[EUA] ARB #8 Verão/Outono de 2024

A Anarchist Review of Books (Resenha Anarquista de Livros ) publica textos inteligentes, não acadêmicos com uma perspectiva antiautoritária. Estamos dedicados a transformar a sociedade por meio da literatura e da crítica aberta e incisiva aos meios de comunicação, política, história, arte e escrita que moldam o nosso mundo.

Imagem de capa: Whose Streets (Ruas de quem) de Tabitha Arnold. Bordado com agulha de punção em lã sobre linho, 2020

Bem-vindo à oitava edição da Anarchist Review of Books, produzida por um coletivo com base em Atlanta, Baltimore, Chicago, Exarchia, Nova York, Oakland, Richmond e Seattle.

Como o editor da ARB, Nick Mamatas gosta de dizer: “Se você não usar a sua imaginação, outra pessoa fará isso por você”. Em nenhum lugar isso é mais relevante do que nos Estados Unidos, onde dois partidos políticos, educados nas mesmas instituições, que investem nos mesmos estoques, subordinados às mesmas corporações corruptas e ao mesmo sistema judiciário e empregando o mesmo exército, polícia e serviços secretos, criaram uma ilusão de diferença extrema entre si; uma histeria que leva os americanos a imaginarem tios conservadores como nazistas e terroristas disfarçados de calouros universitários. O claro e inegável fato é que, uma única ideologia cravou suas garras na garganta da América. O capitalismo governa, e a classe é o único assunto proibido em uma nação ferozmente dividida entre a escolha de eleger um policial sorridente ou um bilionário raivoso.

Essa alucinação de diferença não se limita a seguidores adeptos e partidos políticos. Ela se estende para os espaços radicais, onde pessoas que, fundamentalmente estão de acordo e que foram atacadas pelas mesmas forças, abandonaram a solidariedade necessária para enfrentar as crises atuais; de fato, chegam a acreditar que devem vigiar uns aos outros e explicar o mundo uns aos outros; efetivamente entediando, irritando e alienando uns aos outros até entrarem em um estado de desespero. Uma greve geral seria muito mais divertida.

Como isso aconteceu não é um mistério, e pode-se encontrar amplas análises sobre o assunto, inclusive nas páginas desta revista, mas os mecanismos pelos quais isso é produzido e sustentado são algo a que os antiautoritários deviam dar sua total atenção. A ilusão de “escolha” e “significado” criada pelo excesso de informação, pelos ciclos de notícias incessantes e pela proliferação de desinformação gerada por IAs é o pesadelo dos Situacionistas tornado realidade. Sob a monopolização da atenção e a captura da imaginação, novas possibilidades, ação coletiva e pensamento individual tornam-se cada vez mais difíceis. Como podemos sonhar com algo novo dentro deste quadro? Como podemos dar vida a esse sonho e protegê-lo?

Como disse Shellyne Rodriguez nestas páginas, a tomada de grupos como o Black Lives Matter nos EUA e o controle sobre os direitos dos migrantes no Mediterrâneo pelas ONGs é um alerta para todos nós. Esse tipo de gestão contrarrevolucionária dos movimentos está rapidamente tomando também projetos menores de ajuda mútua, transformando práticas de sucesso de longa data, como ocupações, assembleias populares, distribuição de alimentos por voluntários e iniciativas de saúde, em empreendimentos privatizados ou financiados pelo Estado, ou em iniciativas de elites, como a Park Slope Food Coop. Entrar na lógica entorpecente e isolante do império e argumentar dentro dessa lógica não é apenas perder possibilidades de mudança, solidariedade e autodeterminação, mas também perder a alegria e paz de espírito.

O imaginário empírico e mercadológico; o mito da meritocracia; dos profissionais humanitários e tecnocratas altruístas; dos homens que se fazem sozinhos e dos patriotas trabalhadores do interior—esses são temas, personagens e cenários que atendem ao desejo humano por uma narrativa, mas têm pouco a ver com o mundo observável.

Existem poucos recursos para lutar contra um inimigo que emprega nosso desejo inato por fantasia e construção de sentido para nos pacificar, entorpecer e controlar. Abandonar a própria imaginação é uma garantia de derrota. É entregar o último território em que realmente podemos nos firmar.

Como todo bom soldado ou místico sabe, são os corações e as mentes que importam; os corpos são sempre descartáveis.

Nas páginas desta edição, não trazemos soluções, mas rachaduras na armadura, buracos nas muralhas da fortaleza, espaços para pensar algo novo. O que fazemos com esses espaços depende de nós. Nesta edição, temos relatos de movimentos populares na Cisjordânia, Argentina e, nos EUA, Philip Shelley nos lembra o que é transgredir, Aleksandra Kaminska entrevista Eileen Myles, Dread Scott e David Baillie falam sobre as raízes antifascistas (e fascistas) do Punk, Elly Bangs nos traz uma visão do futuro, e Maria Xilouri nos mostra como podemos sonhar e nos deixar levar; além de resenhas de Heather Bowlan, Jules Bentley e Agnes Borinsky, e arte de Tabitha Arnold, Jess Vieira, Jesse L. Freeman, John Ahearn, Scott Treleaven, Joy Drury Cox e Sylvia Plachy.

TODO O PODER À IMAGINAÇÃO

Cara Hoffman 

Agosto de 2024

anarchistreviewofbooks.org

Tradução > Alma

agência de notícias anarquistas-ana

No espelho d’água
oculta sua face, tímida,
a lua nublada.

Douglas Eden Brotto

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