[EUA] ‘Limpeza doméstica’ é uma metáfora principalmente política

de Noah Siela | 14/11/2025

Suze apareceu com um balde e esfregão e aquele tipo de equilíbrio que vem de viver sem rede de segurança. Com uma mão na maçaneta, a outra segurando sprays e trapos, subiu os meus degraus congelados como quem resolveu problemas mais difíceis do que a gravidade. Por dentro, ela se movia como alguém entrando num mundo que já havia decidido o seu valor.

Por alguns meses no último inverno, ela limpou a casa, a restaurando para algo no qual pudéssemos morar. A minha esposa e eu trabalhamos demais. Três filhos adotivos, uma pilha de contas, a correria de sempre. Eu me convencia de que estávamos ganhando tempo, mas nunca parecia certo.

Uma tarde, ao sair, ela notou o adesivo no para-choque no meu carro. A ação direta traz resultados.

“É o seu?” perguntou, com a mão no puxador, o balde do esfregão ao lado.

Era. Foi assim que a conversa começou.

Suze era anarquista. Não do tipo de desenho animado, nem de caos ou bombas de fumaça. Anarquista autodidata, o que seria mais puro do que descobrir Chomsky em um dormitório e citá-lo como se fosse uma escritura. Falava sobre a anarquia como uma forma de viver desafiando hierarquias invisíveis: o chefe, o senhorio, o porteiro, o burocrata. Ela disse que era sobre desaprender obediência antes da obediência desaprender você.

Teria sido mais fácil se ela fosse ingênua ou séria, mas não era. Suze era afiada, engraçada, ancorada no real. A política não era um hobby. Era uma forma de sobrevivência.

O que ainda me incomoda é o quanto eu concordava com ela. Eu acreditava que o sistema deveria ser desmontado, que reformas eram só atrasos. Porém, também passei a vida dentro do sistema, ajudando a funcionar, me convencendo de que o incrementalismo era sanidade.

Nove meses após o início desse governo, já parece que esquecemos o que o último devia ter ensinado. As pessoas que prometeram estabilizar o navio estão se parabenizando por não virarem, como se simplesmente não ser monstruoso contasse como progresso moral. O combate ao extremismo endureceu, se tornando um tipo de calma gerencial que confunde competência com mudança. Para o resto de nós, pessoas como eu, chamamos isso de progresso porque estamos cansados demais para chamar pelo nome: sobrevivência disfarçada de virtude.

Suze não tinha paciência para nada disso. Ela disse que confundimos ordem com paz. Que o país continuava confundindo silêncio com justiça. Que o poder depende da nossa disposição de acreditar que nada pode mudar.

Eu apoiei políticos que tentaram tirar os tradicionais do torpor. Torci por eles, fiz doações, me senti justo por uma semana e depois os vi serem esmagados. Foram financeiramente sufocados, zombaram deles ou foram transformados em histórias de advertência. O que eu fiz, então? Suspirei, racionalizei e fui votar na ilusão que a MSNBC vinha vendendo desde que chegou a Iowa com câmeras e uma costeleta de porco no espeto. A alternativa era fascismo ou fascismo leve, e votar na ilusão parecia responsável.

Só que foi esse tipo de responsabilidade que abriu caminho para o fascismo para começo de conversa. Pessoas como eu continuaram escolhendo a opção segura até que a própria segurança se tornasse vazia o suficiente para algo cruel atravessar e se chamar de renovação.

Nove meses depois, não consigo dizer se algo está sendo consertado ou se estamos só aprendendo a conviver com o barulho novamente. O mercado imobiliário continua sendo um cassino. Escolas desmoronando sob guerras falsas sobre livros. O custo de permanecer na classe média parece uma assinatura vitalícia do cansaço. O movimento que deveria corresponder ao momento parece se preocupar principalmente com a civilidade, como se a educação fosse um plano político.

A civilidade não importava para Suze. Estava ocupada demais em sobreviver para precisar de permissão. Limpava as casas para pessoas que tinham o luxo do cansaço. Ela nunca suavizava a sua raiva para algo controlável. Continuava acreditando em derrubar tudo. Acreditando em quebrar aquilo que está te quebrando. Toda vez que saía de casa, eu a via descendo os degraus e pensava: lá vai alguém que ainda não se rendeu à mentira do equilíbrio, que se recusa a chamar o cansaço de sabedoria.

Aquele adesivo de para-choque do qual falamos não está em uma van enferrujada. Está em um Subaru mais novo, o veículo oficial das escolhas liberais habituais, o que me torna o clichê, o cara que fala sobre destruir sistemas enquanto dirige um símbolo de mantê-los confortavelmente intactos.

A piada amarga é que todo o arranjo, dois adultos trabalhando demais, três filhos, eu comprando tempo de alguém que não tinha nada para vender, nunca foi sobre luxo. Era sobre exaustão fingindo ser estabilidade.

Alguns meses de contadores brilhantes. Suze pagou. Eu, sentado aqui, agora, percebendo que, nove meses após o início do governo, a mulher com o esfregão é a única que continua dizendo a verdade.

Noah Siela foi criado em estradas rurais de cascalho, moldadas por uma cidade universitária do Meio Oeste e uma cidade da Costa Leste, EUA, e se interessa pelas pessoas que tornam esses lugares únicos. É diretor do Programa de Educação de Adultos e Alfabetização das Escolas Públicas de Columbia. Escreve uma coluna mensal para o Missourian.

Fonte: https://www.columbiamissourian.com/opinion/local_columnists/cleaning-house-is-mostly-a-political-metaphor/article_4e43cc19-c03c-4bca-8cd6-320383f5d43f.html

Tradução > CF Puig

agência de notícias anarquistas-ana

Janela fechada:
borboleta na vidraça
dá cor ao meu dia.

Anibal Beça

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