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[Espanha] Entrevista a Aurora Van Echelpoel da CNT-Jerez

By A.N.A. on 29 de Dezembro de 2014

espanha-entrevista-a-aurora-van-1Pergunta > A CNT tem uma bonita história de lutas em Jerez que poucos lugares podem oferecer. Faça-nos um breve recorrido histórico com os momentos importantes.

Resposta < A história do anarcossindicalismo em Jerez começa antes mesmo da existência da CNT. Já nos tempos da Primeira Internacional, a classe operária jerezana se destacou por sua atividade societária, que agitou o campo e os círculos urbanos. Rapidamente o patronato e as autoridades tentaram acabar com esse movimento através da repressão policial e judicial, com os famosos processos da “Mano Negra (1884)” e de “Asalto Campesino em la ciudad (1892)”.

O movimento operário local conseguiu reorganizar-se, e em 1918 é criada a CNT de Jerez, associada à Federação Regional Operária Andaluza. É um momento central na história do anarcossindicalismo jerezano, que se verte no setor agrícola especialmente, em torno do líder do jornaleiro diarista Sebastián Oliva, que publica o periódico “A Voz do Campesino” para difundir as lutas. Mas também a CNT se estende em setores importantes, como o da indústria vinícola e o da construção.

Na década de 1930, os/as anarcossindicalistas jerezanos conseguem que a CNT seja a organização operária de massas, com dezenas de milhares de filiados na população, e com uma capacidade organizativa impressionante; prova disso foi a Greve “dos Caracóis”, que em 1932 paralisou Jerez durante mais de um mês em protesto pelas deportações de anarquistas a Guiné Equatorial (Bata). Em julho de 1936 a CNT foi aniquilada mediante os assassinatos e o terror fascista que todos conhecemos.

Em 1977 a CNT de Jerez se reorganiza, com uma importante presença inicial em empresas como a Fábrica de Garrafas e Adegas Domecq. A partir da década de 1990, a CNT passa a ter só um Sindicato de Ofícios Vários, mas centra sua ação no trabalho em rede com outros movimentos sociais, mantendo alguns focos de conflito em empresas de pequeno e médio porte.

Pergunta > A crise na que está afundada a cidade, serviu para fortalecer o sindicato?

Resposta < De algum modo sim. O aumento da precariedade, e o destroço dos direitos laborais ante as sucessivas reformas, converteu à classe trabalhadora jerezana em algo sumamente débil. Isso faz que agora se aproxime mais gente ao nosso sindicato para pedir assessoria e apoio com seus problemas. Aumentou algo a filiação, mas também a quantidade de tarefas que tem que abarcar.

Igualmente, os problemas sociais (habitacional, carestia de vida, exclusão social, etc.) se multiplicaram. Muitas pessoas afetadas por esses problemas vêm pedir nossa solidariedade, e tentamos transmitir nossa experiência de luta, mostrando-lhes o caminho da autogestão e da ação direta. Percebemos que muita desta gente já está autogestionando suas lutas.

Pergunta > A CNT denunciou sempre a figura do “liberado” sindical. Pode sobreviver um sindicato sem eles?

Resposta < Sim, claro, somos um exemplo disso. Somos 40.000 filiados/as em todo o território do Estado espanhol, que funcionamos sem delegados sindicais (liberados) e sem subvenções. Temos jornal próprio, assessorias jurídicas próprias, locais, uma fundação cultural (a Fundação Anselmo Lorenzo), cooperativas…

Pergunta > A CNT é uma estrutura independente e paralela ao Estado, é uma forma de viver.

Resposta < Um sindicato pode funcionar sem “liberados”, com a implicação direta de sua militância; com dificuldades quanto à dedicação pessoal, claro, mas ao mesmo tempo, com a tranquilidade de não deixar os assuntos dos/das trabalhadores/as nas mãos de nenhum “representante” que possa assinar ou fazer algo pelas costas de seus representados. Essa tem sido a opção histórica da CNT, a ação direta e o sindicalismo revolucionário, e quem não acredita neste mecanismo tem as outras opções sindicais baseadas no modelo reformista gerido pelo Estado.

Pergunta > CC.OO, UGT, o que te sugerem essas siglas…

Resposta < Que são exemplos vivo de degradação do sindicalismo, com estruturas totalmente corruptas e sem nenhuma visão ideológica de classe. Já faz muito tempo que deixaram de ser anticapitalistas, e não sabem mais funcionar sem subvenções. A participação brilha por sua ausência em seu seio, e ficaram presos no sindicalismo de “consulta”, esse impossível pacto com o Capital. Se parecem mais a empresas de gestão que a sindicatos, é um modelo clientelar (o/a trabalhador/a como cliente de um sindicato).

Pergunta > A CNT pede sempre a abstenção quando chegam às nomeações eleitorais, explique-nos porquê.

Resposta < Não acreditamos na democracia representativa, nessa estrutura política que nos obriga a votar para que alguns representantes gestionem nossas vidas. Preferimos gestionar (autogestionar) nossas próprias vidas.

Ademais, a experiência histórica e nossa consciência nos ensinam que o Poder corrompe, que os/as supostos/as representantes do povo vivem nas costas dele.

Os parlamentos, prefeituras, governos… não fazem outra coisa que perpetuar um modelo de democracia caduco: o da democracia liberal ou burguesa, que se demonstrou ineficiente para gestionar a crise. Nosso modelo é o da democracia direta: estender a autogestão a todos os campos, e que as assembleias sejam as que decidam.

Pergunta > O SOC e depois o SAT não herdaram de alguma maneira as heroicas lutas anarcossindicalistas de Andaluzia, sobretudo, do campo?

Resposta < Não acho, eles se apresentam a eleições sindicais, e não são anarcossindicalistas, senão nacionalistas andaluzes. Estão muito “politizados” (influenciados pelas dinâmicas de partidos políticos), a CNT é claramente uma opção antipartidarista.

De fato, todavía há seções sindicais do campo na CNT andaluza com força: em Pedrera, Fernán Núñez, Arahal…

Se é certo que há confluência com o SAT, especialmente nos últimos anos; estamos na unidade de ação, junto com outras organizações. Mas, entendemos que seu modelo é distinto.

Pergunta > Que conflito laboral está seguindo (e apoiando) neste momento?

Resposta < Estamos imersos em um conflito com a empresa elétrica Bersol, que é uma subcontratada da Endesa. Esta subcontratada despediu a todo seu pessoal, 14 trabalhadores, sem haver sub-rogado à nova empresa o que se fez com seu serviço. Também se reclamam folhas de pagamento não remuneradas.

Um caso parecido é o de Climartín, empresa especializada na instalação de vidros. Levou a cabo um ERE (expediente de regulação de emprego) que afetou a 12 trabalhadores, sem indenização alguma, e sem pagar folhas de pagamento atrasadas. Levam dois anos sofrendo atrasos e calotes. Este conflito estamos abarcando conjuntamente desde o sindicalismo alternativo: CNT, CGT e SAT de Jerez.

Pergunta > Pergunta para não iniciados. Explique as diferenças ideológicas com a CGT.

Resposta < Bom, a CGT é uma cisão da CNT. Até 1980, um setor da CNT decidiu arrancar pela opção de apresentar-se às Eleições Sindicais. Isso supôs que seus delegados sindicais puderam aceder a horas de “liberados/as”, ter algumas subvenções, maior representatividade, etc.

Pergunta > A CNT quis manter seu modelo de ação direta, que entende que é o mais coerente com o anarcossindicalismo.

Resposta < De todas formas, em que pese a polêmica com a CGT teve momentos fortes de desacordo, hoje em dia melhorou muito a relação com ela, e considero que estamos nas mesmas lutas, conservando a identidade de cada organização.

Fonte: noticiasdejered.es

Tradução > Caróu

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