Palestina-Israel: a solução de dois estados não é o caminho para a resolução do conflito

Com o recente reconhecimento por parte de vários países ocidentais, entre os quais Portugal, do Estado palestino, cabe perguntar qual a sua eficácia para resolver o conflito naquela zona do globo. Praticamente sem território autônomo, dada a colonização israelita da Cisjordânia e a destruição da faixa de Gaza, sem continuidade geográfica, a impossibilidade da construção de um Estado palestino, para além do seu simbolismo, é evidente.

Para os anarquistas, a solução só poderá passar por uma nova configuração que permita que todos os povos que ali vivem, independentemente da sua origem, religião ou filiação, possam viver em conjunto, com direitos iguais para todos. Isto não se fará com a existência nem da Palestina, nem de Israel, mas sim com uma nova entidade regional. É nesse sentido que vai o recente comunicado da Federação Anarquista Francófona, emitido após o reconhecimento do Estado palestino pelo governo de Macron, e cuja tradução para português publicamos.

“Palestina–Israel: O Estado é tão útil como um buraco na cabeça

Nesta segunda-feira, 22 de setembro de 2025, após várias procrastinações e adiamentos, o presidente francês Emmanuel Macron anunciou que a França reconhece o Estado palestino. Não nos deixemos enganar pelas agendas políticas e geopolíticas e pelas segundas intenções dos poderosos. Esta declaração, na qual Macron fala prontamente de “urgência absoluta” ou de “bombardeamentos em Gaza”, evitando convenientemente o termo genocídio, infelizmente não porá fim ao conflito israelense-palestino.

A situação em Gaza, na Cisjordânia ocupada, no Líbano, etc., deteriora-se dia a dia. Quando um exército como as Forças de Defesa de Israel (IDF) bombardeia, mata e fere dezenas de milhares de pessoas desarmadas sob o pretexto de aniquilar o Hamas, com um plano declarado de limpeza étnica, estamos de fato a testemunhar um genocídio. O termo é agora consensual entre ONGs e jornalistas sérios em todo o mundo.

Os habitantes de Gaza estão a morrer de fome porque o exército de ocupação está a impedir a entrada de ajuda humanitária. Inúmeros médicos relataram caso de “emagrecimento muito severo, com perda significativa de peso e massa muscular”. A Anistia Internacional confirmou num seu comunicado à imprensa de 18 de agosto de 2025 que Israel está a conduzir uma “campanha deliberada de fome” em Gaza. Até mesmo a ONU havia pedido, alguns dias antes, que Gaza fosse provida de ajuda alimentar para evitar a fome. Aqui, novamente, é necessário usar as palavras certas: o exército israelense está a usar a fome como arma de guerra.

As potências “vitoriosas” da Segunda Guerra Mundial estabeleceram, ao final desta, um novo equilíbrio de poder no mundo. Dividiram o bolo entre si.

A partir da Assembleia Geral das Nações Unidas e do Comitê Especial para a Palestina, desde 1947, que Israel e a Palestina têm tentado serem reconhecidos como Estados. Muito rapidamente, Israel foi reconhecido de jure pelos soviéticos e de fato pelos Estados Unidos; o Estado palestino, por sua vez, nunca viu a luz do dia. Apesar disso, pode-se dizer que um protoestado palestino existe desde 1988. De fato, em 15 de novembro desse ano, em Argel, o Conselho Nacional Palestino declarou unilateralmente a independência da Palestina, e quatorze Estados a reconheceram-no imediatamente. Só em 28 de maio de 2024 os primeiros Estados da Europa Ocidental reconheceram o Estado palestino. Foi o caso dos governos espanhol, norueguês e irlandês.

Hoje, a limpeza étnica continua sob o governo israelense de extrema direita. A 15 de agosto de 2025, o governo de Netanyahu discutia com o Sudão do Sul a possibilidade de deportar os habitantes de Gaza – cerca de 2 milhões de pessoas – para aquele país.

A situação atual no conflito palestino-israelense mostra que a formação de um Estado palestino é, pelo menos por enquanto, impossível. O reconhecimento desse Estado anunciado por Macron promete, como o reconhecimento da Espanha, Irlanda ou Noruega, não mudar nada neste quadro ou no destino dos palestinos.

O próprio triste personagem (Macron) refere que “o reconhecimento de um Estado por outros Estados não leva necessariamente à sua existência efetiva “.

Um Estado exclusivamente palestino ou árabe apenas exacerbaria os ódios e as tendências bélicas de ambos os lados e, dadas as forças políticas atualmente em ação, um Estado palestino não se sairia melhor do que seu vizinho em relação aos não palestinos que estariam em seus territórios.

Nesta terra chamada Palestina/Israel, a única solução, após tantos anos de conflito, é uma configuração que permita que todos os povos ali, independentemente de religião ou filiação, vivam juntos. Isso não se dará por meio de dois Estados nacionais, mas por meio de uma entidade única, reconhecendo direitos iguais para todos.

Não se trata de vasculhar nas profundezas de uma história fantasiosa que terá existido há 10, 100 ou 1.000 anos. Devemos nos colocar de acordo no sentido de que todos aqueles que vivem hoje nesta terra (seja qual for o nome que lhe dermos) possam viver juntos em paz. A conclusão do recente folheto da rede Makhno (“Terra Santa, Guerra Sem Fim: A Criação do Estado de Israel na Palestina, Sionismo e Utopias “, ed. du Monde Libertaire, 2025) é inequívoca: “A criação do Estado de Israel é um fracasso humano. Uma verdadeira revolução social e libertária pode resolver definitivamente o conflito israelense-palestino.”

Enquanto isso, e para que todos os palestinos, judeus, muçulmanos, cristãos e outros possam viver juntos, do rio ao mar, devemos continuar a luta para que o Estado israelense ponha fim às colonizações, massacres, exclusões, limpeza étnica, etc.

Devemos pressionar para que os palestinos tenham os mesmos direitos que os israelenses onde quer que vivam nesta terra.

Muito sangue já foi derramado. É preciso acabar com isto

Federação Anarquista Francófona

Segunda-feira, 22 de setembro de 2025″

Fonte: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2025/09/25/palestina-israel-a-solucao-de-dois-estados-nao-e-o-caminho-para-a-resolucao-do-conflito/

agência de notícias anarquistas-ana

saltitando
desconfiado sabiá
sabe onde pisa

Yara Shimada

Leave a Reply