, e jovens ganham dinheiro em um país com desemprego em massa. É como expomos a corrupção, como nos vídeos recentes nas redes sociais que expõem os filhos ricos dos políticos. Essa proibição é a respeito de controle, não é por segurança.

Hoje, 8 de setembro de 2025, milhares de jovens da Geração Z, estudantes e cidadãos desarmados marcharam pacificamente de Maitighar Mandala, em Katmandu, até o Parlamento, agitando bandeiras, carregando livros e segurando cartazes: “Acabem com a corrupção, não com as redes sociais”. Exigiam o fim da corrupção e da censura digital. O Estado respondeu com sangue. O chefe distrital Chhabi Rizal autorizou o uso de balas de borracha “para proteger a propriedade pública”, começando com canhões de água e cassetetes. Em seguida, desafiando as ordens, a polícia disparou munição real. Testemunhas oculares viram balas reais retiradas das vítimas, entre elas, um estudante atingido na cabeça vestindo farda escolar. Pelo menos 14 morreram, incluindo estudantes, muitos uniformizadas, e mais de 100 feridos.


É um assassinato sancionado pelo Estado. Atacar estudantes uniformizados viola as leis educacionais do Nepal estabelecidas pelas diretrizes do Ministério da Educação (2021), que declararam ilegal envolver crianças em comícios políticos, com o uniforme, uma vez que as escolas são “zonas de paz” sob políticas de proteção a menores. Enquanto os organizadores usavam as fardas para simbolizar a juventude, o governo os transformou em alvos, possível violação à Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.

Agora, o governo declara que “os protestos da Geração Z causaram vítimas e danos à propriedade do Nepal”, culpando os “anarquistas” para se esquivar da responsabilidade. Essa é a agenda vingativa para proteger a elite corrupta. Os pais esperam, aterrorizados, por filhos que nunca mais voltarão. Como este pode ser o nosso lar quando as ruas são campos de morte?

Isso é o que Louis Althusser afirmou na teoria do aparato repressivo do Estado (arE), em que, quando a propaganda falha, o Estado libera a polícia e o exército para nos silenciar, nos apresentando como ameaça, enquanto a corrupção se alastra.

> Foto: Prédio do parlamento nepalês em chamas.

Fonte: https://organisemagazine.org.uk/2025/09/09/nepal-communications-international/

Tradução > CF Puig

agência de notícias anarquistas-ana

Começo de chuva…
A tempestade faz festa,
no meio da rua.

Humberto del Maestro

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