Comunicamos que, depois de um longo processo de discussão – que envolveu toda a Coordenação Anarquista Brasileira (CAB) e a Coordenação Anarquista Latino-Americana (CALA) –, a Organização Anarquista Socialismo Libertário (OASL, de São Paulo), a Federação Anarquista do Rio de Janeiro (FARJ), a Rusga Libertária (RL, de Mato Grosso) e o Coletivo Mineiro Popular Anarquista (COMPA, de Minas Gerais) tomaram a decisão de sair da CAB.
Apesar de estar se dando de modo respeitoso, essa separação reflete diferenças políticas significativas e visões que, neste momento, consideramos inconciliáveis. O motivo central de nossa saída tem a ver com o balanço que fazemos dos últimos anos da CAB e, também, dos caminhos que entendemos serem necessários para o próximo período de desenvolvimento das lutas sociais e do anarquismo organizado brasileiro. Entendemos que, enfim, é hora de superar o status de coordenação e fundar uma organização política anarquista nacional.
O especifismo brasileiro sempre teve como projeto a fundação de uma organização nacional. A primeira tentativa foi a Organização Socialista Libertária (OSL), que funcionou entre 1997 e 2000. Contudo, não deu certo, já que foi construída de maneira apressada e sem a devida maturidade dos estados e sua militância. A maior conquista desse primeiro processo foi o impulsionamento das experiências estaduais da Resistência Popular (RP), iniciadas em 1999. Foi a partir delas que voltamos a reinvestir no processo político e organizativo, dessa vez, com muito mais calma, fundando, em 2002, o Fórum do Anarquismo Organizado (FAO). Abrimos mão daquela unidade pretendida na OSL e passamos a reunir indivíduos, grupos e organizações em torno apenas do acordo com dois eixos: necessidade de organização e necessidade de trabalho social (de massas).
Como em qualquer processo de construção política, ocorreram os momentos de desacordos, tensões, conflitos e cisões internas. Com a saída da atual União Popular Anarquista (UNIPA) e o fim do Luta Libertária (LL) / Organização Socialista Libertária de São Paulo (OSL-SP), o FAO começou a se renovar internamente a partir de 2009, com a reaproximação da FARJ e de um conjunto de organizações estaduais que haviam se formado sob sua influência e até mesmo com a presença de seus militantes. Todas as organizações dessa rede ingressaram no FAO a partir de 2009; as iniciativas estaduais mais consolidadas (RJ, SP, CE, PR, SC) e outras que iniciavam sua articulação (MG, PE, uma nova reconstrução na BA, entre outros). Nesse processo todo, até a junção com os novos estados consolidados e em articulação, foram muito importantes alguns estados que estiveram (primeira formação na BA e uma articulação em GO) e outros que permaneceram no FAO (especialmente RS, AL e MT), os quais desempenharam protagonismo. Essa fusão permitiu os grandes avanços que culminaram na fundação da CAB, em 2012.
A proposta, naquela ocasião, era dar um passo rumo à organização nacional. Saíamos da organicidade de um fórum (espaço para troca de informes e realização de tarefas em comum) para uma coordenação (articulação nacional de organizações estaduais). Nessa nova etapa, estabelecemos que construiríamos uma organização nacional no médio prazo para fortalecer a luta ideológica e social no Brasil. Queríamos ir unificando as concepções e os processos para, em médio prazo, formar uma organização política anarquista nacional. Essa necessidade de unificação era um desafio complexo, pois o FAO e a rede que se construiu em torno da FARJ remetiam à lógica dos “grupos orgânicos”, proposta no documento “Luta e Organização”, de 1996. Havia, naquele momento, uma pluralidade de concepções e realidades, que fomos homogeneizando a partir de 2009, num movimento que teve continuidade ao longo dos primeiros anos da CAB. Ainda que todos os estados defendessem o especifismo e suas linhas gerais, haviam muitos outros aspectos que necessitavam ser homogeneizados, tanto em termos ideológicos e teóricos, quanto em termos estratégicos e programáticos.
Conseguíamos, até aquele momento, caminhar em nosso projeto, aprofundar a organicidade e os trabalhos sociais, mantendo esse horizonte de uma organização nacional que vinha sendo construída. Diversos aspectos estavam se desenvolvendo e avançando, ainda que parcialmente, na direção da mencionada unidade nacional, consolidando uma nova etapa do nosso projeto organizativo.
Entretanto, há aproximadamente quatro anos, nossas organizações passaram a ver esse movimento de maneira mais crítica, algo que foi se aprofundando e chegou a seu ápice no II CONCAB, de 2021, sediado em São Paulo. Nossa maior crítica é que, de maneira geral, os avanços da CAB haviam se interrompido e estavam se fortalecendo, na coordenação, aquilo que chamamos de “caminhos inconciliáveis” – nos termos que intitularam o próprio documento que iniciou a desvinculação de nossa Regional da CAB – para entender teoricamente o anarquismo e colocá-lo em prática.
As críticas que fizemos à CAB foram diversas, e formalizadas nesse documento. Não é nosso intuito retomar o que foi ali colocado. Basta apontar que o aspecto central de nossa crítica é que, em nossa região (Sudeste/Centro-Oeste), já estávamos funcionando como uma organização política regional, unificando processos, concepções, linhas etc. Entendíamos ser necessário seguir para a nacionalização, conformando, enfim, a organização nacional que estava em nosso projeto, desde 2012. No entanto, para que isso fosse possível, era necessário solucionar o problema dos “caminhos inconciliáveis” que existiam dentro da CAB, os quais passavam por três grandes aspectos: 1.) Concepção de organização política anarquista; 2.) Linha e prática política; 3.) Linha teórica e ideológica. É importante colocar que, para nós, essas críticas também foram apontadas como autocríticas, já que estávamos participando do processo organizativo, tínhamos também responsabilidade nos problemas que apontávamos.
Contudo, em nossa avaliação – que tinha como base todos os debates dos últimos anos nas mais diferentes instâncias da CAB –, haveria grandes divergências às nossas críticas e proposições. Reconhecendo que a CAB tinha cumprido um papel importante para a construção organizativa nacional do anarquismo e que existiam posições distintas, com diferentes gradações, sobre os diferentes pontos que mencionávamos, compreendemos que talvez o melhor caminho fosse dar fim à própria CAB, reconhecendo seu esgotamento como ferramenta. Então, aqueles/as que quisessem avançar em termos organizativos (como na nossa proposta) fariam isso, e aqueles/as que não quisessem conformariam um outro fórum ou coordenação.
Ocorreram intensas discussões e diferentes respostas para nosso documento. No entanto, de modo geral, as demais organizações alinharam-se no sentido de discordar que a dissolução da CAB seria a melhor alternativa. Recusaram, portanto, a proposta de nossas organizações. Nossa militância, sem perspectivas de resolução dos problemas apontados, e evitando acirrar os conflitos, decidiu deixar a CAB. Informamos, nesta ocasião, que pretendemos nos constituir, logo em breve, como organização política anarquista e avançar para a nacionalização.
>> Para ler o texto na íntegra, clique aqui:
https://www.anarkismo.net/article/32699
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