Um investigador trata de identificar uma vítima do bando nacional através de uma antiga fotografia
Em uma velha fotografia de imprensa, um menino de uns oito anos, com uma característica mecha de cabelo, fala enquanto sorri a duras penas a uns milicianos equipados com armas, cintos e cartucheiras que o escutam com atenção.
A imagem é obra do fotógrafo Agustí Centelles e foi tomada em 1936, no começo da Guerra Civil espanhola, no povoado de Siétamo, que acabava de cair nas mãos do Exército republicano em sua ofensiva falida para tomar a cidade de Huesca.
Está entusiasmado. Já em 2013 lançou outra investigação para tratar de chegar até esse pequeno, que, no caso de seguir com vida, teria mais de 90 anos na atualidade. Mas aquela tentativa não deu em nada e agora Gasca pressente que, por fim, achou uma boa pista.
Para ele, a fotografia em questão tem um valor enorme e múltiplo. “Não é só um documento histórico sobre a Guerra Civil, é também e sobretudo o reflexo de uma tragédia pessoal”, afirma.
Aquele menino, seja quem for, esteja vivo ou morto, acabava de perder toda sua família. Seus pais e seus seis irmãos haviam sido fuzilados pelas tropas dos sublevados após um dos encarniçados combates que se levaram em torno a Siétamo no começo da contenda.
Duplamente golpeados
De fato, quando a imagem foi publicada pela primeira vez no diário “Ahora”, dentro de uma crônica assinada por José Quílez Vicente, a legenda da foto explicava aos leitores que o menino da imagem estava contando aos milicianos o que havia ocorrido com a sua família.
Siétamo, a um passo de Huesca, mudou várias vezes de mãos no curso da ofensiva e seus habitantes sofreram em suas carnes as atrocidades da guerra. Uns foram golpeados pelos rebeldes, outros pelos republicanos. De forma que o conflito, segundo a forma em que o viveu cada família, dividiu a população em dois grupos, como ocorreu em todos os povoados e cidades de Espanha.
Mas mais de 80 anos depois “as pessoas foram esquecendo e o que quer é não reabrir velhas feridas”, diz Usé, que explica que em fevereiro passado, pela primeira vez, o grupo recreacionista Primera Línea, montou uma representação “neutra” da batalha de Siétamo na mesma localidade, com exposição incluída.
Usé, como Gasca, e como Dani Abadía, responsável de Primera Línea, colocaram muitas esperanças em encontrar o menino órfão da foto. “Tem umas feições marcantes, mas ainda assim não lembramos seu rosto”, lamenta o prefeito.
E, para complicar as coisas, Siétamo, que agora cresce a custa de Huesca, foi até não muito tempo um povoado de emigrantes. Houve gente que se exilou ao final da guerra e não foram poucos os moradores que foram para Barcelona e Zaragoza nos anos 60 do século passado, e inclusive mais longe, à América.
Em que grupo da diáspora local iria esse rapaz desconhecido? O que ficou sobre isso? Talvez tenha ido parar em um orfanato ou um parente se responsabilizou por ele. “Não o sabemos, não temos nem ideia”, reconhece Joaquín Gasca, que prefere não se perder em conjecturas. O que este foto documentalista busca é uma pista confiável, uma só, a partir da qual começar a seguir o fio. “É algo que me obsessiona”, diz. Porque, insiste, ele não é feliz até que desvele a história que há por trás de cada vítima anônima que aparece nas velhas fotos da Guerra Civil.
Recriar o passado
Dani Abadía, do grupo recreacionista Primera Línea, crê ver a mesma Siétamo da Guerra Civil cada vez que passa pela estrada de Huesca a Lérida.
“Visto desde o oeste, o povoado tem o mesmo perfil que em 1936, com a torre da igreja se destacando sobre os telhados das casas”, explica. É como se nada tivesse mudado, mas sim mudou. Até o ponto de que agora Siétamo não é o cenário de um enfrentamento sangrento entre espanhóis mas de uma encenação, como a que se fez no mês de fevereiro passado, na qual os atores saíram pelas ruas com os uniformes militares de então, se montou uma exposição sobre a guerra e se fez uma visita guiada aos lugares onde se havia combatido.
Esse instantâneo tira o sono faz anos a Joaquín Gasca, foto documentalista e conservador da coleção fotográfica privada de Octavi Centelles, filho do famoso redator gráfico. Gasca quer averiguar, a todo custo, quem é esse menino de expressão um pouco triste e que o que aconteceu com ele. “Não sabemos nada desse rapaz, nem sequer seu nome”, destaca Gasca.
Agora, 84 anos depois do momento captado para sempre nessa fotografia em branco e preto, o foto documentalista se pôs em contato com a Municipalidade de Siétamo e com entidades memorialistas de Huesca para que lhe ajudem a identificar ao menor.
A foto foi distribuída, via WhatsApp, entre todos os moradores de Siétamo, assinala José Luis Usé, prefeito do povoado. “Se fez chegar aos filhos de pessoas que tem 90 anos ou mais e que, quando estourou a guerra, eram também uns meninos”. É um reduzido grupo de pessoas, “só cinco ou seis”, em uma localidade de 800 habitantes. Mas eles podem ter a chave, talvez o ponto de partida para uma busca exitosa.
E houve avanços. Por um lado, “uma moradora nonagenária sugeriu um possível nome”. Além disso, se pode comprovar que esse mesmo menino “aparece em outra foto de jornal um ano mais tarde, durante uma visita do presidente da Generalitat, Lluís Companys, à frente de Aragão”, explica Gasca.
Para Dani, Siétamo é “o Belchite de Huesca”. “Houve combates de casa em casa, o avanço foi muito lento, com muitas vítimas, e os coquetéis molotov desencadearam um incêndio”, explica o responsável de Primera Línea.
Onde está o negativo?
O original da foto do menino órfão com os milicianos, cujo negativo nunca foi localizado, está guardado no Instituto Internacional de História Social de Amsterdam, na Holanda. Ademais, existe uma cópia no arquivo fotográfico da Fundação Anselmo Lorenzo, da CNT.
Seu autor, Agustí Centelles (1909-1985), que nasceu em Valência e desenvolveu sua carreira em Barcelona, se tornou famoso com uma imagem de um grupo de guardas de assalto que, entrincheirados atrás de uns cavalos mortos, protagonizam um tiroteio nos primeiros dias da Guerra Civil em Barcelona.
Ao término do conflito, Centelles, o qual foi considerado o Robert Capa espanhol, fugiu para a França levando uma maleta com 4.000 negativos da contenda. Em 2009, o Ministério de Cultura, desbancando a oferta da Generalitat da Catalunha, comprou de seus herdeiros, por 700.000 euros, todo o arquivo fotográfico do famoso fotojornalista.
>> Foto em destaque: O menino órfão fala com um grupo de milicianos anarquistas em Siétamo.
Fonte: https://www.eldia.es/sociedad/2020/09/20/busca-nino-perdido-guerra/1110622.html
Tradução > Sol de Abril
agência de notícias anarquistas-ana
Anoitece
Atrás da colina
O sol adormece
RôBrusch
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!