> Entrevista realizada em maio de 2010.
Octavio Alberola é anarquista. Ele nasceu na Espanha, em Alaior, Ilhas Baleares, em 1928. Hoje reside em Perpignan, na França. Em 1939 chega ao México com seus pais. A partir daí começa sua militância anarquista. Atua nas Juventudes Libertárias e na CNT espanhola no México. Em 1962 forma parte do organismo clandestino “Defesa Interior” constituído pelo Movimento Libertário Espanhol depois do congresso da CNT de 1961. Atualmente participa do “Grupo pro revisão do processo Granado-Delgado” que, desde 1998, está exigindo a anulação das sentenças franquistas. Ele também faz parte do “Grupo de Apoio aos Libertários e Sindicalistas Independentes em Cuba”, GALSIC. Incansável, ele ainda colabora com outras iniciativas libertárias na Europa. É um homem cheio de histórias, escritas numa trajetória de vida libertária agitada e intensa. Algumas histórias ele expõe aqui, nessa entrevista concedida à ANA. Mas a sensação que fica ao dar por terminada esta conversa é a de que havia muitas coisas a ouvir ainda. Vamos a ele.
Agência de Notícias Anarquistas > Como que o anarquismo entrou na sua vida?
Octavio Alberola < Pois, sem dúvida, à medida que ia vivendo… com os meus pais, com os acontecimentos em que eles estavam envolvidos. Para ser mais direto, através das relações deles com os demais companheiros e companheiras, no seu trabalho enquanto professores racionalistas, de sofrer também as conseqüências da repressão que eles sofreram e, muito provavelmente, através das discussões, leituras e atos de propaganda que pouco a pouco fui compartilhando com eles e com os seus companheiros da CNT, tanto na Espanha como no exílio posteriormente: primeiro na França e depois no México. Também através das discussões com os meus companheiros de estudos sobre diferentes temas políticos, sociais e culturais e ao ter que me confrontar a disciplina autoritária do ensino na Escola Secundária e Preparatória de Jalapa, capital do estado de Veracruz da República mexicana. Embora, quem sabe, foi ao me mudar para a Cidade do México para iniciar os estudos universitários que as idéias anarquistas foram se aprofundando, mais pelo fato de participar na organização das Juventudes Libertárias mexicanas e poucos dias depois ter que dividir, com outros três jovens companheiros, uma cela (clandestina) na qual as autoridades mexicanas nos tiveram encarcerado, durante um mês após nos terem detido colando manifestos libertários nas ruas da Cidade do México.
ANA > Sua família era anarquista?
Octavio < O meu pai era filho de camponeses aragoneses emigrados para Barcelona nos anos 1899-90. Desde jovem freqüentou a Escola Moderna de Francisco Ferrer y Guardia. Conheceu a minha mãe em Olot, província de Girona, logo após uma greve em que conseguiram, pela primeira vez, as 48 horas de trabalho semanal. Foi deportado e em 1928 era professor racionalista da Escola laica de Alayor, Menorca, nas Ilhas Baleares, quando nasci. Em 1936, durante a sublevação militar, estava em Fraga, Aragão, como professor na escola racionalista da CNT e quando foi criado o Conselho de Aragão, a seguir ao 18 de julho, meu pai foi nomeado Conselheiro de Cultura. No final da guerra fomos para a França e depois para o exílio no México. Ali foi diretor do Colégio Cervantes na cidade de Jalapa, Estado de Veracruz. A minha mãe ajudou-o sempre no ensino racionalista.
ANA > Você se formou em que curso universitário?
Octavio < Na Faculdade de Engenharia da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) estudei o curso de Engenheiro Civil e na Faculdade de Ciências estudei Física Teórica.
ANA > Sua família hoje é anarquista?
Octavio < Tive quatro filhos, todos nascidos no México e, por causa da clandestinidade em que estive, entre 1962-1975, só quando já estavam grandes tive a oportunidade de voltar a estar com eles… Nenhum milita em organizações anarquistas, mas são de mentalidade antiautoritária e laica.
ANA > Foi no México que você teve os primeiros contatos com os anarquistas cubanos, ter relações com membros da ALC (Associação Libertária Cubana) e receber e ajudar exilados libertários que fugiam da ditadura de Batista por suas atividades clandestinas? Poderia falar um pouco desta época? Foi um período muito agitado, não?
Octavio < Em 1956 fui contatado pelos exilados cubanos no México e em particular pelos do Movimento 26 de Julho e Diretório Revolucionário Estudantil. Colaborei com eles até à queda da ditadura do general Batista. Foi, efetivamente, um período muito agitado que despertou muitas esperanças de poder realizar uma experiência de um socialismo com liberdade; com a institucionalização da revolução cubana em capitalismo de Estado e ditadura deixei de relacionar-me com os castristas. Em1961conheci vários libertários cubanos que haviam lutado na Sierra Maestra, mas não foi nessa altura, foi passado muitos anos que comecei a ter contato epistolar com os companheiros do Movimento Libertário Cubano (MLC). Estes contatos se concretizaram com a viagem de Frank Fernandez à Paris em 2000. Pouco antes havia contribuído para a criação do Grupo de Apoio aos Libertários e Sindicalistas Independentes em Cuba (GALSIC). Mas, desde o princípio dos anos noventa que tenho estado muito comprometido com os dissidentes cubanos de esquerda que chegaram na França. Nos finais dos anos noventa viajei a Cuba para levar ajuda aos chamados sindicatos e livrarias independentes que queriam organizar uma manifestação de mulheres de presos (as antecessoras das Damas de Branco) durante a reunião Ibero-americana de Chefes de Estado em Havana. Consegui a ajuda da SAC (Suécia) para realizar o documentário sobre o Sindicalismo em Cuba.
ANA > Quantos anos você tinha nessa época?
Octavio < Em 1956 tinha 28 anos.
ANA > Você disse que conheceu em 1961 vários libertários cubanos que lutaram na Sierra Maestra. Há anarquistas cubanos desta época ainda vivos?
Octavio < Dos três que vieram para o México, um voltou para Cuba (havia vindo em missão oficial) e os outros dois partiram para os Estados Unidos.
ANA > Entre estes exilados libertários que fugiam da ditadura de Batista havia muitas mulheres?
Octavio < Não, entre os exilados libertários que conheci no México (muito poucos) não havia mulheres.
ANA > Existe algum episódio que tenha te marcado mais fortemente nesses anos?
Octavio < Um episódio que nunca esqueci e que já sinalizava que era muito importante para o futuro… foi o confronto que tive num ato organizado em 1958 no Ateneu espanhol do México, com os membros do Movimento 26 de Julho, que quiseram impedir que um jovem negro do Diretório Revolucionário Estudantil, que acabava de sair clandestinamente da ilha, continuasse sua intervenção depois de ter denunciado o perigo do caudilhismo na luta contra a ditadura de Batista. Como era eu quem presidia à cerimônia, consegui que o jovem negro pudesse continuar com o microfone e terminar a sua intervenção. Foi uma bronca que antecipava o que seria a luta pelo Poder após a queda de Batista.
ANA > E qual foi o momento mais difícil neste período?
Octavio < O momento mais difícil foi quando as autoridades mexicanas me puseram sob vigilância (me seguiam vários agentes de carro…) com o pretexto de que eu poderia ser objeto de um atentado (da parte dos trujilistas) após o atentado que sofreu o venezuelano Betancourt. Claro que isto veio confirmar que estava sendo vigiado já há algum tempo… Depois, já na Europa, os momentos mais difíceis foram na ocasião das minhas três detenções (primeiro pelas autoridades belgas e depois pelas francesas em dois momentos).
ANA > Quais foram os motivos destas prisões na Bélgica e França? Você ficou muito tempo preso?
Octavio < Na Bélgica me detiveram com a minha companheira Ariane, em fevereiro de 1968, por denúncia da polícia franquista. A acusação foi de ter duas pistolas e documentação falsa… pois não mantiveram a acusação inicial de preparação do seqüestro de um diplomata espanhol perante a UE. Estive preso cinco meses e a minha companheira dois. Na França, nos detiveram em maio de 1974, após a libertação do diretor do Banco de Bilbao, de Paris, que tinha sido seqüestrado para denunciar a execução na Espanha do jovem anarquista catalão Salvador Puig Antich e evitar que outros dois militantes do MIL (Movimento Ibérico de Libertação) fossem também executados. No total prenderam dez companheiros (entre espanhóis e franceses) e me acusaram de ter organizado esse seqüestro (nunca puderam descobrir nem deter os companheiros que o realizaram). Fui o que esteve mais tempo detido: 9 meses. Logo deram aos dez a liberdade condicional e que fixassem residência em Paris. Em 1981, com Franco já morto, nos fizeram um julgamento criminal que durou uma semana e saímos absolvidos, visto que a polícia francesa não pode provar as suas acusações.
ANA > E você entrou sem problemas em Cuba? Não temeu ser preso, já que deves estar na mira do serviço de inteligência cubano por suas críticas à Fidel, ao regime…
Octavio < Não voltei a Cuba até o começo dos anos oitenta… Mas fui de viagem para o Peru e a Bolívia para atividades de recuperação e salvaguarda da memória popular na América Latina, e que eram patrocinadas pelo Instituto de História de Amsterdam (Holanda), e a Biblioteca Feltrineli de Milão (Itália), a Biblioteca de Documentação Internacional Contemporânea de Nanterre (França) e o CIDA da Espanha. Depois, em 1989 e 1992, para preparar uma exposição iconográfica sobre a influência da revolução francesa na América Latina e outra para os 500 anos de lutas pelos direitos humanos na América Latina, na altura do Bicentenário da Revolução Francesa e do quinto centenário do “descobrimento” da América. Nessas viagens ia respaldado por instituições universitárias européias. A última vez que fui foi no final dos anos noventa na ocasião da Cúpula de Chefes de Estado ibero-americanos celebrada em Havana. Fui lá para organizar os contatos com os grupos dissidentes para que um eurodeputado pudesse estar presente numa manifestação de mulheres de presos… Não tivemos problemas para entrar nem para fazer os contatos, pois o Regime não queria nesse momento provocar nenhum escândalo… Embora tivessem detido provisoriamente na noite anterior as mulheres e vários dissidentes e assim não foi possível realizar a manifestação, então o eurodeputado se limitou a fazer uma conferência de imprensa com os jornalistas europeus presentes na ilha. No aeroporto fui detido por algumas horas pelos seguranças do Estado. Eles contaram que haviam me vigiado durante toda a minha estadia de três dias na ilha… Disseram que conheciam o meu passado, quando lutávamos juntos contra Batista… Mas no final me deixaram apanhar o avião de volta a Paris. Estava claro que não queriam provocar escândalo enquanto estivessem ainda na ilha os Chefes de Estado ibero-americanos.
ANA > Mas nunca sofreu uma agressão física de um castrista fanático?
Octavio < Não, de maneira individual. Da parte dos castristas só sofri uma agressão física pelas mãos de membros da Segurança cubana em frente da Embaixada de Cuba em Paris, durante uma manifestação organizada pelos Repórteres Sem Fronteiras, pouco depois das detenções em Cuba dos “jornalistas independentes” em março de 2003.
ANA > Seus críticos dizem que você é financiado pela burguesia cubana de Miami. O que você acha? (risos)
Octavio < Nunca me disseram isso na cara, pois sabem muito bem que, tanto para a burguesia de Miami como para todas as burguesias, um anarquista é um inimigo ainda pior do que possa ser um comunista.
ANA > Qual a sua opinião sobre a blogueira cubana Yoani Sánchez?
Octavio < Só posso dar a minha opinião a partir do que leio sobre ela, inclusive da parte de companheiros da ilha, e do que ela já escreveu, pois não a conheço pessoalmente. E, nesse sentido, a minha opinião não é definitiva, pois ignoro as verdadeiras motivações que a levaram a adotar uma posição de dissidência pública desde o interior de Cuba. Dito isto, me parece que a dissidência de Yoani está determinada pelas suas vivências no contexto imposto a todos os cubanos pelo regime castrista e que essas vivências a terão feito rebelar-se para manifestar o seu descontentamento e repúdio por tal regime. Espero que o seu protagonismo só esteja determinado pelas condições em que a dissidência se veja obrigada a atuar por culpa desse regime e que no futuro defenda também o direito à liberdade de expressão que hoje reivindica frente à ditadura castrista.
ANA > Há espaço hoje em Cuba para discussões e ações libertárias? Como você vê o panorama libertário neste país? Perspectivas, destaques…
Octavio < Existem “espaços” na medida em que os cubanos vão perdendo o medo de falar e o Regime (como aconteceu durante o final da ditadura franquista) já não pode reprimir tão abertamente como antes. É o que está ocorrendo também com a Damas de Branco e com outros grupos de oposição… Eu vejo a perspectiva libertária com bastante otimismo, pois os companheiros com os quais estamos em contato (membros do Observatório Crítico) me parecem muito capazes e conscientes da oportunidade, para os anarquistas, de pôr em evidência o falso socialismo castrista e mostrar as potencialidades revolucionárias do socialismo libertário.
ANA > É verdade que você organizou dois atentados contra o general Franco nos anos 60? Como foi?
Octavio < É uma história muito longa que tentarei resumir o mais breve possível. Em 1961, no Congresso da CNT celebrado em Limoges (França), realizou-se a unidade do Movimento Libertário Espanhol (MLE), que estava dividido em dois setores desde 1945. Neste Congresso acordou-se, em sessão reservada, pela criação de um organismo de luta conspirativa contra a ditadura franquista que se denominou Defesa Interior (DI) e que devia estar integrado por sete militantes da CNT, da FAI e da FIJL. No começo de 1962, a Comissão de Defesa do MLE nomeou os sete membros da DI e a mim me nomearam para representar a FIJL (Juventudes Libertárias). Essa foi a razão por que abandonei o México e me integrei na DI em clandestinidade na França e Espanha. A DI decidiu iniciar ações de fustigamento contra a ditadura franquista para denunciar a brutal repressão franquista e contribuir para a solidariedade aos presos encarcerados na Espanha. Também foi decidido abater o ditador e para isso se preparou uma primeira ação contra Franco que se realizou no verão de 1962, em San Sebastián, sem êxito por problemas técnicos (duração da bateria do receptor) e de informação (Franco demorou a sua chegada). A ação causou grande comoção e a imprensa falou de atentado falido contra Franco. A polícia franquista realizou muitas detenções nos meios independentistas bascos, mas teve que soltá-los porque não conseguiu descobrir os libertários da DI, autores dessa ação. No verão de 1963 tinha-se preparada outra ação contra Franco em Madri, no trajeto que ele fazia do Palácio de Pardo ao Palácio de Oriente para receber as cartas credenciais dos novos embaixadores que chegavam a Madri; mas circunstâncias não totalmente explicadas até os dias de hoje provocaram a detenção de dois companheiros do grupo que preparava o atentado contra Franco e a perda de todo o material destinado à dita operação. O regime franquista reagiu brutalmente e em 17 dias julgaram e executaram estes dois companheiros, Francisco Granado e Joaquín Delgado, além de proceder indiscriminadamente com numerosas detenções de libertários na Espanha e, inclusive, na França, onde as autoridades francesas, seguindo as indicações do regime franquista, detiveram em diferentes cidades quase uma centena de jovens libertários e alguns velhos militantes. Esta repressão provocou a paralisação da DI e a partir de então só a FIIJL continuou as ações contra a ditadura franquista. Para mais informação pode ver-se o livro “El anarquismo español y la acción revolucionaria (1961-1974)” e documentários da TVE e da emissora européia ARTE sobre os atentados a Franco.
ANA > Mudando de assunto. Como você avalia o fato de a crise financeira dos últimos anos não ter provocado grandes protestos na Europa?
Octavio < A última “crise” financeira não provocou grandes protestos na Europa, pese e considerando que tem tido conseqüências importantes sobre o emprego, pela simples razão de que a maior parte dos trabalhadores europeus tinham chegado a um alto poder aquisitivo e o sistema econômico não ter baixado de maneia drástica esse poder aquisitivo e, por conseguinte a sua capacidade de consumo. Não creio que esta situação mude num futuro próximo e por isso me parece que a relação de forças favorável ao capitalismo continuará… até que a outra crise, a ecológica, se agrave e faça tomar consciência à maioria dos trabalhadores do perigo que é para a sua sobrevivência a continuação do sistema capitalista. Tomada de consciência que pode favorecer a emergência de um movimento planetário autogestionário para salvar o planeta e a espécie humana de todas as ameaças que representa a gestão capitalista e autoritária das sociedades humanas.
ANA > Como vai o anarquismo na França? Onde você mora atualmente, Perpignan, existe uma livraria anarquista, não?
Octavio < Sim, vivo em Perpignan e existem várias livrarias nesta cidade; mas particularmente uma na qual organizamos regularmente lançamentos de livros e debates. O anarquismo na França está numa boa etapa, já que há boas relações entre todas as organizações que se reclamam do ideal libertário. Junta-se a esta conjuntura o fato da presença de vários intelectuais de renome, particularmente Michel Onfray, que se reclama do anarquismo e do anarcosindicalismo, que contribui para atualizar o ideal ácrata entre o grande público.
ANA > Você ainda atua na “Radio Libertaire”, de Paris? Você tinha um programa lá que abordava questões latinas… Como foi esta experiência?
Octavio < Não diretamente, mas colaboro enviando informação aos companheiros (o chileno Nestor Vega e a francesa Lise Bouzidi) que continuam animando esse programa. Foi e continua sendo uma boa experiência que tem permitido, ademais, contatar com muitas organizações e ativistas no âmbito latino-americano.
ANA > Você atua em alguma organização anarquista francesa ou colabora com inúmeros grupos? Como é a sua militância hoje?
Octavio < Colaboro com diversas organizações anarquistas e anarcosindicalistas francesas (CNT, FAF e outros grupos libertários que editam revistas ou livros, etc.) e espanholas (CNT, CGT e grupos anarquistas, autônomos). Também colaboro nas Universidades Populares, particularmente na de Perpignan. Todavia, para além de colaborar na imprensa libertária com artigos, participo nas campanhas para a recuperação da memória histórica libertária na Espanha com o “Grupo pro revisão do processo Granado-Delgado” (os dos jovens anarquistas executados em Madri, em 1963) e com o GALSIC (Grupo de Apoio aos Libertários e Sindicalistas Independentes em Cuba) que faz o Boletim CUBA Libertária, que está apoiando os libertários cubanos do Observatório Crítico de Havana.
ANA > Você escreveu “Miedo a la memoria: historia de la ley de reconciliacion y concordia” e “El anarquismo español y la acción revolucionaria”. Você tem outros projetos em andamento na literatura?
Octavio < Estou trabalhando na “biografia” de meu pai, que foi, na Espanha e no México, professor racionalista formado na escola do pedagogo libertário Francisco Ferrer y Guardía. Esta biografia deve ser editada pelos companheiros da CGT de Menorca (Espanha). Também estou escrevendo um livro sobre O obstinado caminhar da utopia… Mas, infelizmente, as campanhas para a recuperação da memória na Espanha e as tarefas de solidariedade com os companheiros cubanos deixam-me muito pouco tempo para avançar nesses dois projetos.
ANA > E há outros projetos mais urgentes?
Octavio < Como acabo de dizer, os projetos mais urgentes são as minhas atuações para essas campanhas: deslocações para fazer debates na França e Espanha, fazer o Boletim CUBA Libertária e escrever artigos, notas, correspondência, etc. Agora estamos tentando mobilizar todas as pessoas e grupos que, na Europa, se mobilizaram em favor do juiz Baltazar Garzón, para denunciar a responsabilidade do Governo socialista espanhol na continuidade judicial do franquismo nas instituições da “Democracia” que a transição instaurou na Espanha.
ANA > Como anarquista histórico e usuário ativo da internet. Você acredita que este meio ajuda no desenvolvimento do anarquismo?
Octavio < Não só pelas possibilidades de uma informação democrática ao alcance de grandes maiorias de humanos, mas me parece ser a internet uma magnífica ferramenta, também pelas suas potencialidades tecnológicas (no campo da gestão democrática e autogestionária da informação). Me parece que a internet pode permitir a emergência e funcionamento de formas sociais igualitárias e não hierárquicas que possibilitem uma abundância racional, o fim do trabalho assalariado e o desenvolvimento da liberdade sem menosprezar o funcionamento do coletivo. Claro que tudo dependerá da capacidade da humanidade para se alcançar essa consciência, da primazia da sobrevivência da espécie sobre as tendências do capitalismo de dar prioridade ao individualismo competitivo destruidor…
ANA > A história recente da humanidade parece nos colocar em um presente perpétuo. Encontras diferenças marcadas entre a época agitada que te tocou viver e a atual? Quais seriam estas diferenças?
Octavio < Não, não é essa a minha impressão… É verdade que o Poder segue aí presente; mas também é fato de que não param de surgir novas formas de contestação antiautoritária. As diferenças em relação ao período anterior são muitas, tanto no âmbito das relações humanas (nas quais se tem conseguido progressos insuspeitados desde há meio século) como na esfera pública, com a desacralização do Poder e o questionamento cada vez maior do caráter absurdo, irracional, injusto e perigoso (para a própria sobrevivência da espécie humana) do capitalismo. Creio que nos encontramos numa encruzilhada histórica que pode abrir um caminho prometedor à emancipação dos humanos por eles mesmos. Nunca antes foi tão real esta perspectiva… Claro que dependerá da nossa capacidade em aprofundá-la e torná-la operativa…
ANA > Existe algum lugar que você vê mais esperança anarquista, um anarquismo mais vibrante, inspirador? Chega a te contagiar o que vem acontecendo na Grécia nos últimos tempos?
Octavio < O que para mim causa mais esperança nestes momentos é a coincidência, entre muitos libertários e marxistas, na crítica do autoritarismo e na valorização da autonomia e da autogestão. Um fenômeno espontâneo e planetário, que se vai interconectando graças à internet e através de redes de solidariedade, diálogo e reflexão. É um anarquismo que resulta não dogmático que encontrou no filósofo francês Michel Onfray (seus livros foram traduzidos em mais de 15 línguas e com tiragens de centenas de milhares de exemplares) seu máximo divulgador fora dos meios de afinidades propriamente anarquistas. O que se passa na Grécia não me parece ser uma manifestação muito conseqüente com o ideário anarquista, pois me parece privilegiar demasiado o confronto pelo confronto com as forças da ordem sem desenvolver um verdadeiro questionamento da ordem autoritária. Embora esta impressão é devida a que não é fácil ter acesso aos seus textos…
ANA > Para encerrar, diante de toda a militância que você fez até hoje, quais foram as maiores alegrias anarquistas?
Octavio < Minha maior alegria foi ver que todos os esforços e sacrifícios realizados entre 1962 e1967 pelos jovens libertários (espanhóis, franceses, italianos, ingleses que foram objeto da repressão na Espanha e também na França, Itália e Inglaterra) para relançar o ativismo revolucionário anarquista não foram em vão… E isso por ter contribuído de maneira decisiva para que os acontecimentos de Maio de 1968, na França e outros países, tivessem a marca anarquista do questionamento de todas as formas de poder e do dogmatismo. Um questionamento que me parece ser uma contribuição fundamental para esse obstinado caminhar da utopia igualitária e libertária que a humanidade não deixou de ter como horizonte desde que a oposição entre o mandar e o obedecer começou a ser o motor da história humana.
ANA > Mais alguma coisa para finalizar? Você deve estar cansado. Obrigado!
Octavio < Havia muitas mais coisas a dizer… mas devemos pensar em não cansar os possíveis leitores desta entrevista.
Tradução > Liberdade à Solta
agência de notícias anarquistas-ana
o mar urrava
como um fauno
após o coito
Oswald de Andrade
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!