
Jeff Shantz, escritor anarquista, poeta, fotógrafo, artista e ativista.
No período atual, as necessidades de acumulação do capital provocaram consequências ainda mais nefastas. Da perspectiva do capital, já não basta despojar: a acumulação, para o capital, requer extermínio. O capital já não está disposto a permitir que lucros sejam desviados, nem mesmo um mínimo, para servir a setores da classe trabalhadora que considera dispensáveis, desnecessários para o capital, tanto para a produção quanto para o consumo. Abrir caminho para a acumulação significa eliminar a classe trabalhadora.
O capital é aceleracionista e os movimentos da classe operária devem reconhecê-lo, assumi-lo e responder em conformidade. Um aspecto do projeto neoliberal que com demasiada frequência não foi reconhecido e do qual se falou muito pouco foi a aceleração capitalista. Enquanto a análise crítica se concentrou compreensivelmente na austeridade neoliberal, na desregulamentação, na transferência de riqueza para o topo e na repressão, o aspecto aceleracionista disso tem sido frequentemente minimizado ou completamente omitido, com algumas exceções como o importante trabalho de Paul Virilio.
A aceleração neoliberal teve dois componentes: um para liberar e acelerar a exploração e a acumulação capitalista, como na desregulamentação, na eliminação dos sindicatos, no livre comércio, etc. O outro aspecto tem sido a aceleração da vida e do trabalho da classe trabalhadora, por meio da intensificação da explotação (speed ups), facilitada em parte pela informatização, automação e inteligência artificial (IA), mas também pelo “local de trabalho” 24 horas por dia das redes sociais, e-mail, trabalho on-line e o mercado on-line a toda hora.
A liberalização da acumulação teve como consequência o deslocamento da classe trabalhadora, o que a tornou mais precária, mas também mais circulável. O fechamento dos locais de trabalho (desindustrialização, como ocorreu sob o impacto do livre comércio, por exemplo), o desapossamento das comunidades da classe trabalhadora, a gentrificação e o deslocamento da classe trabalhadora urbana, a privatização dos serviços públicos e sociais, a pura mercantilização da habitação (o fim da habitação social e do controle de aluguéis, etc.).
A perturbação, o despojamento e o deslocamento das comunidades da classe trabalhadora tiveram um aspecto temporal que muitas vezes é ignorado. Eles desestabilizaram e alteraram os ritmos cotidianos da vida da classe trabalhadora. Os dias estruturados em torno de ritmos familiares de trabalho (dentro ou fora de casa), relaxamento, descanso e lazer desapareceram para muitos em condições de trabalho aceleradas: trabalho por hora, múltiplos empregos, trabalho virtual, busca permanente por trabalho, etc.
A classe trabalhadora perdeu as amarras, certamente limitadas, que lhe ofereciam uma certa proteção contra as forças da aceleração. Assim, não só a precariedade foi acelerada, mas também a rapidez com que ela ocorre.
As obras muito diferentes que ofereceram a análise mais desenvolvida dos processos subjacentes do neoliberalismo aceleracionista e da acumulação são a extensa análise de Paul Virilio sobre a política da velocidade (que remonta aos anos oitenta) e os amplos debates de David Harvey sobre a acumulação por espoliação.
Harvey detalha esses diversos componentes do desenraizamento da classe operária sob o neoliberalismo e a limpeza da classe operária para ajudar e instigar a circulação capitalista, eliminando os obstáculos aos fluxos de capital que são o que a classe operária e suas formas de vida representam fundamentalmente para o capital.
A acumulação por espoliação destaca a vileza desavergonhada e agressiva com a qual o capitalismo arrasa o planeta hoje em sua corrida desesperada para transformar a vida em mercadoria e abrir ou acelerar os circuitos de realização do lucro, e a necessidade do capital de eliminar as barreiras à realização. Como explica Harvey em “Breve História do Neoliberalismo”:
“Com isso me refiro à continuação e proliferação de práticas de acumulação que Marx havia tratado como “primitivas” ou “originais” durante o surgimento do capitalismo. Entre elas se incluem a mercantilização e privatização da terra e a expulsão forçada de populações camponesas (comparem-se os casos, descritos anteriormente, do México e da China, onde se acredita que 70 milhões de camponeses tenham sido deslocados nos últimos tempos); a conversão de várias formas de direitos de propriedade (comum, coletiva, estatal, etc.) em direitos de propriedade privada exclusiva (representada de forma mais espetacular pela China); a supressão dos direitos aos bens comuns; a mercantilização da força de trabalho e a supressão de formas alternativas (indígenas) de produção e consumo; a colonização, neocolonização e privatização da terra.) em direitos exclusivos de propriedade privada (o caso mais espetacular é o da China); a supressão dos direitos aos bens comuns; a mercantilização da força de trabalho e a supressão de formas alternativas (indígenas) de produção e consumo; os processos coloniais, neocoloniais e imperiais de apropriação de ativos (incluindo os recursos naturais); a monetização da troca e da tributação, em particular da terra; o comércio de escravos (que continua, em particular, na indústria do sexo); e a usura, a dívida nacional e, o mais devastador de tudo, o uso do sistema de crédito como meio radical de acumulação por espoliação“.
Com o terreno limpo, o capital se liberta para acelerar – e persegue a aceleração contínua como seu próprio fim, como Virilio destacou e sublinhou muito antes. Frear, para o capital, é morrer.
Da acumulação por espoliação à acumulação por morte
No período atual, no entanto, as necessidades de acumulação do capital levaram a resultados mais viciosos. Já não basta, da perspectiva do capital, desapossar: a acumulação, para o capital, exige o extermínio. O capital já não está disposto a permitir que qualquer lucro seja direcionado, nem mesmo um mínimo, para servir a setores da classe trabalhadora que considera dispensáveis, desnecessários para o capital, tanto para a produção quanto para o consumo.
Abrir caminho para a acumulação significa eliminar os resíduos da classe operária de forma completa e permanente, da perspectiva do capital. O capital não está disposto a destinar nada para manter a classe trabalhadora desnecessária, nem mesmo em condições de pobreza extrema. Um centavo gasto com a classe trabalhadora excedente é um centavo desperdiçado.
Isso se demonstra plenamente tanto na demanda do capital por cortes fiscais quanto em suas demandas por cortes nos serviços humanos essenciais – bem-estar, saúde, habitação, abrigo, redução de danos, educação em todos os níveis. O resultado pretendido é a morte das massas de pessoas que precisam desses serviços. A expansão das infraestruturas assassinas (independentemente do seu custo porque têm utilidade para o capital) – polícia, prisões, exército, forças de fronteira – garantirá que as mortes ocorram com rapidez.
A morte se torna um resultado político crucial, o assassinato se torna o serviço essencial.
Uma parada brusca: contra o anticapitalismo desaceleracionista
Isso tem implicações significativas para os movimentos da classe trabalhadora e a resistência em geral (incluindo a anticolonial e anti-imperialista), assim como para o próprio anticapitalismo. Os movimentos anteriores, ao longo de gerações, foram em geral o que poderíamos chamar de desaceleracionistas: tentaram desacelerar, frear, limitar, negociar e gerenciar a velocidade do desenvolvimento capitalista: desacelerar o desenvolvimento capitalista, desacelerar a propagação de seus danos e impactos, desacelerar o crescimento e a exploração. Isso determinou as abordagens, os objetivos e os prazos da organização.
O aceleracionismo capitalista faz tudo isso explodir pelos ares. A velocidade do capitalismo e sua ânsia por acumulação estão desencadeando desastres, crises e mortes em massa. Está perturbando, desapossando e deslocando com tal rapidez que só deixa um rastro de carnificina.
Já não há tempo para uma desaceleração: a vida planetária, sob a ameaça da crise climática, enfrenta o seu fim. A oposição anticapitalista não só deve acelerar suas capacidades para acabar com o capitalismo, mas deve se orientar agora para uma parada brusca, não uma desaceleracão, mas uma pausa de emergência, uma parada brusca e contundente.
Mais informações
Harvey, David. 2003. The New Imperialism. Oxford: Oxford University Press
Harvey, David. 2005. A Brief History of Neoliberalism. Oxford:Oxford University Press
Virilio, Paul. 1986. Speed and Politics. New York: Semiotext(e)
Virilio, Paul and Sylvere Lotringer. 1983. Pure War. New York: Semiotext(e)
Tradução > Liberto
agência de notícias anarquistas-ana
Um haicai proce
Jovem tão primaveril
Alma juvenil
Ivanilton Tristão
Nossas armas, são letras! Gratidão liberto!
boa reflexão do que sempre fizemos no passado e devemos, urgentemente, voltar a fazer!
xiiiii...esse povo do aurora negra é mais queimado que petista!
PARABÉNS PRA FACA E PRAS CAMARADAS QUE LEVAM ADIANTE ESSE TRAMPO!
Um resgate importante e preciso. Ainda não havia pensado dessa forma. Gratidão, compas.