
Das arquibancadas do Beitar Jerusalém às ruínas de Gaza, o esporte e a política se fundiram de maneiras que revelam a profunda ligação do futebol com o projeto estadual de colonialismo e limpeza étnica.
Supõe-se que o futebol seja um esporte que une as pessoas. Em Israel, ele se tornou algo mais sinistro: um palco para o racismo, o militarismo e a propaganda. Das arquibancadas do Beitar Jerusalém às ruínas de Gaza, o esporte e a política se fundiram de maneiras que revelam a profunda ligação do futebol com o projeto estadual de colonialismo e limpeza étnica.
Um novo relatório da Fundação Hind Rajab expõe com grande detalhe como soldados e torcedores organizados (ultras) israelenses usam a cultura do futebol para humilhar palestinos, glorificar a destruição e normalizar o genocídio.
Estádios do ódio
A história começa em casa. A cultura dos torcedores de futebol israelenses há muito é conhecida por seu racismo e violência.
O Beitar Jerusalém se destaca como o mais extremista. É o único grande clube israelense que nunca contratou um jogador árabe, embora os árabes representem cerca de 20% da população do país. Seus ultras, “La Familia”, são conhecidos por seus slogans e ataques fascistas. Eles gritam “Morte aos árabes!”, atacaram trabalhadores palestinos e, em 2013, incendiaram os escritórios de seu próprio clube em protesto contra a contratação de dois jogadores muçulmanos. Para o “La Familia”, o futebol não é apenas esporte: é uma expressão de uma política de pureza e dominação racial.
Mas o problema vai muito além do Beitar. O Maccabi Tel Aviv, o clube mais premiado de Israel, conta com uma ampla base de seguidores. Seus ultras repetidamente entoaram cantos antirárabes e encheram o estádio com bandeiras e faixas (tifos) que glorificam os soldados. Nas arquibancadas, retratos de soldados são exibidos ao lado de bandeiras do clube, desfazendo a linha entre a violência estatal e o orgulho esportivo.
Nem mesmo o Hapoel Tel Aviv, frequentemente retratado como um clube de “esquerda” ou “progressista” devido aos seus vínculos históricos com o movimento operário, escapou disso. Nos últimos anos, seus torcedores desfraldaram faixas celebrando os soldados que lutam em Gaza. O nacionalismo, de acordo com o relatório, impregna todo o espectro do futebol israelense.
Em novembro de 2024, durante uma partida da Liga Europa entre o Ajax de Amsterdã e o Maccabi de Tel Aviv, centenas de torcedores israelenses inundaram a capital holandesa. O que se seguiu não foi a habitual atmosfera barulhenta de um jogo fora de casa, mas uma campanha de intimidação. Residentes árabes foram assediados, bandeiras palestinas foram arrancadas de casas e lojas, e nas praças da cidade, os torcedores gritavam: “Não restam crianças em Gaza”.
A Fundação Hind Rajab apresentou uma queixa à polícia holandesa, mas as autoridades arquivaram o caso alegando “provas perdidas”. Quando semanas depois surgiram novas imagens, a fundação apresentou a queixa novamente, expondo tanto a violência dos torcedores quanto a relutância das instituições europeias em agir.
Incidentes semelhantes foram registrados em outras cidades europeias. Os torcedores do Beitar Jerusalém levaram seus cânticos racistas a Paris e Bruxelas. Torcedores do Maccabi Tel Aviv confrontaram manifestantes pró-palestinos, zombando do sofrimento em Gaza. Em alguns casos, os ultras se coordenam com organizações sionistas locais, transformando as partidas de futebol em focos políticos onde o esporte se torna uma desculpa para a intimidação.
Futebol nas ruínas
Talvez o material mais perturbador do relatório venha da própria Gaza. A HRF compilou dezenas de imagens e vídeos que mostram soldados posando com bandeiras de futebol e cachecóis na frente de casas, escolas e mesquitas demolidas.
Faixas do Beitar Jerusalém pendem em salas de estar destruídas. Uma bandeira do Hapoel Tel Aviv tremula numa varanda com vista para as ruínas de Khan Yunis. Um soldado do Maccabi Netanya intitula sua foto de Gaza com as palavras: “Algo sobre dias de folga em Gaza. Netanya para sempre”.
Pichações e slogans de ultras foram rabiscados nas paredes de casas palestinas, transformando as ruínas em telas de humilhação. Em alguns casos, os soldados dedicam as demolições aos seus clubes ou gravam vídeos onde os bairros arrasados são apresentados como “vitórias”. No Instagram e no Telegram, essas postagens circulam amplamente, recebendo “likes” e o apoio dos torcedores em casa.
O que para os de fora pode parecer um comportamento casual de torcedores é, na verdade, propaganda deliberada. Os símbolos do futebol são usados para reivindicar territórios conquistados, zombar das famílias deslocadas e transformar atrocidades em um espetáculo consumível para os torcedores.
Um padrão sistêmico
A Fundação Hind Rajab sustenta que isso não é obra de alguns poucos soldados rebeldes ou vândalos. É um problema sistêmico.
Em todos os clubes – desde o fascista “La Familia” do Beitar Jerusalém até os ultras do Maccabi Tel Aviv, a suposta torcida “esquerdista” do Hapoel, e mesmo Netanya e Haifa – tanto soldados quanto torcedores usam a identidade futebolística para glorificar a violência. Em todos os estádios – em Gaza, Líbano, Síria e dentro dos estádios israelenses – aparece a mesma imagem. E em todas as formas – bandeiras, pichações, tifos, caricaturas racistas, selfies e postagens nas redes sociais – o propósito é o mesmo: fundir o esporte com o genocídio.
Assim como as moradias são confiscadas e reutilizadas no projeto colonial israelense, as ruínas palestinas são expropriadas como cenários de propaganda. O futebol é usado como arma, como extensão cultural da limpeza étnica.
O chamado por sanções
As implicações são claras. Esses atos não são apenas degradantes e humilhantes, mas constituem incitação e propaganda ao genocídio, proibidas pelo direito internacional.
Para quem defende esse direito, a mensagem é simples: Israel não pode continuar participando do esporte internacional enquanto o futebol for usado como arma dessa maneira.
A campanha “Game Over Israel”, que a HRF apoia, exige que Israel seja suspenso da FIFA, UEFA, FIBA e todas as federações internacionais até que o genocídio termine e haja prestação de contas. Há precedentes: a África do Sul do apartheid foi excluída do esporte mundial durante décadas, e a Rússia foi suspensa da FIFA e da UEFA poucas semanas após sua invasão da Ucrânia. Cada partida que Israel joga hoje nas competições da UEFA é, de acordo com a fundação, uma vitória propagandística de um regime genocida.
“O futebol e o genocídio não podem coexistir”
O futebol deveria unir. Em Israel, ele se tornou uma arma de divisão, humilhação e propaganda. Soldados acenam com bandeiras de ultras nas ruínas de Gaza. Torcedores entoam cânticos genocidas em praças europeias. Os estádios glorificam os soldados enquanto lares são destruídos.
Isso não é coincidência. É sistêmico.
A Fundação Hind Rajab afirma que continuará documentando, apresentando casos e fazendo campanha até que Israel seja excluído do esporte internacional. “Assim como a África do Sul do apartheid foi banida, Israel também deve enfrentar o isolamento”, conclui o relatório.
O futebol e o genocídio não podem coexistir.
Fonte: https://www.hindrajabfoundation.org/posts/how-israeli-football-culture-became-a-weapon-of-genocide
Tradução > Liberto
agência de notícias anarquistas-ana
pobre carteiro,
sofre com o cão
o dia inteiro
João César dos Santos
Nossas armas, são letras! Gratidão liberto!
boa reflexão do que sempre fizemos no passado e devemos, urgentemente, voltar a fazer!
xiiiii...esse povo do aurora negra é mais queimado que petista!
PARABÉNS PRA FACA E PRAS CAMARADAS QUE LEVAM ADIANTE ESSE TRAMPO!
Um resgate importante e preciso. Ainda não havia pensado dessa forma. Gratidão, compas.