[tradução do capítulo 14 do livro Anarchy in the Age of Dinosaurs, por Curious George Brigade]
Raça é uma questão que há muito assusta e confunde radicais nos Estados Unidos. Anarquistas brancos estão especialmente chocados com a falta de diversidade, especialmente de negros, entre as pessoas que se juntam a eles nas ruas e no trabalho coletivo. Anarquistas brancos já gastaram infinitas horas tentando localizar “onde fica a cor”, seja em manifestações antiglobalização ou em suas infolojas locais. Ao redor do mundo a maioria dos anarquistas não são brancos. Nos últimos anos a comunidade anarquista dos Estado Unidos começou a se parecer mais com o resto do mundo: étnico e culturalmente diverso. Um número crescente de latinos, asiáticos, árabes e outras pessoas racializadas têm se identificado como anarquistas, e ainda assim isso não é o suficiente para aplacar o sentimento de que falta alguma coisa. Não nos enganemos, o que mais preocupa os anarquistas brancos não é a ausência de latinos ou asiáticos em seus grupos, mas a ausência de negros. Isso pode ser o resultado de uma história cultural racista única dos EUA. Raça é um aspecto essencial da opressão estatal e um pilar da exploração capitalista. Nenhum desafio genuinamente revolucionário seja contra o Estado ou o capitalismo nos EUA pode ignorar a importância do racismo na manutenção do atual sistema e os anarquistas também não. Infelizmente, tokenismo, exigências por programas de auxílio, e outros vestígios da Esquerda, não fez das comunidades anarquistas um lugar acolhedor para pessoas negras.
Apesar da nossa crescente diversidade étnica e racial, ainda paira o espectro de que o movimento anarquista é muito branco. Anarquistas brancos geralmente se sentem tão frustrados com a visível ausência de pessoas negras em projetos anarquistas que eles facilmente se tornam suscetíveis a jogos de poder de indivíduos – anarquistas ou não – que falam por comunidades negras. Muitas vezes um ativista (geralmente uma pessoa branca especializada em antirracismo) implode reuniões acusando os participantes de racismo. Pelo medo de serem rotulados de racistas, coletivos inteiros podem se paralisar por sua inabilidade de atrair (apesar de que, o jargão marxista de recrutar seria uma palavra mais adequada) pessoas negras para seus projetos. Em outros momentos, as questões raciais e de preocupações de diversidade tem involuído em acusações estridentes levando a culpa branca autodestrutiva. Coletivos brancos têm chegado a aliviar sua culpa procurando membros da comunidade negra local para se juntar a eles, em espasmos de tokenismo que não beneficiam ninguém.
Inúmeras horas e muita preocupação foram dedicadas à criação de um alcance eficaz para comunidades negras. Apesar da quantidade de discussões sobre os anarquistas dos Estados Unidos serem majoritariamente brancos, houve muito pouco avanço em atrair pessoas negras para a anarquia. Alguns grupos se tornaram Testemunhas de Jeovás políticas: ativistas brancos indo de porta em porta em comunidades negras, pregando os benefícios do anarquismo. Isso é o paternalismo em sua pior forma, assumindo que é o “fardo do anarquista branco” elevar a consciência de toda pessoas negras a altura de nossas crenças políticas. Esse comportamento é especialmente hipócrita quando anarquistas brancos vivendo em comunidades negras empobrecidas taxam outros anarquistas de racistas, enquanto gentrificam vizinhanças inteiras. Alguns sugeriram diminuirmos a retórica e os princípios anarquistas, mudando a forma que nos vestimos ou o tipo de música que ouvimos, para não alienarmos as pessoas negras, como se a comunidades delas fossem menos tolerantes ou mais conformistas que qualquer outra sociedade. Alguns sugeriram que precisamos trabalhar com organizações autoritárias em comunidades negras para podermos os persuadir a causa anarquista. Isso sugere que organizações autoritárias são típicas de comunidades negras. Assume, implicitamente, que somente brancos podem realmente apreciar abordagens não-hierárquicas de organização e que pessoas negras se incomodariam com ideias tão radicais. Essas tentativas, apesar de geralmente sinceras, são paternalistas e sugerem um profundo desrespeito por comunidades negras. Elas ignoram a longa história de antiautoritarismo negro, das revoltas de escravizados de Nat Turner ao movimento por autonomia negra nos anos 80. Tanto paternalismo também demonstra uma imensa ignorância do número de instituições autoritárias brancas que se enraizaram em comunidades negras, do cristianismo evangélico ao partido democrata.
É um absurdo acreditar que comunidades negras, especialmente aquelas vivendo sob as botas da brutalidade policial, são tão frágeis a ponto de serem alienadas por aparências externas ou gosto musical. Por exemplo, após as revoltas de 2002 em Cincinnati, um contingente de anarquistas planejando tomar as ruas debateu se “blocar” confundiria as pessoas negras e causar mais repressão policial para a comunidade local. Esses medos se mostraram infundados. Quando anarquistas mascarados apareceram um pastor local, um homem negro, comentou como estava impressionado que a “garotada de Seattle” (nas palavras dele) tinham vindo para Cincinnati e estavam marchando ombro a ombro na comunidade, contra a brutalidade policial. Ele até pediu por um cartão de visita (!) para se manter em contato com os anarquistas para futuras colaborações. Os anarquistas também ensinaram vários grupos de adolescentes negros como transformar suas camisetas em máscaras para que evitassem identificação e repressão policial. Esse pequeno exemplo ilustra que comunidades negras podem estar dispostas a fazerem alianças com pessoas com diferentes táticas, roupas, e culturas, se a parceria for de iguais trabalhando em solidariedade. Não deveria ser surpresa que comunidades negras em Cincinnati reagiram positivamente à anarquistas brancos.
Fonte: https://hiperobjeto.blackblogs.org/2024/08/29/a-abolicao-do-assistencialismo/
agência de notícias anarquistas-ana
vozes no brejão
o cururu dos sapos
ecoando noite adentro
Paladino
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!