[Itália] Histórias pouco conhecidas: Elena, uma anarquista irredutível

Elena Melli (Lucca, 1889 – Carrara, 1946) foi uma incansável militante anarquista italiana cuja vida inteira esteve dedicada à luta contra a injustiça social e o capitalismo. Desde muito jovem, participou nos círculos anarquistas. Operária na fábrica Ansaldo de Gênova em 1917, se integrou nos movimentos obreiros de Sampierdarena e estabeleceu vínculos com a Unione Sindacale Italiana (USI). Sua militância e suas ideias radicais — como o antimilitarismo e a defesa do amor livre — a converteram em alvo de uma intensa repressão estatal, especialmente dura por tratar-se de uma mulher que desafiava os papeis tradicionais. Foi presa, deslocada, duramente vigiada e confinada em povoados isolados, tentando cortar sua luta.

Durante o Biênio Vermelho (1919-1920), momento insurrecional levado a cabo por anarquistas e socialistas que criaram conselhos obreiros, foi detida no marco de uma série de atentados anarquistas. Ainda que absolvida, reafirmou publicamente sua posição com a frase: “Anarquista nasce, não se faz!”. Pouco depois, participou no atentado do Teatro Diana, organizado por Giuseppe Mariani contra o chefe de polícia fascista. O ataque, que terminou com a morte de 17 pessoas, foi rechaçado pela maioria do movimento anarquista e marcou um ponto de inflexão na luta contra o fascismo. Muitos anarquistas se opuseram no momento ao atentado ainda que, no entanto, foram solidários e se propuseram pessoalmente para a defesa dos anarquistas envolvidos.

Em um clima repressivo altíssimo, Elena seguiu participando na luta antifascista, vinculando-se, por exemplo, à milícia popular anárquica Arditi del Popolo, que enfrentou de armas na mão o fascismo que se consolidava na Itália. Em 1926, após uma série de enfrentamentos e atentados fracassados contra Mussolini, a repressão fascista se incrementou. A Lei Única de Segurança Pública anulou as liberdades civis, e a recém-criada OVRA (polícia política secreta) impôs um sistema de vigilância total sobre os opositores, incluindo Elena, sua filha e o quem nessa ocasião era seu companheiro sentimental, Errico Malatesta. Os três foram submetidos à prisão domiciliar e controle permanente. Qualquer interação com conhecidos era castigada; as pessoas próximas eram interrogadas ou detidas só por cumprimentá-los na rua, e toda sua correspondência era lida pelas forças estatais.

Apesar deste clima de terror, Elena se negou  — junto a Malatesta — a assinar a adesão obrigatória ao regime fascista, diferente de muitas figuras públicas que cederam por medo. Em 22 de abril de 1928 foi detida, como em muitas outras ocasiões, desta vez por escrever a conhecidos em Milão sem nenhuma implicação política, e condenada a cinco anos de reclusão. Após dois meses sem condenação e devido à pressão exercida por vários protestos, Elena foi liberada, mas sob condições de confinamento extremadamente duras.

Pouco depois, sua filha Gemma, de apenas 15 anos, foi agredida brutalmente por um policial. A partir de então, ainda que recebessem ajuda solidária de anarquistas da Itália e do exterior, a repressão se tornou ainda mais implacável. Depois da queda do regime fascista, Elena se transladou a Carrara, zona de forte tradição anárquica onde recebeu ajuda dos companheiros da Federação Anarquista Italiana. Até sua morte em 1946, Elena se manteve fiel a seus princípios, enfrentando sem render-se à repressão, o exílio interior e a violência do Estado que buscou confiná-la uma vez ou outra. Sua vida foi exemplo de dignidade revolucionária, compromisso inquebrantável e resistência. Como anarquista militante, desafiou o poder com coragem, defendendo as ideias anarquistas de solidariedade e apoio mútuo, a violência defensiva revolucionária e a auto-organização, deixando um legado que ainda merece ser reconhecido e recuperado.

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

Burocracia: teia
de aranha morta—o povo
varre com a risada.

Liberto Herrera

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