
Um breve resumo sobre o Brasil, que acolhe a Cúpula do Clima e que, sob uma gestão progre, busca impor sua própria versão da utopia de reformar o capitalismo.
Por Raphael Sanz | 05/11/2025
Está a ponto de começar a COP30 em Belém, capital do estado do Pará e principal cidade da Amazônia brasileira, um território que equivale a uns dois Méxicos e que só não arde como em 2024 porque este é um ano de La Niña e, portanto, as chuvas são um pouco mais abundantes em 2025. Será a trigésima vez que lobistas e representantes de governos e corporações de todo o planeta se reúnem para debater ficções e ajustes irrealizáveis, reformas verdes para o capitalismo e objetivos de descarbonização inócuos e geralmente descumpridos por eles mesmos, enquanto as temperaturas sobem nos oceanos, nos bosques e nos territórios ocupados pelos seres humanos. E nesse 2025, os diversos representantes climáticos mundiais chegam a um Brasil bastante complicado.
A primeira cena deste Brasil é o recente massacre da Penha-Alemão, no Rio de Janeiro, onde ao menos 128 corpos foram executados pelo Estado à céu aberto e enfileirados em uma praça pública. Apenas esfriavam, e os meios de comunicação já repetiam os coros procedentes do próprio governo estatal (responsável pela “operação”) de que todos os mortos eram membros da facção criminosa Comando Vermelho. Não se sabe se o eram ou não. O que sim se sabe é que os principais objetivos da polícia, os chefes do tráfico, não foram vítimas nem presos, a cidade paralisou durante dias e as comunidades afetadas foram castigadas coletivamente pela presença de grupos criminosos ali, os legais (128 cadáveres) ou ilegais.
Mas esta forma de abordar a segurança é uma constante em todo o país. No Rio se tentou de tudo, desde modelos de polícia comunitária (Unidades de Polícia Pacificadora, UPP) que resultaram ser tão violadoras e violentas como a polícia comum, até as infames GLOs (Operações de Garantia da Lei e da Ordem), nas quais o governo federal autoriza o uso das Forças Armadas para ajudar a polícia estatal com a segurança pública. Em 2017, por exemplo, o general Walter Braga Netto dirigiu a GLO que promoveu uma ocupação militar em algumas favelas do Rio, entre elas o Complexo do Alemão. Candidato à vice-presidência de Bolsonaro em 2022, hoje está condenado por tentar um golpe de Estado.
E é aqui que o modelo chegou à Amazônia pela mão da COP30. Na segunda-feira passada, 3, o presidente Lula assinou uma GLO para a capital do Pará a pedido do governador Helder Barbalho. Na terça-feira, 4, pela manhã, os militares começaram a chegar em massa com seus veículos terrestres, aquáticos e aéreos.
Os movimentos sociais temem a repressão que tal segurança pode gerar. Sobretudo em uma COP30 na qual o Brasil tenta fazer um greenwashing de suas recentes decisões ambientais.
E por “recentes” não nos referimos à tragédia que vivemos sob o governo de Bolsonaro, anterior ao atual terceiro mandato de Lula, no qual nossos biomas arderam como nunca antes devido à promoção federal deliberada da expansão das fronteiras da agroindústria e da mineração. A mudança de gestão trouxe consigo, dado o desastre anterior, a ideia errônea de que o Estado brasileiro seria um aliado do resto da humanidade na luta contra o colapso socioambiental que presenciamos diariamente. Não é.
Ao longo da presente administração, em contradição com as promessas de campanha que prometiam delimitar os territórios indígenas e quilombolas e fechar o cerco contra os setores extrativistas (agroindústria, mineração, hidroelétricas, estradas), vimos o contrário. As demoras e os obstáculos burocráticos entorpeceram a proteção das terras indígenas já demarcadas e a demarcação de novos territórios. Os avanços da agroindústria sobre áreas naturais que culminaram no Dia do Fogo em 2024, por não falar da fúria por construir estradas, ferrovias e hidrelétricas que servirão basicamente para que a agroindústria depredadora distribua sua produção e para a chegada em massa dos centros de dados estrangeiros, com seu alto consumo energético e empregos de má qualidade para a classe trabalhadora.
Às vésperas da COP30, o modelo de transição energética que vamos apresentar ao mundo se baseia na premissa de tratar as hidrelétricas como “energia limpa”, em contraposição às termoelétricas e nucleares do exterior. Mas não incluem o desmatamento na equação, que é a principal causa de emissões de carbono por aqui. Belo Monte, hidrelétrica construída em Altamira (município do Pará afetado pela recente GLO), acabou com o exuberante rio Xingu, convertendo-o em um lago, mas não só isso. Também facilitou a chegada de um modelo de desenvolvimento que não prevê manter a selva em pé. Toda a região sofreu desde então o desmatamento e sucessivos incêndios.
O modelo no qual se inscrevem as centrais hidrelétricas exige a construção de estradas e ferrovias que atravessam o bosque. Estas estradas são necessárias para transportar todos os cereais, a madeira, o mineral e a eletricidade produzidos nos rincões mais recônditos do Brasil. E tudo isso também constituirá infraestrutura para as pequenas cidades que começam a crescer devido a este modelo e a exigir mais do meio ambiente local, antes preservado. Temos dois exemplos que estão na ordem do dia em matéria de transporte para ilustrar este modelo: Ferrogrão e a reconstrução da BR-319.
Ferrogrão é uma ferrovia que se prevê que tenha uma extensão de 933 km, saindo de Sinop (estado de Mato Grosso e zona central para a produção de soja e milho na região centro-oeste do Brasil) e chegando ao porto de Miritituba, desde onde a produção transportada desceria pelo rio Amazonas até o mar do Caribe para navegar em direção à Califórnia e China. A obra multimilionária não aporta nenhum benefício social nem ecológico ao Brasil, além de satisfazer os interesses imediatos da agroindústria. Pelo contrário, atravessará áreas de conservação como o Parque Nacional de Jamanxim e afetará a centenas de comunidades indígenas e camponesas. Mas há dois agravantes: o primeiro é que a mera menção por parte do governo federal de que vai construir a ferrovia já aqueceu o mercado de terras da região, que orbita em uma zona cinza entre o legal e o ilegal, entre a especulação e a expulsão; o segundo agravante é que o transporte da produção agroindústria até a China e Califórnia se realizaria através do Canal do Panamá, cuja capacidade de uso já está comprometida devido à crise climática.
E cada vez que se abre uma via férrea ou uma estrada em uma zona natural antes intacta ou pouco afetada, se produz o que se conhece como “efeito espinha de peixe”, precisamente uma consequência do aquecimento do mercado cinza das terras. Observe uma zona de bosque desde cima, como se fosse um satélite ou um drone. Se abre a estrada principal, a espinha dorsal do “peixe”. Pouco a pouco, com o mercado de terras a toda marcha (literalmente queimando tudo), se vão abrindo caminhos secundários para dar acesso às novas áreas ocupadas. E assim vemos como a paisagem se transforma em algo parecido a uma espinha de peixe.
Esta é a principal preocupação dos ambientalistas sérios e dos povos que vivem na região onde se reconstruirá a BR-319, uma estrada que conectaria Manaus (capital do Amazonas) e Porto Velho (capital de Rondônia). O problema é que esta zona, sob o efeito espinha de peixe, levaria o arco do desmatamento até Manaus e abriria o caminho a zonas ainda preservadas do oeste e do norte da Amazônia brasileira. Isto provocaria o colapso dos sistemas amazônicos mais resilientes do Brasil. Os primeiros a senti-lo seriam os brasileiros, com seu sistema de chuvas totalmente destruído. Mas o mundo também veria aumentar alguns graus por isso, agravando o colapso climático à nível global.
Outro problema com a farsa da transição ecológica é que não põe na agenda a criação de quilombos, terras indígenas e áreas de conservação, em troca de parcelar os bosques e prometer sua preservação mediante a privatização e a manutenção da mesma lógica de propriedade privada com a qual chegamos ao momento histórico atual. Recordemos que antes do capitalismo as sociedades humanas nunca haviam sido um perigo para a vida no planeta, só para si mesmas.
A ilusão em torno da utopia de reformar o capitalismo se completa com a cereja deste bolo de cinzas e fogo: semanas antes do início da COP30, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente, organismo federal) autorizou a Petrobrás (empresa petroleira estatal) a investigar a viabilidade da exploração petroleira na foz do rio Amazonas. Trata-se simplesmente de uma zona oceânica muito turbulenta, onde um simples derrame pode afetar a vários países vizinhos. Uma autorização para investigar que sem dúvida se converterá em autorização para explorar, dado o rumo do debate político. Mas querem vender-nos a ideia de que vamos perfurar uma zona muito complicada desde o ponto de vista dos impactos ambientais, extrair rios de petróleo e queimá-los para quem sabe, algum dia, abandonar finalmente os combustíveis fósseis. Talvez quando todos estejamos mortos.
E enquanto vemos ano após ano os “representantes climáticos” celebrando suas festas e discutindo suas ficções, as temperaturas seguem subindo, os bosques seguem caindo e as pessoas seguem vivendo e morrendo cada vez pior. Não é possível debater a questão climática sem incluir o capital e o Estado na equação, como problema em lugar de solução.
Tradução > Sol de Abril
agência de notícias anarquistas-ana
Deserto verde –
Cactos armados só contra
A sede do poder.
Liberto Herrera
Nossas armas, são letras! Gratidão liberto!
boa reflexão do que sempre fizemos no passado e devemos, urgentemente, voltar a fazer!
xiiiii...esse povo do aurora negra é mais queimado que petista!
PARABÉNS PRA FACA E PRAS CAMARADAS QUE LEVAM ADIANTE ESSE TRAMPO!
Um resgate importante e preciso. Ainda não havia pensado dessa forma. Gratidão, compas.