Laylah Ziyarah | Hani é o bebê mais novo da Faixa de Gaza a perder uma perna nesta guerra.

Laylah, uma mãe de 29 anos com quatro filhos, do bairro a-Tufah na Cidade de Gaza, contou como a perna de seu bebê foi amputada e relatou a luta para salvar sua vida em meio a bombardeios e deslocamentos forçados:
 
“Até o início da guerra, eu morava em nossa casa no bairro a-Tufah, na Cidade de Gaza, com meu marido, Muhatdi Ziyarah, de 39 anos, e nossos três filhos: Mira, de 10 anos, Muhammad, de 7, e Celine, de 2. No primeiro dia da guerra, fomos para a casa dos meus pais no mesmo bairro, porque nossa área foi fortemente bombardeada. Ficamos com eles por cerca de 40 dias, mas quando aquela região também se tornou perigosa, decidimos evacuar para o sul.
 
Saí do norte de Gaza com meu marido, meus filhos e meus pais, sob intenso bombardeio e ataques aéreos. No caminho, vimos coisas horríveis: corpos desmembrados, cabeças decepadas e intestinos espalhados pelo chão. Caminhamos pela Rua Salah a-Din, carregando pouquíssimos pertences. Cruzamos a pé o posto de controle de Netzarim e continuamos a caminhar por uma longa distância. Chegamos à casa de amigos em Khan Yunis e ficamos lá por cerca de 17 dias. Quando os bombardeios pioraram, tivemos que fugir novamente, outra vez sob fogo. Naquele dia, foi um milagre termos sobrevivido, pois o bombardeio durou duas horas sem parar. Parecia que estavam atirando dentro da casa.
 
Depois, nos mudamos para uma cabana no Campo de Refugiados de al-Maghazi e ficamos lá por cerca de 20 dias em condições extremamente difíceis, com quase nenhuma comida ou água. Em seguida, mudamo-nos para Deir al-Balah, onde vivemos em uma tenda por três dias, e depois fomos para a área de al-Mawasi, em Rafah, onde ficamos por cinco meses. O deslocamento de um lugar para outro foi um pesadelo por si só.
 
Então, em 19 de janeiro de 2025, o cessar-fogo começou e voltamos para o norte. Eu estava grávida de nove meses, então viajamos de carro em vez de a pé. No posto de controle de Netzarim, esperamos quase 38 horas sem banheiro, comida ou água. Foi um dos dias mais difíceis da minha vida.
 
Finalmente, conseguimos voltar para nossa casa em a-Tufah. Algumas semanas depois, em 22 de fevereiro de 2025, dei à luz Hani. A alegria foi imensa. Disse a ele que nos trouxe esperança, porque nasceu quando a guerra tinha acabado. Mas a alegria não durou muito. Menos de um mês depois, a guerra recomeçou com ainda mais brutalidade. A casa ao lado da nossa foi bombardeada, e fomos resgatados dos escombros, cobertos de poeira. O rosto de Hani estava negro por causa dos detritos.
 
Voltamos para a casa dos meus pais. Estávamos em oito pessoas ali. No dia 21 de junho de 2025, a casa foi bombardeada enquanto estávamos dentro. Naquele momento, eu estava sentada amamentando Hani com as crianças e minhas irmãs. Houve uma explosão enorme. Ouvi paredes desabando, pedras caindo, vidros estilhaçando, e então uma fumaça espessa e uma escuridão total. Não conseguíamos nos ver. Ouvi vozes gritando, chorando, perguntando: “Está todo mundo bem? Quem se feriu?”
 
Toquei a cabeça de Hani, depois seu corpo. Quando cheguei à perna direita, ela simplesmente não estava mais lá: se desprendeu na minha mão. Comecei a gritar por ajuda. Não havia ambulâncias. Levaram Hani de mim e o carregaram a pé até o Hospital al-Ma’madani. Fui atrás deles. Lá nos disseram que a perna direita dele foi arrancada até o quadril e que talvez fosse preciso amputar a esquerda também. Estávamos certos de que Hani não sobreviveria.
 
Hani passou por várias cirurgias no hospital para tratar o coto da perna direita, retirar estilhaços do sistema digestivo e da bexiga, e cuidar de um ferimento profundo nas nádegas e na perna esquerda, que estava muito ferida. Depois foi transferido para o Hospital Amigos do Paciente, no bairro a-Rimal, onde ficou três dias na UTI. Após mais dois dias lá, voltamos para o Hospital al-Ma’madani, onde ainda estamos. Estou lá com ele, e meu marido está em uma tenda no oeste da Cidade de Gaza com nossos outros filhos e meus pais.
 
Ainda estou amamentando Hani, mesmo sendo muito difícil por causa dos ferimentos dele. Às vezes complemento com fórmula, quando consigo encontrar. É muito cara e difícil de obter, como tudo o mais. Saímos de casa sem nada. Sem roupas, sem documentos. Mas não vou desistir do Hani. Estou dando a ele tudo o que posso.
 
No hospital, limpam os ferimentos dele uma vez por dia na sala de cirurgia, sob anestesia. Sua região pélvica está constantemente em risco de infecção por estar muito próxima ao reto e à uretra. Ele passou por outra cirurgia no abdômen e agora tem uma estomia. Está em estado muito grave. Ele precisa urgentemente de tratamento fora da Faixa de Gaza, porque o hospital não consegue oferecer o cuidado adequado, não há medicamentos nem analgésicos. Hani sente dores terríveis o tempo todo. Chora sem parar. Estou implorando por ajuda. Preciso tirá-lo da Faixa de Gaza para salvar sua vida.”
 
Hani é o bebê mais novo da Faixa de Gaza a perder uma perna nesta guerra.
 
Depoimento dado à pesquisadora de campo da B’Tselem, Olfat al-Kurd, em 1º de julho de 2025.
 
Fonte: https://www.btselem.org/voices_from_gaza/laylah_ziyarah
 
Tradução > Contrafatual
 
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