Carta de princípios da União Anarquista Federalista (UAF)

PRINCÍPIOS QUE ORIENTAM A ORGANIZAÇÃO:

BEM VIVER

O “Bem Viver” estabelece a essência em sermos iguais. É um dos maiores saberes originários onde aprendemos que quaisquer atividades, desde o plantio, a caça, as diversões, as brincadeiras, construções de caminhos e abrigos, significa a maneira de estabelecer vínculos com o outro, e é essa a catarse de nossa resistência ao extermínio desde a invasão europeia.

O Bem Viver diz respeito a sua própria condição de “ser” humano e isso traduz a essência do coletivo. Bem Viver significa o estado pleno de felicidade coletiva, a liberdade em sua essência onde todos emanam a mesma pulsação com os ciclos naturais do entorno. Somos parte e somos todo.

A vida em si só tem um sentido pleno que é o de existir num mundo sem males. Aqui fora, somos seres em engrenagens sociais corrompidas pela instauração do insano desejo de poder, de se apropriar, de competir, de consumir e da barbárie de classificar humanos em raças; somos espécie e o capital é o mortal combate contra a felicidade.

SINTETISMO

A União Anarquista Federalista (UAF) tem como princípio organizativo o SINTETISMO, caracterizado e materializado na autonomia, horizontalidade e descentralização da sua estrutura personificada em indivíduos, núcleos, coletivos e federações livremente associadas. Este sintetismo é o respeito à diversidade de ação, teorias, métodos, práticas e estratégias anarquistas. Acolhemos a diversidade regional e étnica dos explorados e oprimidos no território dominado pelo Estado Brasileiro e promove o diálogo e práticas fraternas e libertárias como exercício e trabalho de construção e realização da sociedade libertária.

A UAF é uma inciativa sintetista pró-federativa com o objetivo de se tornar uma Federação Anarquista no médio e longo prazo. A relação entre todos(as) integrantes da UAF devem ser baseada no respeito, na solidariedade, apoio mútuo, na confiança e no companheirismo em meio à vida e luta cotidiana, com o fito de que se fortaleçam os laços que nos unem em torno de uma organização que se quer libertária e sintetista.

ANTIAUTORITARISMO

O autoritarismo consiste na coerção das relações entre indivíduos e no cerceamento das liberdades, seja através do Estado em seu sistema jurídico e na forma de execução desse mesmo sistema jurídico ou através da reprodução de valores culturais absorvidos por diferentes agrupamentos humanos em suas mais variadas vertentes. O autoritarismo e a coerção se apresentam a serviço de diferentes linhas de pensamento que levam a uma sociedade opressora, esteja o autoritarismo manifesto através do Estado, do Capital, da religião, do gênero, da raça, da ideologia, da etnia ou da sexualidade; somos contrários a todas as formas através das quais a opressão se manifesta.

Defendemos o fim da organização social Estado. O Estado é uma ferramenta para vários tipos de coação, punição e encarceramento promovido pela ação do mesmo. O fim de todo cerceamento do direito ao corpo, locomoção, difusão de ideias e de toda tendência que pretenda a manutenção de uma sociedade patriarcal e hierárquica (seja no âmbito, político, econômico ou estritamente cultural).

Também trabalhamos e lutamos por uma mudança radical nos mecanismos socioeducativos a fim de que a educação e a pedagogia pretendam a libertação e autonomia dos indivíduos, e não o controle sobre sua liberdade ou a domesticação do seu ser com fins à manutenção da ideologia autoritária vigente.

APOIO MÚTUO

O apoio mútuo se constitui a partir de afinidades entre indivíduos, e/ou coletivos, e/ou federações locais e de outros países, seja pelo afeto, necessidades, lutas, desejos ou interesses comuns. O apoio mútuo, seja natural ou cultural, é uma forma de organização política, amorosa, social e econômica que afirma a liberdade de indivíduos e coletivos para o compartilhamento de recursos e serviços para o benefício mútuo.

Entre aquelas e aqueles que trabalham e lutam, o apoio mútuo baseado na afinidade é a ponte pela qual unimos indivíduos e coletivos companheiros que constroem hoje o mundo livre; unimos esforços e recursos para as lutas ou para a autodefesa. Contudo, são imprescindíveis a autogestão e a ação direta para realizar o apoio mútuo através de sua própria consciência e atitude.

AUTOGESTÃO

A autogestão é entendida como a livre e espontânea iniciativa dos indivíduos, coletivos, federações associadas, vivenciada e praticada de forma horizontal, descentralizada, não hierárquica, colaborativa na realização das tarefas internas e externas, sejam de caráter administrativo, organizativo dos projetos políticos, econômicos, culturais e demais atividades a serem desenvolvidas. A autogestão é o princípio que norteia a administração econômica e financeira da UAF, pensada a partir do esforço e do desenvolvimento das capacidades individuais e coletivas de todos(as) os(as) associados em gerar recursos financeiros, materiais e/ou humanos para a manutenção dos espaços físicos, virtuais e de todas as atividades que venham a ser realizadas. Com base nessa postura, defendemos a autogestão como princípio organizativo e administrativo para todas as associações, grupos e demais coletivos que tenham como meta o anarquismo como modo de vida social.

A autogestão é a associação libertária entre indivíduos e entre grupos para que estes administrem suas próprias vidas, seu trabalho, a justiça, a política, a economia, enfim, a sociedade nos seus mais diversos aspectos e dimensões. É a extinção da divisão entre teoria e prática onde existem senhores e servos, cabendo a todas as atividades, para todos(as) e de forma rotativa. A liberdade é o início, o meio e o fim para a felicidade humana sem distinções de fronteiras, de raças, credos, etnias, gêneros, sexualidades, crenças para abolição das classes sociais, extinção do capitalismo e distinções morais.

Ela é a afirmação da associação por afinidade de indivíduos/grupos livremente organizados nas federações da sociedade livre. Assim a autogestão é a ação direta em apoio mútuo do sujeito sem representantes.

A autogestão é vital para a compreensão e construção da sociedade livre que desejamos. Trabalhamos a autogestão como modelo de organismo político e econômico alternativo à lógica capitalista e, portanto, de caráter revolucionário, objetivando um modo de produção liberto de injustiça, baseado na livre associação, na necessidade da produção e na colaboração dos meios produtivos, geridos pelos próprios produtores.

AÇÃO DIRETA

Em acordo com nossos princípios de antiautoritarismo, apoio mútuo e autogestão, acreditamos na ação direta como principal ferramenta de mudança. Ação direta é ao mesmo tempo princípio, método e tática dos anarquistas. Por princípio, todos os indivíduos e coletivos são livres e movidos por suas forças, desejos e necessidades. O método da ação direta compreende a livre criação, o livre trabalho segundo as necessidades e possibilidades de cada localidade, baseado na autogestão onde não há uma relação exploradores/explorados, onde não há divisão entre ideias e práticas, onde todos(as) fazem e pensam, rotativamente.

Praticantes da ação direta não procuram pressionar o governo para instituir reformas, ou requisitar mudanças das autoridades e das instituições existentes. As táticas da ação direta são aquelas que não aceitam representantes nem intermediários, sendo um aspecto político e social onde os indivíduos e os coletivos anarquistas fazem por si mesmos as ações antiautoritárias e de construção da justiça social e da liberdade e/ou destruição das injustiças sociais e das desigualdades geradas pela ordem capitalista vigente. A ação direta aliada à autogestão e ao federalismo, praticada e realizada de forma integrada, são os germes da nova sociedade livre no seio da velha sociedade capitalista.

FEDERALISMO

Somos uma Federação de indivíduos, núcleos, coletivos e federações locais, associados por afinidade em torno do modelo federalista anarquista de síntese contido no que chamamos de pacto federativo.

Organizamo-nos baseados no princípio da pluralidade teórica anarquista e na diversidade tática, nas lutas, reconhecendo a heterogeneidade dos sujeitos em luta, explorados e oprimidos. Constituímo-nos internamente de forma horizontal e preservamos as individualidades existentes dentro dos da UAF. A descentralização se aplica à toda estrutura da UAF. É fundamento desta organização o consenso como método decisório garantindo-se a abstenção crítica no interior da organização e a autonomia desde que não negue ou inviabilize a organização e os projetos.

Temos como prática o apoio mútuo fundado na afinidade pessoal e coletiva. Trabalhamos no sentido da construção da autonomia econômica de forma horizontal, descentralizada e federada, na ação política junto aos indivíduos explorados e oprimidos.

Constituímo-nos desde já como União Anarquista Federalista, em que trabalharemos com o objetivo de constituir uma federação de coletivos e indivíduos que lutarão para a sociedade livre. O federalismo anarquista é o instrumento das lutas sociais, populares e de classe. Orienta-nos a ação direta e a liberdade na luta contra todos os modos de opressão, repressão, injustiça e desigualdades. As lutas sociais de gênero, sexualidade, crenças, étnicas, raciais, ambientais e de liberdade animal são estruturais na luta para a libertação individual e social, pois somadas todas as lutas caminharemos ombro-a-ombro para a sociedade livre.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A UAF Brasil se apresenta ao conjunto das lutas populares e dos/as trabalhadores/as, nunca se colocando como vanguarda ou buscando protagonismo, mas somando e construindo lado a lado em um horizonte revolucionário e de resistência ao controle e opressão do Estado e à exploração do Capital, do patriarcado e de toda forma de opressão. Trabalharemos hoje e sempre em prol da Anarquia, que entendemos ser a forma de organização social da humanidade livre. O conjunto dos princípios descritos acima compõem o federalismo anarquista de síntese da Organização.

Contato: uaf@riseup.net

Blog: uafbr.noblogs.org

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Eugénia Tabosa