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[Japão] Ito e Osugi, a trágica história de um casal anarquista

By A.N.A. on 13 de Fevereiro de 2019

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Entre os séculos 19 e 20, com a era Meiji, o Japão tenta se modernizar seguindo o modelo ocidental. As tecnologias e conhecimentos de outros países são importados. Livros de Zola, Tolstói, Emma Goldman, Kropotkin ou Bakunin começam a circular. A contribuição para a disseminação das ideias anarquistas vem através de um corajoso grupo de intelectuais que, no início do século XX, funda jornais e revistas, escrevem livros, criticam duramente as condições dos trabalhadores, o confucionismo que relega as mulheres as paredes do lar e a natureza divina do imperador. A onda de greves desses mesmos anos verá sua participação ativa. E a dura repressão não demorará a chegar.

Em 1910, com a acusação de alta traição e tendo planejado o assassinato do imperador, vinte e seis pessoas são presas entre anarquistas, socialistas e simpatizantes. Um ano depois, doze deles foram condenados à morte.

A forte repressão sofrida pelo movimento anarquista levará a uma breve e dura fase de imobilidade, definida como “tempo de inverno”.

Apesar de tudo isso, uma nova geração de anarquistas é reorganizada em torno da figura de Osugi Sakai, que escapou da acusação de traição no momento do suposto complô porque ele já estava na prisão.

Osugi, preso em várias ocasiões por seu ativismo político e por sua participação nas lutas dos trabalhadores, é lembrado por ter criado a primeira escola de Esperanto no Japão. Em 1906 ele abraçou o ideal anarquista na prisão, onde leu e traduziu Bakunin e Kropotkin. Ele escreverá sobre eles: “Por Kropotkin, sinto respeito, não atração. Há um homem que é mais querido para mim. Um anarquista nato, um rebelde de tal constituição que teria sido rebelde mesmo em uma sociedade anárquica. Um homem que não tinha nada de ordenado ou regular em seus hábitos, que viveu uma vida boêmia e turbulenta. Eu não posso deixar de rir de mim mesmo quando eu refletir sobre a vida de nosso antecessor Bakunin”.

De fato, a vida de Osugi é turbulenta. Casado e com um amante, em 1914 ele conhece Ito, dezenove anos de idade. Escritora, jornalista, tradutora e feminista, Ito se aproxima do anarquismo um ano antes, enquanto participava de uma conferência sobre Emma Goldman, cujos textos ela traduzirá para o japonês.

Ito expressará seu fervor político ao escrever duros ataques em defesa da liberdade das mulheres, contra a falsa bonomia, a sexualidade e o casamento combinados, o aborto e a prostituição. Em 1916, absolutamente proibido e imoral no Japão, os dois andam de mãos dadas e se beijam publicamente em um parque em Tóquio. As pessoas que os veem gritam horrorizada, o escândalo se estende em um constante aumento de situações que terminam com Osugi apunhalado no hospital por sua amante e abandonado por sua esposa. Mais perigosas e preocupantes do que todas as perseguições, prisões e baixarias contínuas da polícia, que considera um grave problema político a extirpar.

Constantemente espionados, censurados e presos, Ito e Osugi, através da sua militância diária, colocam em causa o Kokutai, entendido como um sistema de governo que está no ápice do imperador divino, base indiscutível da identidade nacional.

Em setembro de 1923, o terrível terremoto em Kanto causou mais de noventa mil mortes, deixando populações inteiras totalmente deslocadas. O chefe de polícia, Tako Masahiko Amakasu, decide se aproveitar da debandada geral e prende os dois anarquistas, junto com um sobrinho de oito anos. Eles serão estrangulados na cela e seus corpos jogados em um buraco abandonado. Um amigo de Osugi vai descobrir os corpos e denunciar o que aconteceu.

Todos os jornais sofrem censura total. Ninguém deve publicar fotos, citar os nomes ou contar o que aconteceu. A notícia, no entanto, vai de boca em boca.

A honestidade intelectual de ambos, a coerência de suas ideias, seu alto valor humano, juntamente com a morte de uma criança e o estratagema esquálido da polícia, provocarão protestos em todo o Japão.

O próprio imperador é forçado a ordenar a prisão e a condenação do chefe de polícia.

Em 1969, o diretor Yoshida vai lembrar dessa história em um filme intitulado Eros plus massacre. A pedido do diretor, o cenário se move no tempo e os espaços são impessoais. Esta triste história não pode ser detida naqueles dias, mas tem que continuar a ser compartilhada por corações livres.

Saltamontes

Fonte: https://www.nodo50.org/tierraylibertad/366articulo7.html

Tradução > Liberto

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nuvens desta tarde —
ao voo das maritacas
certa nostalgia

Seishin

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