A emergência devido ao vazamento de petróleo no Equador não terminou dois meses depois

Embora a mancha negra deixada pelos 25.117 barris de petróleo tenha se dissipado, a vida na província costeira de Esmeraldas está longe de voltar ao normal

Um líquido oleoso que escorria do camarão pomada surpreendeu Eduardo Rebolledo enquanto ele pescava no final de abril no setor de Las Piedras, na província de Esmeraldas. Dois meses após o vazamento ocorrido em 13 de março de 2025, considerado um dos maiores da história do Equador, os vestígios de petróleo na água ainda estão presentes e demonstram que a emergência não acabou. “São os resíduos do petróleo dispersos no mar”, explica o biólogo marinho da Universidade Católica do Equador, Sede Esmeraldas, sobre a substância que encontrou enquanto praticava pesca de arrasto a menos de cinco quilômetros da origem do vazamento. Duas semanas antes, ele já havia visto algo semelhante. Ao levantar a rede, o óleo prateado escorria de sua captura.

“Apenas agora começaremos a observar os danos desse desastre ambiental”, diz ele, enquanto analisa com sua lupa digital outras amostras de zooplâncton coletadas nos rios afetados. Rebolledo, de origem chilena, foi um dos primeiros a chegar ao “epicentro” em março para estudar os impactos do vazamento de mais de 25.117 barris de petróleo que se espalharam por 82 quilômetros, desde o quilômetro 438 do Sistema de Oleoduto Transequatoriano (SOTE) até a foz do Rio Esmeraldas.

Desde então, ele tem monitorado constantemente a saúde dos ecossistemas. Embora não possa revelar os resultados, adianta que a comunidade planctônica é uma das mais afetadas. Em algumas áreas, há escassez, enquanto em outras, os espécimes estão mortos ou em decomposição. “Uma queda no zooplâncton, que está terrivelmente reduzido e escasso, implica uma queda na produtividade em geral”, destaca Rebolledo, que se estabeleceu no Equador em 2006 para estudar as ameaças aos ecossistemas marinhos. As observações do plâncton estão relacionadas a outro de seus resultados: uma redução de 75% a 90% na pesca.

Além dos dados e observações científicas, os impactos são evidentes nas margens negras dos rios, nas pequenas manchas que se deslocam pela água quando chove e nos relatos dos habitantes dessa província fronteiriça com a Colômbia. Nessa nova fase do desastre, coletivos e fundações se mobilizaram para continuar ajudando as pessoas e os ecossistemas afetados. Os esforços agora estão concentrados em reparar, remediar e decifrar até onde chegaram os estragos dessa emergência.

Rios mortos e pouca pesca

Os rios Esmeraldas, Achote, Caple e Viche sentiram a chegada do petróleo vazado. Os dois últimos “morreram” após o evento. Rebolledo usa o termo “rios mortos”, embora esclareça que o correto é “azoicos”, uma palavra usada para se referir a corpos d’água desprovidos de formas de vida aquática. Nas primeiras amostras coletadas após o vazamento, apenas peixes muito pequenos foram encontrados. As amostras do rio Esmeraldas “foram patéticas”, lembra. Eles realizaram quatro lançamentos de rede durante duas horas e capturaram apenas cinco peixes. Dois meses depois, as capturas não voltaram ao normal.

“Os efeitos podem durar décadas”, alerta Blanca Ríos, professora de ecologia da Universidade das Américas (UDLA). A pesquisadora ressalta que o petróleo, devido ao seu peso, pode se depositar em áreas remotas do rio e, a cada enchente, ser mobilizado novamente. O petróleo pode conter vários compostos, como hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, que são tóxicos para a saúde. Para evitar que sejam mobilizados no futuro, ela recomenda que as ações se concentrem em identificar as áreas onde esse material se depositou para sua limpeza e extração.

Mas ainda há esperança para os rios mortos. “Não há uma fórmula, mas quando a água começar a se renovar, formas de vida aparecerão. É uma das coisas que precisam ser monitoradas uma ou duas vezes por ano”, diz o biólogo chileno, que recomenda focar na limpeza das margens do local do vazamento até o rio Esmeraldas. Cortar o que foi afetado, remover a terra contaminada e reflorestar com espécies nativas, especialmente ao longo do trajeto do oleoduto. Os monocultivos atualmente presentes na região, explica, enfraquecem a cobertura vegetal, o que, somado a eventos climáticos extremos, pode causar novos problemas com o duto.

Segundo respostas da estatal PetroEcuador a um pedido enviado pela América Futura, a área de restauração ambiental da empresa está realizando um diagnóstico para determinar quanto tempo levará para limpar esses corpos d’água. Eles também estão coletando petróleo manual e mecanicamente, recuperando vegetação e lixo contaminado das margens dos rios afetados e das praias, além de realizar monitoramento biótico e avaliação para o resgate da fauna.

Manchas que não desaparecem

“É preocupante que as pessoas nos digam que o rio ainda não está limpo. Todos repetem isso”, diz Alexandra Almeida, bioquímica e porta-voz da organização Acción Ecológica para questões petrolíferas. Os relatos coletados em um informe da organização um mês após o vazamento em dez pontos afetados coincidiam em afirmar que ainda havia manchas de petróleo na superfície da água e nas margens. Também destacavam que não havia peixes e que ainda eram registrados casos de alergias, coceira na pele e mal-estar geral. A agricultura era outra das principais atividades afetadas. As plantações de banana, cacau e abacate foram danificadas.

“É uma afetação multidimensional. Não é apenas a água”, ressalta Almeida. A especialista está preocupada com a possibilidade de a contaminação entrar na cadeia alimentar, pois pode causar problemas no sistema nervoso central das pessoas ou favorecer a reprodução de células malignas e malformações que se tornarão evidentes no futuro. Por isso, ela explica que é necessário aplicar uma reparação integral, conforme estabelece a Constituição equatoriana.

Outro tema que a preocupa é a contaminação no mar. “A mancha negra não está mais visível porque foi fragmentada em milhões de partículas, mas ainda está lá”, afirma a especialista sobre os métodos de dispersão usados no oceano. Segundo Cristian Mora, superintendente do Terminal Petrolero de Balao (Suinba), foram usados 78 tanques de 55 galões de dispersante biodegradável para evitar que a mancha se espalhasse. O petróleo foi reduzido a pequenas partes “que evaporam com o sol ou são consumidas e dissolvidas pelo plâncton” sem causar impactos negativos, afirma. No entanto, especialistas consideram que a pesca deveria ter sido proibida nessas áreas até que os efeitos do petróleo disperso fossem analisados.

Ainda é necessária ajuda

Diante dos impactos do vazamento, diversos grupos se mobilizaram para coletar amostras, levar doações e apoiar os habitantes afetados. A organização Jóvenes Protectores del Planeta levou água, comida e atendimento médico a mais de 300 pessoas. “Como não há mais divulgação, pensam que tudo acabou, mas há pessoas com doenças de pele”, alerta seu presidente, Jefferson Esmeralda. Os primeiros kits incluíam arroz, atum, alimentos não perecíveis, remédios e produtos de higiene pessoal. Agora, também estão focando em kits menstruais para adolescentes e adultas.

Além dos impactos do vazamento, somaram-se os estragos do terremoto de 6,1 graus que atingiu a província em 25 de abril e das inundações. Aylin Torres, de 22 anos e membro do clube de Biologia da Universidade Estatal Amazônica (UEA), chegou à área afetada logo após o vazamento para coletar amostras e levantar informações socioeconômicas. Sua avaliação revela que a apicultura é uma das principais fontes de renda da região. No entanto, após o vazamento, a maioria das abelhas fugiu devido à contaminação do ar, e outras morreram. Por isso, os jovens estão elaborando planos para ajudar as comunidades a retomar essa atividade e buscar outras fontes de renda. Por enquanto, criaram um sistema para que os habitantes da região transplantem os produtos que cultivavam às margens do rio para locais mais seguros.

Enquanto isso, Rebolledo espera que as chuvas também ajudem a limpar o leito do rio, mas insiste que é necessário tomar medidas urgentes de reparação e remediação se quisermos que os rios mortos voltem a ter vida.

Fonte: https://elpais.com/america-futura/2025-05-13/la-emergencia-por-el-derrame-de-petroleo-en-ecuador-no-ha-terminado-dos-meses-despues.html

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

Eu afogo as distâncias
constantes abismos
montanha ou labirintos.

Anfrangil

[França] Vida e morte de um anarquista russo comprometido com a Ucrânia: seu pai conta sua história

Sexta-feira, 30 de maio | 19h | La Dar CSA | Apresentação de livro e cantina vegan de apoio

O Coletivo Feminista em Apoio à Resistência Ucraniana tem o prazer de convidá-lo para um encontro especial com Dmitry Pavlovitch PETROV – escritor e pesquisador – que apresentará sua obra autobiográfica: Dia dos Pais.

Nesse livro, o autor relembra o desaparecimento de seu filho – um voluntário anarquista nascido na Rússia e comprometido com a Ucrânia, chamado de Dmitry Petrov e também conhecido como Ilya Leshy- e explora os temas da guerra, da família e de um amor que se recusa a desaparecer.

Por meio de diálogos, lembranças e reflexões, Petrov pinta um retrato pungente de uma cidade destruída e de um pai que tenta manter o vínculo com seu filho em meio ao caos. Ele questiona o dever, a responsabilidade pessoal, a dor e o poder da memória, ao mesmo tempo em que captura a rotina brutal da guerra e o poder da convicção.

Site em memória de Dmitri Petrov (filho): https://leshy.info/en/

Última mensagem deixada por Dmitri Petrov.

“Meu nome é Dmitry Petrov e, se você está lendo estas linhas, provavelmente morri lutando contra a invasão de Putin na Ucrânia.
 
Sou membro da Organização de Combate dos Anarco-Comunistas (BOAK) e continuarei assim após minha morte. O BOAK é uma criação nossa, nascida de nossa crença em uma luta organizada. Conseguimos carregá-lo em diferentes lados das fronteiras do estado.
 
Dei o meu melhor para contribuir para a vitória sobre a ditadura e para aproximar a revolução social. E estou orgulhoso de meus camaradas que lutaram e lutam na Rússia e além.
 
Como anarquista, revolucionário e russo, achei necessário participar da resistência armada do povo ucraniano contra os ocupantes de Putin. Fiz isso pela justiça, pela defesa da sociedade ucraniana e pela libertação do meu país, a Rússia, da opressão. Pelo bem de todas as pessoas que são privadas de sua dignidade e da oportunidade de respirar livremente pelo vil sistema totalitário criado na Rússia e na Bielorrússia.
 
Outro sentido importante para participar desta guerra é aprovar o internacionalismo pelo exemplo. Nos dias em que o imperialismo mortal desperta, como resposta, uma onda de nacionalismo e desprezo pelos russos, defendo por palavras e atos: não existem “povos maus”. Todos os povos têm a mesma dor – governantes gananciosos e sedentos de poder.
 
Não foi apenas minha decisão e passo individual. Foi uma continuação de nossa estratégia coletiva voltada para a criação de estruturas sustentáveis e combate de guerrilha no confronto com os regimes tirânicos de nossa região.
 
Meus queridos amigos, camaradas e parentes, peço desculpas a todos aqueles que magoei com minha partida. Eu aprecio muito o seu calor. No entanto, acredito firmemente que a luta pela justiça, contra a opressão e a injustiça é um dos significados mais valiosos com que o ser humano pode preencher sua vida. E esta luta requer sacrifícios, até o completo auto-sacrifício.
 
O melhor memorial para mim é se você continuar lutando ativamente, superando ambições pessoais e conflitos prejudiciais desnecessários. Se continuar a lutar ativamente para alcançar uma sociedade livre, baseada na igualdade e na solidariedade. Para você e para mim e para todos os nossos companheiros. Risco, privação e sacrifício neste caminho são nossos companheiros constantes. Mas tenha certeza – eles não são em vão.
 
Eu abraço todos vocês.
 
Seu Ilya Leshy, “Seva”, “Lev”, Fil Kuznetsov,
 
Dmitry Petrov”

Fonte: https://mars-infos.org/vie-et-mort-d-un-anarchiste-russe-8022

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agência de notícias anarquistas-ana

grama nos trilhos
composições mudas
sem estribilhos

Carlos Seabra

Registro do ato contra a resolução nº2.427/2025 do CFM no Rio de Janeiro

No dia 24/04/2025, ocorreram atos em vários territórios no brasil pela revogação da resolução nº 2.427/2025 do conselho federal de medicina, que determina impedimentos ao atendimento médico oferecido a pessoas trans. os atos ocorreram em espaços públicos, na maioria em frente às subsedes dos conselhos regionais de medicina.

Essa resolução:

1. Proíbe a administração de bloqueadores hormonais e realização de hormonização cruzada para pessoas trans menores de 18 anos;

2. Obriga pessoas trans adultas a se submeterem a 1 ano de acompanhamento psiquiátrico para poderem iniciar terapia hormonal.

3. Proíbe que pessoas trans com menos de 21 anos realizem cirurgias de afirmação de gênero.

Nossa autodeterminação não é negociável! Por saúde trans autônoma!

transanarquismo.noblogs.org

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No outono as folhas
Caem e o caminho
Tapete se transforma

Dalva Sanae Baba

[Espanha] Consuelo Zabalza, a desconhecida vida de uma importante ateneísta durante a guerra entre Lavapiés e a Ventilla

Foi uma das figuras mais importante do ateneismo libertário durante a guerra. A publicação recente de dois trabalhos recupera parte de seu vestígio junto com o de outros militantes anônimos de vida incrível que também precisam de uma urgente valorização histórica

Por Luis de la Cruz | Madrid — 6 de abril de 2025

A história deste país é tecida por uma lista infindável de biografias notáveis que quase ninguém conhece. Avôs e avós que nos deixaram sem receber suas merecidas homenagens nem, o que é pior, a escuta atenta que a sociedade necessitava. É o caso de Consuelo Zabalza Martínez (1920-2004), uma mulher que, sendo quase uma menina, foi pioneira no campo político e da cultura obreira.

Em 2024 saíram dois livros que, ao menos parcialmente, recuperam os vestígios de Consuelo Zabalza. Sua figura está presente em “La voz de los vencidos: doce entrevistas con anarquistas que vivieron la Guerra Civil en Espanha”, de Lily Litvak, e “Los ateneos libertários de Madrid. Desde sus orígenes hasta 1939″, de Francisco Javier Antón Burgos.

No primeiro capítulo da monografia de Litvak acessamos as vivências de Zabalza através de suas próprias palavras e as de seu parceiro, o destacado militante da CNT Ángel Urzaiz. Consuelo nasceu na Rua Tribulete em 1920 em uma família humilde. Seu pai, Francisco Zabalza, trabalhava no Mercado Central de Frutas e Verduras, um dos principais centros laborais do sul de Madrid, onde era conhecido por suas veleidades sindicalistas. Foi comunista – durante a ditadura de Primo de Rivera foi encarcerado por sua militância–, ainda que logo ingressasse no Sindicato Único da construção da CNT.

Consuelo foi pega pelo golpe de Estado franquista com apenas dezesseis anos e foi para a rua e para a cena política obreira. Devia viver na ocasião no norte de Madrid, pois contava que se alistou nas Juventudes Libertárias de Chamartín de la Rosa (chegou a ser sua secretária geral) e ingressou no Ateneu Libertário de la Ventilla, onde também foi secretária.

“Procurando uma figura ateneísta feminina notável, essa seria a da reconhecida anarquista Consuelo Zabala Martínez”, explica Antón Burgos em seu estudo sobre os ateneus madrilenhos, onde detalha como Zabalza se empenhou em conseguir da municipalidade um local amplo para as escolas do ateneu da Rua Cedros, que então se chamava de Fermín Galán.

O autor faz referência a outras mulheres destacadas no trabalho ateísta durante os anos trinta em toda a geografia madrilenha, todas trabalhadoras. Algumas delas ocuparam também cargos, como Cristina Martín, que foi secretária do vizinho Ateneu Libertário do bairro de La Viña.

Ao terminar a guerra, se viu junto com outros jovens em uma delegacia da Rua Jorge Juan. Ali, a desnudaram, a raparam e golpearam. Os policiais diziam “estas mulheres livres são umas zorras”, recordava na entrevista de Litvak.

Foi julgada por Auxilio à rebelião por sua militância e por haver falado em três ocasiões na seção semanal reservada aos ateneus na Rádio Madrid. Se viu com o juiz militar quase ao mesmo tempo em que as famosas Treze Rosas e, sendo menor de idade, esteve seis meses na prisão das Ventas.

Estando presa, uma companheira lhe sugeriu que começasse a escrever para um companheiro que estava cumprindo pena de prisão nesse momento, Ángel Urzaiz Simón, militante de Guindalera e Prosperidad, a quem nesse momento ainda não tinham comutado a pena de morte à qual havia sido condenado.

Quando sai do cárcere, Zabaleta continua colaborando com a organização na clandestinidade, ajudando os presos políticos. Reúne-se com Ángel, que será seu companheiro de toda a vida e com quem teve dois filhos. Ele será detido de novo em 1947 (permanecerá confinado até 1959) e transladado a um cárcere valenciano, o que fará com que se translade para viver ali, onde trabalha em um restaurante enquanto continua com seus trabalhos políticos. Em sua casa, por exemplo, se refugiou o anarquista Cipriano Mera a caminho do exílio francês.

Depois da morte de Franco, o casal contribuiu para a reconstrução de sua organização e participou do encontro intergeracional que permitiu romper a censura histórica provocada pelo sinistro poço do franquismo. Em 1996, fez o prólogo do livro “La mujer en la prensa anarquista.” Espanha (1900-1939), de María A. García-Maroto. Ángel Urzaiz havia falecido em 1988 e ela nos deixou em 2004 na cidade de Madrid. Consuelo Zabalza merece um trabalho monográfico que ponha seu nome no lugar que merece. Muitas, muitos, também esperam o resgate de sua memória e os ensinamentos que, sem fazer-se notar demasiado, nos deixaram de herança.

Fonte: https://www.eldiario.es/madrid/somos/tetuan/consuelo-zabalza-desconocida-vida-importante-ateneista-durante-guerra-lavapies-ventilla_1_12164507.html

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

Na carroceria
sobre as sacas de algodão
cochila o carona.

Alberto Murata

[Nova Zelândia] Capitalismo pintado de verde: os limites do orçamento de 2025 do partido verde

O Partido Verde de Aotearoa (Nova Zelândia) lançou recentemente seu orçamento alternativo para 2025, um documento saudado por muitos setores da esquerda liberal como ousado, transformador e progressista. Com propostas que incluem imposto sobre grandes fortunas, imposto sobre heranças, faixas de isenção fiscal para rendas mais baixas e investimentos significativos em saúde, educação e infraestrutura climática, os Verdes se posicionam como o partido da redistribuição, sustentabilidade e bem-estar social.

Mas, para os anarcocomunistas, que não buscam reformar o capitalismo, mas aboli-lo, o orçamento verde levanta questões fundamentais sobre os limites da política parlamentar, a persistência da lógica capitalista sob um verniz ecológico e a contínua domesticação do potencial político radical pelos partidos eleitorais.

1. Tributar os ricos… para salvar o sistema?

No centro do orçamento verde está um novo conjunto de tributos sobre os ricos: um imposto anual de 2,5% sobre ativos líquidos superiores a NZ$ 2 milhões (ou $4 milhões para casais), um imposto de 33% sobre heranças e doações acima de NZ$ 1 milhão ao longo da vida, e o aumento das alíquotas do imposto de renda e de empresas. O objetivo? Arrecadar NZ$ 88,8 bilhões em quatro anos para financiar uma ampla expansão do estado de bem-estar social.

Na superfície, essas são políticas populares. A ideia de que os ultrarricos devem pagar mais em um país onde a desigualdade disparou é atraente, especialmente diante do aumento da pobreza, da crise habitacional e do colapso dos serviços públicos. Mas o problema mais profundo é que esses impostos ainda operam dentro de um sistema em que a propriedade privada é sagrada, o trabalho assalariado é a norma, e a riqueza continua sendo a medida do valor humano.

Devemos perguntar: o que significa tributar a riqueza sem tocar na estrutura de classes que a gera? Um imposto de 2,5% pode redistribuir uma pequena fração do que foi expropriado dos trabalhadores, mas não questiona a legitimidade da acumulação de riqueza em si. Tampouco desafia o papel do Estado capitalista na proteção dos interesses materiais do capital. Na melhor das hipóteses, é uma política de redistribuição sem expropriação, reforma sem ruptura.

O orçamento verde também evita confrontar o papel dos proprietários de imóveis, especuladores e bancos na extração cotidiana de valor das pessoas que trabalham. Esses setores, centrais na economia financeirizada da Nova Zelândia, permanecem amplamente intocados. Na verdade, ao depender do crescimento econômico contínuo para financiar os gastos sociais, os Verdes reafirmam a contradição central do capitalismo: a necessidade de acumulação infinita em um planeta finito.

2. Médicos e creches gratuitos: bem-estar ou pacificação?

Não há dúvida de que os investimentos do orçamento em saúde, educação e segurança social melhorariam materialmente a vida das pessoas. Consultas médicas gratuitas, retorno da gratuidade dos medicamentos, 20 horas de educação infantil a partir dos seis meses de idade e uma garantia de renda de NZ$ 395 por semana para pessoas fora do trabalho ou estudo são avanços reais em direção a uma sociedade mais habitável e humana.

Mas essas reformas não são revolucionárias, são o mínimo que uma colônia de povoamento rica como Aotearoa deveria oferecer. Na verdade, muitas dessas propostas buscam apenas restaurar as proteções sociais-democratas desmanteladas nos últimos 40 anos de neoliberalismo. Seu retorno é bem-vindo, mas tratá-las como “ousadas” ou “transformadoras” reforça o padrão extremamente baixo das expectativas políticas contemporâneas.

Anarquistas devem permanecer críticos quanto ao modo como os estados de bem-estar sempre funcionaram, não apenas para aliviar a pobreza, mas para regulá-la. O bem-estar social muitas vezes serviu como ferramenta de disciplina dos pobres, de apaziguamento do dissenso e de reprodução da força de trabalho. No capitalismo, os serviços sociais não são direitos universais, mas privilégios condicionais atrelados à vigilância estatal, à elegibilidade burocrática e a métricas de produtividade. A menos que sejam radicalmente democratizados e desmercantilizados, as expansões do bem-estar prometidas no Orçamento Verde correm o risco de se tornarem mecanismos de pacificação, e não de libertação.

3. Capitalismo climático e a ilusão do crescimento verde

A agenda ambiental dos Verdes inclui reinvestimento em trens regionais, metrôs leves nas grandes cidades, restauração do programa “Trabalhos pela Natureza” e modificação do Esquema de Comércio de Emissões (ETS) para excluir o reflorestamento e incluir a agropecuária. Essas políticas refletem um desejo sincero de enfrentar a crise climática, mas permanecem amarradas à ideologia do capitalismo verde.

Em nenhum momento o Orçamento Verde questiona a causa estrutural da catástrofe climática: a exigência capitalista por crescimento infinito e maximização do lucro. Ao enquadrar as soluções climáticas em termos de mecanismos de mercado, incentivos ao investimento e expansão da infraestrutura, os Verdes reforçam uma lógica que trata a Terra não como um bem comum a ser cuidado coletivamente, mas como um recurso a ser gerenciado para garantir estabilidade econômica de longo prazo.

Do ponto de vista anarcocomunista, a crise ecológica não é uma falha de políticas públicas, mas uma inevitabilidade estrutural da produção capitalista. A verdadeira justiça climática exige não ajustes tecnocráticos ou investimentos eco-keynesianos, mas a abolição do capitalismo fóssil, o fim da propriedade privada e a restauração da autonomia coletiva sobre a terra, a água e os sistemas alimentares.

4. Eleitoralismo e a política de contenção

O orçamento de 2025 dos Verdes deve ser entendido não apenas como plano fiscal, mas como performance política. Serve para posicionar os Verdes como a consciência moral do Parlamento, mais compassivos que o Labour, mais competentes que o Te Pāti Māori, e mais visionários que a coalizão reacionária entre National, ACT e NZ First. Mas esse papel não ameaça o sistema; ele é seu flanco esquerdo.

Anarquistas há muito criticam a armadilha do eleitoralismo: a ideia de que mudanças significativas podem ser alcançadas por meio da participação na democracia parlamentar burguesa. A história da social-democracia ao redor do mundo mostra como a energia radical frequentemente é capturada, neutralizada e institucionalizada por partidos que prometem transformação, mas entregam apenas gestão.

O orçamento verde é um exemplo clássico. Ao se apresentar como uma alternativa “realista” e “totalmente calculada”, os Verdes tranquilizam o capital de que são administradores responsáveis do sistema. Propõem ajustes, não rupturas; equidade, não liberdade. E, embora suas políticas sejam frequentemente atacadas pela direita como “marxistas” ou “radicais”, não são nada disso. Nenhuma fábrica será coletivizada. Nenhuma terra será devolvida. Nenhum patrão será expropriado. A ordem social permanece intacta.

5. O que seria uma transformação real?

Se o orçamento verde representa o teto do que a política parlamentar pode oferecer, os anarcocomunistas devem olhar para o horizonte. Como seria uma reorganização verdadeiramente radical da sociedade em Aotearoa?

– Abolir o capitalismo: Acabar com o sistema de trabalho assalariado, desmontar o controle corporativo e coletivizar os meios de produção sob controle democrático dos trabalhadores.

– Descolonizar agora: Devolver as terras ao tangata whenua, honrar o tino rangatiratanga e desmontar as estruturas do colonialismo de povoamento incrustadas no Estado, no sistema jurídico e na economia.

– Destruir o estado: Substituir as burocracias centralizadas por assembleias descentralizadas, federadas e diretamente democráticas enraizadas nas comunidades, locais de trabalho e marae.

– Cuidado como comum: Desmercantilizar saúde, educação e moradia, não como serviços estatais, mas como bens comuns geridos coletivamente por quem os utiliza.

– Reparação ecológica: Acabar com a extração de combustíveis fósseis, a monocultura industrial e a dependência de automóveis. Reflorestar terras, apoiar os saberes ecológicos indígenas e construir comunidades resilientes, de baixo carbono, baseadas em cuidado, reciprocidade e suficiência.

Esses não são pontos de orçamento ou propostas de política pública. São transformações revolucionárias que só podem ser conquistadas por meio de ação coletiva de massa, democracia direta e desmantelamento do estado e do capital.

Conclusão: O orçamento não é o suficiente

O orçamento de 2025 do Partido Verde espelha as contradições do nosso tempo. Oferece melhorias reais para quem sofre sob o regime atual e identifica corretamente a obscena concentração de riqueza em Aotearoa. Mas não pode, e não pretende, desafiar os fundamentos desse regime. É um programa para gerir a desigualdade, não para aboli-la; para pintar o capitalismo de verde, não para encerrá-lo.

Anarcocomunistas devem resistir à tentação de ver esse orçamento como um trampolim rumo à revolução. A história nos ensina que a reforma não é uma escada para a libertação, mas um beco sem saída que drena energia e neutraliza a dissidência. A tarefa diante de nós não é votar melhor ou fazer lobby com mais afinco: é construir poder popular, organizar-se nos locais de trabalho e nas comunidades, e desmantelar os sistemas de dominação que nenhum orçamento será capaz de consertar.

O futuro de que precisamos não pode ser orçado. Ele deve ser conquistado.

Fonte: https://awsm4u.noblogs.org/post/2025/05/15/greenwashed-capitalism-the-limits-of-the-green-partys-2025-budget/ 

Tradução > Contrafatual

agência de notícias anarquistas-ana

As cores da noite
recamadas de silêncio
preparam o dia.

 Eolo Yberê Libera

[Itália] Turim: ato antifascista em resposta às cruzes célticas na lápide de Ilio Baroni

No domingo, 25 de maio, foi realizado em Turim um ato em frente à lápide do partigiano anarquista Ilio Baroni, localizada na esquina entre o corso Giulio Cesare e o corso Novara. A lápide havia sido recentemente vandalizada com símbolos de cruzes célticas.

“Na tarde de hoje, voltamos em frente à lápide do partigiano anarquista Ilio Baroni para dar uma resposta clara e inequívoca contra mais uma provocação fascista que atingiu o bairro”, escreveram nas redes sociais a Federação Anarquista de Turim e a Assembleia Antimilitarista de Turim. Durante o ato, ocorreram falas que relembraram a história da Barriera di Milano (bairro popular) como bastião antifascista e de resistência, entrelaçando a memória histórica com as múltiplas lutas atuais nas quais os antifascistas seguem engajados. Foram colocadas flores em homenagem ao companheiro caído. Os símbolos fascistas deram lugar a uma bandeira estilizada: a da anarquia, pela qual Ilio lutou até seu último dia de vida.

COMUNICADO

Um mês após a grande participação na comemoração de 25 de abril, fascistas desconhecidos insultaram a memória da Resistência ao profanar com seus símbolos de morte a lápide do partigiano anarquista Ilio Baroni.

Os representantes da extrema-direita xenófoba e racista são o braço armado dos patrões — seus fiéis servos, sua mão de obra favorita.

Os autores dessa vil provocação são os mesmos que, dia após dia, incitam a guerra entre pobres italianos e pobres imigrantes. Tentam nos colocar uns contra os outros porque sabem que, divididos, somos mais fracos e exploráveis. Acenam para as políticas repressivas do governo Meloni — herdeiros diretos da ditadura fascista — que aprova leis especiais como o mais recente decreto de segurança, promovendo uma virada cada vez mais autoritária e inimiga das liberdades no país. Aplaudem a militarização crescente dos territórios, as batidas policiais e os controles étnicos contra pessoas sem documentos, as reclusões nos CPR (Centros de Permanência para Repatriação), as deportações forçadas e as milhares de mortes no Mar Mediterrâneo.

Estão nos empurrando diretamente para a guerra, apoiando a corrida armamentista e agitando o tricolor [bandeira] que pode se tornar nossa ruína e nossa tumba.

Mas o povo da Barriera di Milano, nascidos aqui ou em qualquer outro lugar, vive os mesmos problemas, a mesma condição de exploração e opressão, a mesma de quem pegou em armas para combater o fascismo porque queria uma sociedade sem Estado e sem patrões.

A Barriera sofre com o aumento dos aluguéis e das contas. Sofre com empregos precários e perigosos, salários miseráveis e ritmos de trabalho insustentáveis. Sofre com ameaças constantes de despejo. Sofre com os cortes e as privatizações nos serviços sociais essenciais (saúde, educação, transporte, etc.). Não há dinheiro para moradia, educação, prevenção ou cuidado. Mas sobra dinheiro para patrulhas de polícia e militares nas ruas das periferias.

Hoje como ontem, só um amplo front de luta contra o inimigo comum pode nos levar a um mundo de liberdade e igualdade.

Um punhado de fanáticos pode até sujar um pedaço da história da luta de libertação do nazifascismo, mas não pode apagá-la. A história de Ilio, a história dos Arditi del Popolo, a história dos revolucionários da Barriera ainda ressoa nas lutas de cada um de nós — e continuará ressoando por muito tempo!

Por isso, queremos ir às ruas — e queremos ir em muitos. Queremos nos encontrar e nos reconhecer mutuamente, expressar toda a nossa raiva contra mais esse ataque ao coração do bairro, contra quem o vive e o atravessa todos os dias.

Queremos restaurar a lápide e manter viva a memória, fazendo dela uma arma para transformar radicalmente o que existe.

 “Os únicos estrangeiros são os fascistas nos bairros!”

Federação Anarquista de Turim
Assembleia Antimilitarista – Turim

Fonte: Radio Onda d’Urto

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

olhos cheios de sol
tarde por um triz
por hoje estou feliz

Camila Jabur

[Espanha] Iniciativa Pela Liberdade De Antonio Arevalillo Sanz

Antonio Arevalillo Sanz (Segóvia, 1958) desde os 9 anos cresceu no bairro bilbaíno de Zorroza e nos anos 70, como outros muitos jovens de origem humilde, se dedicou ao assalto de bancos, joalherias e supermercados. Desde sua primeira detenção grave, no ano de 1974, foi detido dezenas de vezes, fugiu três ou quatro vezes, participou na luta da COPEL (Coordenação de presos em luta) e no ano de 1983 foi um dos protagonistas de uma revolta na prisão de Basauri. No total permaneceu preso mais de 42 anos, 15 deles em regime de isolamento (Regime Especial FIES e art.10).

Faz uns anos lhe detectaram um tumor nasal que requereu cinco complexas operações cirúrgicas. No ano de 2016 Antonio completou as ¾ partes de sua condenação pelo que cumpre as condições para acessar a liberdade condicional.

Amigos próximos de Antonio, junto à associação basca GGEBE-ADDSI (Associação para a Defesa dos Direitos Sociais e Individuais), iniciamos uma campanha para exigir a liberdade imediata de Antonio.

Para apoiar as gestões que estamos realizando pedimos que enviem cartas e e-mails ao Tribunal Central de Vigilância Penitenciária, o JVP nº5 de Madrid (responsável de Estremera), a SGIP e a Junta de Tratamento do cárcere de Estremera. (Anexamos modelos de escritos com os endereços aos quais enviar).

Os agradeceríamos informação sobre as iniciativas solidárias assim como o apoio público a esta iniciativa. Também os animamos a enviar cartas, postais, telegramas, etc ao próprio Antonio:

Antonio Arevalilo Sanz

Centro Penitenciario Madrid VII

Ctra M-241, km 5.750

28595 Estremera (Madrid)

GGEBE-ADDSI  (ggebe-addsi@protonmail.com)

Gizabanakoen eta Gizarte Eskubideen Babeserako Elkartea/Asociación para

la Defensa de los Derechos Sociales e Individuales

Modelo de escrito e endereços para enviá-lo: http://tokata.info/wp-content/uploads/2025/05/MODELO-ESCRITO-ANTONIO-AREVALILLO.odt

Fonte: https://tokata.info/iniciativa-por-la-libertad-de-antonio-arevalillo-sanz/?

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

O velho salgueiro
Inclinado sobre o lago
Resmunga baixinho.

Mary Leiko Fukai Terada

Livro disponível para venda: “Arte e militância de Pedro Catallo”

Está disponível para aquisição na sede do Centro de Cultura Social (CCS) o livro “Arte e militância de Pedro Catallo, Volume 1 “Politica”. Em breve será feito o lançamento. No 2º semestre será publicado o Volume 2 sobre “Arte e cultura”. Essa nova publicação é parte do esforço para resgatar a história de militantes do CCS e do movimento anarquista, bem como contribuir financeiramente para a manutenção do espaço e suas atividades. Em breve estará disponível pelo site da livraria.

“(…) Não compreendemos porque os modernos escribas que se abalançam a escrever as “histórias sociais do Brasil” possam omitir, de caso pensado, páginas imorredouras e brilhantes com a essas que pertencem ao proletariado paulista, de muito antes de aparecer no Brasil o sindicalismo amarelo do Ministério do Trabalho. Um dia, a verdadeira história do movimento social do Brasil aparecerá na plenitude límpida, clara e verdadeira.”  Pedro Catallo

[…]Anarquista, poeta e sapateiro nascido em 1901, teve seu primeiro contato com o anarquismo em 1921 quando ingressou na União dos Artífices em Calçados e Classes Anexas de São Paulo. Participou ativamente de diversas greves, da campanha pró-Sacco e Vanzetti e das agitações antifascistas. Em 1928, com outros companheiros sapateiros, fundou o Grupo Teatral da União dos Artífices em Calçados e encenou diversas peças libertárias. Escreveu, traduziu e dirigiu diversas peças teatrais, ganhando até prêmios como o do Festival de Teatro promovido pela Federação Paulista de Teatro Amador. Fundou os jornais O Libertário e Dealbar. Morreu em 1969, deixando uma extensa obra teatral. Catallo também escreveu diversos hinos e canções, assim como produziu versões em português de músicas estrangeiras, sempre pregando o ideal anarquista e denunciando os males sociais que afligiam os trabalhadores.

A vida e a importância da obra desse incansável militante anarquista ainda estão por serem escritas, e com elas, sem dúvida, surgirá boa parte da história do teatro e da música anarquista no Brasil[…] Rodrigo Rosa da Silva

“Novas e velhas vozes libertárias: apontamentos sobre a história da música anarquista no Brasil”. História Social. Campinas-SP, n.11 173-192, 2005

Centro de Cultura Social (CCS)

Rua General Jardim, 253 Sala 22 – Vila Buarque – São Paulo – SP – Próximo ao metrô Republica

Site: https://ccssp.com.br/portal/

E-mail: ccssp@ccssp.com.br   

agência de notícias anarquistas-ana

quantos pirilampos
posso contar esta noite?
caminho enluarado

José Marins

[França] Congresso da Confederação Camponesa: Consolidar bases e questionar limites

De 15 a 17 de abril de 2025, a cidade de Langres, em Haute-Marne, sediou o 28º congresso da Confederação Camponesa. Realizado poucos meses após as eleições para as Câmaras de Agricultura em janeiro de 2025, o congresso ocorreu em um momento de grandes reajustes sindicais, marcado por uma abstenção recorde e pelo avanço da Coordination Rurale (CR) frente ao bloco majoritário formado pela Federação Nacional dos Sindicatos de Agricultores (FNSEA) e Jovens Agricultores (JA).

Em janeiro de 2025, cerca de 400 mil chefes de exploração agrícola ativos, que compõem o primeiro de cinco colégios eleitorais, foram convocados para eleger seus representantes nas Câmaras de Agricultura departamentais [1]. Essas instâncias estratégicas são ao mesmo tempo órgãos de representação profissional e instrumentos de implementação de políticas agrícolas. As eleições ocorreram em um contexto explosivo: manifestações camponesas em 2024, assinatura do acordo de livre-comércio com o Mercosul, crise do modelo produtivista dominante em meio a desastres ambientais, entre outros fatores que acirraram a polarização entre os sindicatos, oscilando entre o conservadorismo e a vontade de transformação profunda.

Eleições sob pressão

Após as eleições, o bloco FNSEA/JA sofreu um retrocesso histórico, perdendo a maioria em 22 departamentos. Esse resultado questiona diretamente o modelo de cogestão agrícola herdado do pós-guerra, no qual a FNSEA se consolidou como intermediária das políticas públicas e parceira privilegiada do Estado. Essa crise afeta também os interesses consolidados do complexo agroindustrial, liderado por Arnaud Rousseau, presidente da FNSEA e dirigente do grupo Avril. Embora sua dominação comece a ser abalada, seus interesses continuarão a ser defendidos enquanto os mecanismos institucionais permanecerem inalterados.

O resultado mais surpreendente foi o avanço fulminante da CR, que passou de 3 para 14 departamentos em uma única eleição. Fruto de uma cisão com a FNSEA em 1991, esse sindicato se posiciona como oposição de fachada, criticando o sistema vigente enquanto reproduz grande parte de sua lógica. Não oferece ruptura real nem alternativas concretas, e suas ligações comprovadas com a Reunião Nacional o tornam um alvo a ser combatido [2]. A CR se estabeleceu em departamentos do Oeste, onde a agricultura enfrenta crises sucessivas: problemas sanitários na pecuária, substituição da pecuária por monoculturas de cereais em solos pouco produtivos e início de uma crise vitivinícola.

Nesse cenário polarizado, a Confederação Camponesa manteve sua base, com 20,49% dos votos válidos, e conquistou a presidência em quatro Câmaras: Ardèche, Guiana, Córsega e Mayotte (onde as eleições foram adiadas devido ao ciclone Chido). Pela primeira vez, a Conf’ obteve maioria em tantos departamentos. Apesar do resultado positivo diante das adversidades, o sindicato precisa enfrentar questões essenciais para se consolidar como a única alternativa real à FNSEA.

Por um sindicalismo transformador

Transformar a agricultura camponesa em um projeto unificador tornou-se mais complexo em um contexto de lutas de classes no campo cada vez mais intensas. É preciso abandonar a ideia — ainda difundida pela mídia e pelo sindicato majoritário — de uma classe camponesa homogênea e naturalmente solidária. Essa visão ignora a diversidade de práticas, situações sociais e trajetórias profissionais: um jovem que cultiva hortaliças orgânicas em menos de um hectare de terra alugada não vive a mesma realidade que um latifundiário com centenas de hectares e empregados. Acesso à terra, tributação, autonomia, renda, relação com o meio ambiente e com o coletivo — quase tudo os separa. Falar em nome de realidades tão distintas é uma simplificação política, quando não uma fraude.

Para fortalecer sua atuação, a Conf’ apresentou propostas estruturantes, como a criação de uma escola política camponesa popular. Concebida como ferramenta de emancipação, a escola usará métodos de educação popular para formar militantes, politizar debates no campo e difundir os princípios da agricultura camponesa além do círculo sindical. Trata-se de um projeto de autonomização política, que visa capacitar camponeses e camponesas a refletir sobre sua condição e construir alternativas.

Outro destaque foi a moção de solidariedade com as agriculturas dos territórios ultramarinos, denunciando a lógica neocolonial de exploração que ainda as marca. Terras ultramarinas são frequentemente tratadas como meros reservatórios para exportação, ignorando necessidades locais. A moção alerta para a apropriação de terras e o extrativismo agrícola, reforçando a solidariedade sindical com esses camponeses. Na área ecológica, o congresso aprovou por unanimidade uma moção contra a linha de alta velocidade Lyon-Turin, um projeto “inútil, imposto e destrutivo”, símbolo da fuga tecnocrática para frente.

Lugar às camponesas!

Um dos avanços mais significativos do congresso foi a moção proposta pela comissão de Mulheres da Conf’, apoiada por várias seções departamentais. Embora as mulheres representem um terço da força de trabalho agrícola, sua presença em instâncias sindicais e decisórias ainda é marginal. A moção aprovada prevê um plano de combate às violências sexistas e sexuais (VSS): formações sistemáticas para mandatárias, protocolo claro para lidar com casos de VSS, orçamento dedicado à prevenção e criação de uma rede de apoio. O apoio à comissão de Mulheres reflete uma conscientização coletiva e o compromisso do sindicato com a igualdade real, tanto internamente quanto em suas reivindicações.

Uma data de homenagem

O encerramento do congresso em 17 de abril não foi por acaso. A data marca o Dia Internacional das Lutas Camponesas, em memória do massacre de 19 sem-terra no Brasil em 1996. A Conf’ também reafirmou sua solidariedade com o povo palestino, especialmente seus camponeses, último bastião contra a fome sistêmica imposta pelo Estado genocida israelense.

O dia 17 foi ainda um momento de memória e emoção, um mês após o assassinato de Pierre Alessandri, camponês e secretário-geral da Via Campagnola, sindicato corso aliado da Conf’. Laurence Marandola, porta-voz nacional, prestou uma homenagem emocionada a esse militante incansável, defensor da agricultura camponesa, da terra e da dignidade dos povos. Ela denunciou o silêncio cúmplice de políticos e representantes do Estado e reafirmou que a Conf’ permanecerá vigilante ao lado da Via Campagnola até que a justiça seja feita [3].

Por um campo vivo

Diante de megaprojetos inúteis, desmonte social, grilagem de terras e avanço fascista, é preciso estar ao lado de quem trabalha a terra para alimentar a população com dignidade. A UCL, como todo nosso campo social, tem a responsabilidade de apoiar firmemente os camponeses em luta, seja nas manifestações ou nas campanhas. Porque o que está em jogo é nosso futuro comum: um campo vivo, uma relação emancipada com a terra e um mundo livre da exploração.

Lysandre (UCL Vosges)

Notas:

[1] Les résultats des élections 2025 aux Chambres d’agriculture par département et par collège sont consultables sur Chambres-agriculture.fr.

[2] «La Coordination rurale, un syndicat à l’extrême droite du monde agricole», 4 février 2025, Street press.

[3] «Assassinat de Pierre Alessandri: La violence au service de l’agro-industrie», Alternative libertaire n° 359, avril 2025.

Fonte: https://unioncommunistelibertaire.org/?Congres-de-la-Confederation-paysanne-Consolider-ses-bases-interroger-ses

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

pássaro pousado
no espantalho
aposentado

Millôr Fernandes

[Itália] Nápoles rejeita a guerra e o rearmamento: NÃO ao encontro da OTAN de 26 de maio

No dia 26 de maio será realizado em Nápoles um encontro da OTAN sobre o tema da “Segurança no Mediterrâneo”. Em resposta, os movimentos sociais da cidade convocaram um contra-encontro para reafirmar a rejeição à guerra, a oposição ao rearmamento e ao genocídio na Palestina.

A seguir, republicamos o texto do chamado divulgado pelo Laboratorio Politico Iskra, que destaca os temas da mobilização:

A convocação de um encontro “pela segurança do Mediterrâneo”, com a participação de delegações de países como Líbia e Israel, é simplesmente um oxímoro. Perguntamo-nos: que tipo de segurança os massacres de Israel em Gaza e na Cisjordânia garantem aos cidadãos do Mediterrâneo? E as bombas lançadas no Oriente Médio? A situação se torna ainda mais grotesca se considerarmos que, poucos dias atrás, o governo israelense anunciou o plano de invasão e ocupação militar de Gaza. E que segurança é oferecida pelos senhores dos campos de detenção líbios, aos quais o governo italiano e a União Europeia — atual e anteriores — terceirizam a gestão da imigração?

Hoje, “segurança” é o termo guarda-chuva sob o qual se escondem as piores distorções autoritárias do nosso tempo: genocídio, guerra e militarização no exterior, e repressão de qualquer voz dissonante no interior, com a recente aprovação de um pacote de segurança — o antigo projeto de lei 1660, convertido em decreto e em vigor há um mês — que ataca as liberdades e é digno de um Estado policial. Uma manobra que coloca em risco o direito de greve e de protesto dos trabalhadores, num país onde as desigualdades sociais aumentam, a marginalização é cada vez mais difundida, e a impossibilidade de ter um futuro digno nos isola, forçando-nos a vidas cada vez mais precárias. A riqueza de poucos se sustenta sobre a miséria de muitos. Os que nos governam já decidiram qual é a “solução” para enfrentar a crise: gastar dinheiro público com armamentos para enriquecer a indústria bélica, aumentar os gastos militares para 3,5% ou até 5% do PIB, como exigem os EUA, e apostar numa reconversão militar do setor automotivo. Bilhões de euros serão entregues às empresas armamentistas, que sempre lucraram economicamente com os conflitos ao redor do mundo.

Essas mesmas empresas financiam Israel, lucrando com o genocídio do povo palestino e com a limpeza étnica daqueles territórios, direcionam a pesquisa pública para fins militares, lucram com a guerra e com a exploração extrativista dos territórios colonizados. Nesse contexto, somos simples engrenagens de um mecanismo que não é capaz de nos oferecer um futuro digno, de autodeterminação, bem-estar, mais tempo livre, paz e equilíbrio com os povos e com a natureza. Enquanto os senhores da guerra se reúnem no isolamento luxuoso de suas salas douradas, do lado de fora haverá uma cidade sitiada, fechada para seus próprios cidadãos e cidadãs. Que imagem mais simbólica da nossa sociedade: de um lado, os que planejam as guerras futuras; do outro, os trabalhadores e trabalhadoras sobre cujos ombros recairá a miséria que virá.

Diante disso, é necessário se opor com firmeza ao rearmamento da União Europeia e combater a narrativa belicista promovida em rede nacional.

Rejeitamos qualquer tipo de argumento que tente justificar os hipócritas “gastos com segurança” como uma necessidade inadiável. Como sempre, o preço dessa loucura belicista é pago pelos povos, não apenas com sangue, mas também com contínuas privações econômicas. Não há nada de inevitável nesse presente de pobreza nem no futuro de sofrimento que nos oferecem. Não caiamos na propaganda vazia de um sistema que nos esmaga. A guerra não é uma fatalidade. A guerra é a “solução” cruel para as contradições insolúveis de um sistema econômico desumano.

Fonte: https://radioblackout.org/2025/05/napoli-rifiuta-la-guerra-e-il-riarmo-no-al-summit-nato-del-26-maggio/

Tradução > Liberto

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agência de notícias anarquistas-ana

o céu resfria
a lua vestiu
uma charpa de bruma

Rogério Martins

Lula pacifista. Será?

Lula se diz “humanista”, “pacifista”, “paz e amor”, mas assistiu desfile militar na Rússia que envolveu milhares de militares, tanques, veículos para transporte de tropas, blindados, mísseis, sistemas de artilharia, jatos da força aérea russa etc.


E, ridículo, em sua recente viagem oficial à Rússia e à China, o “pacifista” ainda falou de fazer parcerias de “defesa e segurança” com ambos países.

Será que o “pacifista’ esqueceu que foi ele que inaugurou em maio de 2023 a linha de produção do caça Gripen, na fábrica da Embraer, na cidade de Gavião Peixoto, interior de São Paulo? Aliás, aviões (caças) comprados da empresa sueca Saab por mais de… 20 bilhões!!!

Será que o “pacifista” esqueceu que seu governo (Ministério da Defesa) comprou um lote de foguetes Skyfire 70 para o Exército? Isso sem falar de outros armamentos bélicos.

Será que o “pacifista” tem ciência que seu governo patrocina, apoia e participa de inúmeras feiras de “defesa e segurança” no Brasil, América Latina e em outras regiões do mundo? Leia-se feiras do “mercado da morte”.

Será que o “pacifista” sabe que suas Forças Armadas realizam regularmente exercícios de guerra em terra, mar e ar, e que tais simulações de combate contribuem significativamente para a poluição e as mudanças climáticas?

Será que o “pacifista” tem conhecimento que o Brasil lidera os gastos militares na América Latina?

Será que o “pacifista” sabe que todos os homens brasileiros, que completam 18 anos de idade, são obrigados a se alistar no serviço militar (as mulheres podem prestar o serviço militar por opção)?

Será que o “pacifista” também ignora que, enquanto prega diálogo e desarmamento em fóruns internacionais, seu governo negocia a exportação de tecnologia militar brasileira para regimes autoritários, incluindo aqueles acusados de crimes contra a humanidade? Não bastasse a hipocrisia de condenar guerras alheias, o Brasil, sob sua liderança, lucra com a venda de equipamentos que podem alimentar conflitos sangrentos em outras partes do globo. Uma contradição tão gritante quanto conveniente, onde o discurso de “paz” serve de cortina de fumaça para negócios que prosperam à sombra da morte.

E o tragicômico, o “pacifista” ainda sonha de ser laureado com o Prêmio Nobel… da Paz!!!

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agência de notícias anarquistas-ana

A abelha tristonha
— fauna e flora devastadas —
produz mel amargo.

Leila Míccolis

Manifesto de Inimigos do Rei

Maio de 2025

Por que falamos agora?

O jornal O Inimigo do Rei sobreviveu, de 1977 a 1988, como uma experiência alternativa e antiautoritária, mantendo-se como uma voz combativa em defesa do anarquismo e contra a ditadura em vigor, naquele momento. Seu objetivo sempre foi duplo: divulgar o pensamento libertário e incentivar a construção de organizações baseadas na ação direta, na solidariedade, no federalismo e na autogestão. Em suas páginas, rejeitávamos toda e qualquer forma de centralização do poder e denunciávamos as armadilhas da política institucional que buscam domesticar as forças vivas da transformação social. Hoje, trinta e sete anos após a última edição impressa, sentimos a necessidade urgente de nos manifestarmos novamente. O autoritarismo se espalha com uma velocidade avassaladora pelos quatro cantos do mundo, impulsionado pelo crescimento da extrema direita e por novas formas de controle e repressão. Ao mesmo tempo, a esquerda institucional e os movimentos progressistas seguem sendo seduzidos por soluções que reforçam a estrutura estatal e seus mecanismos coercitivos. Diante desse cenário, nós, ex-participantes de O Inimigo do Rei, reafirmamos nosso compromisso com a liberdade, a autogestão e a resistência contra toda forma de dominação.

O mundo que denunciamos

A expansão do autoritarismo não se dá apenas por meio de governos de extrema direita, mas também por meio de novas formas de controle digital, da militarização das sociedades e do aprofundamento das desigualdades econômicas. O capitalismo, em sua fase mais agressiva, segue devastando territórios, precarizando vidas e restringindo direitos, enquanto os Estados reforçam seus aparatos repressivos para conter qualquer forma de dissidência. Além disso, assistimos a um fenômeno preocupante: a escolha, por meio de eleições, da via autoritária como suposta solução para problemas como economia, imigração e governabilidade. Em diversos países, a extrema direita tem se apresentado como resposta ao caos social, seduzindo parcelas significativas da população com discursos de ódio, nacionalismo excludente e repressão brutal. Paralelamente, cresce a atração por um “novo” conservadorismo que, em muitos aspectos, revela-se tão ou mais estúpido que aquele da Era Vitoriana, reafirmando valores retrógrados e reforçando estruturas opressivas. No Brasil, a falsa polarização entre neoliberais e progressistas tem apenas aprofundado a dependência de mecanismos estatais, afastando cada vez mais a possibilidade de uma organização social verdadeiramente livre. O populismo autoritário avança tanto à direita quanto à esquerda, enquanto comunidades autônomas, movimentos populares e minorias continuam sendo silenciados e perseguidos.

O que defendemos

Desde as edições de O Inimigo do Rei, sempre enfatizamos que liberdade e igualdade podem (e devem) caminhar lado a lado. Não buscamos utopias inatingíveis, mas apontamos para experiências concretas de autogestão e organização popular que demonstram a capacidade das pessoas de viver sem tutela do Estado e do capital. Reforçamos a capacidade autônoma da classe trabalhadora de gerenciar seus locais de trabalho, criando espaços livres de exploração e coerção. Acreditamos que a emancipação real só virá quando aqueles que produzem a riqueza também a administrarem coletivamente, sem patrões, sem burocratas e sem parasitas políticos. Além disso, alertamos para a necessidade constante de vigilância contra elementos sociais que possam se tornar entraves ao respeito e à tolerância mútua. A religião, por exemplo, não pode ser instrumento de opressão ou imposição de valores autoritários. Defendemos que a liberdade individual deve prevalecer sobre dogmas e que cada pessoa deve ter o direito de viver de acordo com suas próprias convicções, sem medo de repressão ou discriminação.

Chamado à ação

Este manifesto é um chamado para que se fortaleçam redes de solidariedade e resistência. A experiência de O Inimigo do Rei mostrou que é possível enfrentar as estruturas de poder com independência e criatividade, mesmo em um período ditatorial. Conclamamos todas e todos que não aceitam a submissão a se organizar, a se conectar e a fortalecer práticas libertárias em seus territórios.

Seguimos inimigos do rei, do estado e de qualquer forma de dominação.

Porque a luta pela liberdade não tem fim.

veiosdakombi.com.br

agência de notícias anarquistas-ana

Frio da manhã
— os pombos aglomerados
parecem mais cinzas

Marba Furtado

Manchados pelo petróleo: um histórico de derramamentos, impunidade e abusos na Amazônia do Peru, Colômbia, Equador e Bolívia

// No Peru e Colômbia, mais de 200 processos sancionadores por infrações ambientais contra 72 petroleiras nos últimos dez anos. No Equador e Bolívia, falta de transparência ou informação incompleta de parte das instituições governamentais. \\

De vez em quando, um cheiro intenso de óleo desperta repentinamente os habitantes indígenas da comunidade Kichwa de 12 de Octubre, na região amazônica de Loreto, Peru. Quando saem para verificar o que está acontecendo, se encontram com a mesma cena que se repete faz cinco décadas: uma mancha oleosa que vai se espalhando pela ravina na qual pescam, cozinham e se banham mais de cem famílias. Em 17 de março deste ano a comunidade denunciou um novo derramamento, um mais dos tantos reportados no lote petroleiro 192. Os habitantes das comunidades estão fartos: “Nunca melhora a situação, todas as empresas tiveram derramamentos desde OXY, Pluspetrol e Petroperú. Os tubos estão podres, tem anos instalados e por isso se está contaminando constantemente“, diz Natanael Sandi, monitor ambiental indígena que reporta os danos causados pelo petróleo.

Em Mongabay Latam reportamos problemas neste lote ao menos uma dúzia de vezes nos últimos seis anos. E a cifra se multiplica se incluímos outros países com influência de indústrias extrativas na Amazônia. Os temas se repetem: comunidades locais afetadas, empresas sancionadas, conflitos e impunidade. Qual é a magnitude desta situação? Quais são as empresas mais multadas ou sancionadas por faltas ambientais?

>> Para ler o texto em espanhol na íntegra, clique aqui:

https://noticias.imer.mx/blog/manchados-por-el-petroleo-un-historial-de-derrames-impunidad-y-abusos-en-la-amazonia-de-peru-colombia-ecuador-y-bolivia/

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

café da tarde—
na mangueira em flor
farra de pardais

Nete Brito

[Chile] Santiago: Assumindo atentado explosivo contra Laboratórios Abbott – Recalcine

Maio Negro 2025.

As pobres se queixam,

Ninguém as escuta.

Usando armas,

Agora as ouvem

Mulheres formem grupos! Esta ação não é um ato de protesto nem muito menos de clemência, é deliberadamente um ato vingativo. Faz uns anos a distribuição de pílulas anticoncepcionais defeituosas por parte dos laboratórios Abbott – Recalcine ocasionou centenas de gestações não desejadas, ante esta situação as empresas responsáveis propuseram indenizar com $38.900 pesos, soma nem sequer próxima à metade do que nos custou armar este artefato explosivo, e ainda que muitos não estejam de acordo com o método de ação, convenhamos ao menos que a soma oferecida é uma zombaria, outra mais por parte da ditadura democrática empresarial.

Os laboratórios Andrómaco, Silesia e Abbott continuam fazendo destas práticas uma política da empresa: seguir distribuindo anticoncepcionais defeituosos. Nada novo em todo caso. Era esperado que, tanto os grupos empresariais como o Estado administrado pelo governo pluri-policial feminista de Boric e do violador Monsalve, guardassem silêncio. A eles só interessa a reprodução do ciclo da pobreza porque, em essência, o capitalismo administra a vida e a morte para a sistemática geração de riquezas sem importar os danos que possam ocasionar.

Unidas pela afinidade e o interesse comum pela ação, organizamos nossas vontades no terreno prático da informalidade, longe de todo vitimismo e discursos pacificadores que posicionam a ação insurrecional fora das possibilidades da luta anárquica. É necessário tomar parte na ofensiva antiautoritária com as ferramentas necessárias que potencializem nosso projeto de liberação.

Nossas bombas foram confeccionadas e transportadas ainda quando a tormenta é forte e o céu está escuro. Os ataques clareiam o horizonte e então cai, repentinamente, a máscara da sociedade… Quem de vocês pode fazer julgamento da sabotagem? Os valores da ofensiva anarquista e a ação revolucionária enfrentam com convicção e integridade a alienação capitalista e aos que cobrem seu rosto com o véu da miséria.

Com este ataque recordamos o companheiro Mauricio Morales que a 16 anos de sua morte continua presente no avanço da guerrilha urbana anarquista. Neste Maio Negro, a memória e a ação se entrelaçam para que nem o tempo nem as distâncias deem passagem à acomodação e à negação da história de combate de nossos mortos.

Marianna, que o doce odor da dinamite atravesse os muros. Estaremos contigo até o final!

Honra, memória e ação pelo companheiro anarquista Kyriakos Xymitiris.

Em solidariedade com os presos anarquistas e antiespecistas. A arrebentar os muros dos cárceres!

A criar 1, 10, 100 células de ação, sigamos escrevendo com fatos nossa história de combate!

Pelo ataque em todas as direções, apostemos nossas forças na criação de um projeto internacional!

“Podes destruir a vida das pessoas, não conseguireis extinguir o pensamento e as práticas antiautoritárias. Não conseguireis romper a tensão revolucionária, não conseguireis apagar a anarquia.” – Anna Beniamino.

Células Revolucionárias Belén Navarrete – Nueva Subversión

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

No céu e no mar,
gaivotas brincam como eu
queria brincar!

Ziraldo

[França] Palestina: 77 anos de Nakba, 18 meses de genocídio

Enquanto Israel, há várias semanas, intensifica seu bloqueio a Gaza e usa a fome como arma genocida, e enquanto as bombas continuam a chover, Netanyahu anunciou na última segunda-feira sua intenção de “assumir o controle” da região. No domingo, 18 de maio, ele lançou uma grande operação terrestre batizada de “Carruagem de Gideão”, uma ofensiva final para esvaziar Gaza de toda vida palestina.

Há meses, a guerra genocida que Israel conduz no território palestino de Gaza, somada à sua ofensiva colonial na Cisjordânia, não enfrenta qualquer protesto real das grandes potências imperialistas. Recentemente, fingindo alarme com o uso da fome — que na realidade já se arrasta há muito tempo —, os governos ocidentais têm participado direta e indiretamente no apoio a esse genocídio: vendendo armas, oferecendo “apoio incondicional” diplomático e político, ou se recusando a cumprir os mandados de prisão da Corte Penal Internacional. Eles terão que responder perante a história.

A França não fica atrás: vendas maciças de armas da Thales para Israel, dissolução da organização Urgência Palestina a pedido do ministro do Interior, criminalização do apoio ao povo palestino, perseguição jurídica e policial contra organizações solidárias, manutenção de Georges Abdallah na prisão e, mais recentemente, a vergonhosa incapacidade de Macron de pronunciar a palavra “genocídio” durante seu desfile midiático em 13 de maio… A presença de Israel e suas empresas de armamento no Salão do Bourget, de 16 a 22 de junho, mostra que a suposta mudança no discurso francês não passa de fachada: Macron pode até falar em “drama humanitário” em Gaza, mas suas palavras não são seguidas por nenhuma ação concreta para impedir o genocídio.

Enquanto comemorávamos em 15 de maio os 77 anos da Nakba — a expulsão de 700 a 800 mil palestinos pelo Estado sionista, após uma limpeza étnica planejada —, a catástrofe nunca cessou. O genocídio em curso em Gaza e o plano de deportação implementado por Israel são mais uma etapa nos crimes do sionismo. A urgência não é apenas por um cessar-fogo: é por um verdadeiro processo de descolonização, que ponha fim, de uma vez por todas, à longa Nakba do povo palestino.

Nosso papel, aqui na França, é lutar sem descanso contra a cumplicidade de nosso próprio imperialismo e pelo isolamento político e diplomático de Israel. A luta contra o armamento surge como uma frente prioritária, e convocamos todos a fortalecê-la, participando das campanhas Stop Arming Israel e BDS, bem como de todas as iniciativas de solidariedade com o povo palestino.

A Palestina viverá, a Palestina vencerá!

União Comunista Libertária – UCL

20 de maio de 2025

Fonte: https://unioncommunistelibertaire.org/?Palestine-77-ans-de-Nakba-18-mois-de-genocide

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

primeira manhã gelada –
na luz do sol, o hálito
do gato que mia

David Cobb

Licença para Destruir: O Capitalismo Avança sobre a Foz do Amazonas

Eis que o senado brasileiro aprovou, sem qualquer surpresa de nossa parte, regras que flexibilizam o licenciamento ambiental, abrindo caminho para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas, representando mais um capítulo sombrio na história de destruição promovida pelo capitalismo.
 
Sob o pretexto de desenvolvimento e segurança energética, o Estado brasileiro, em conluio com corporações como a Petrobras, ignora os alertas de cientistas e comunidades tradicionais sobre os riscos socioambientais dessa empreitada. A criação de uma Licença Ambiental Especial, que permite a agilização de processos em casos de decisão política, evidencia, mais uma vez e independentemente de qual é o partido de ocasião, a subordinação das normas ambientais aos interesses econômicos imediatistas.
 
Essa medida é uma afronta à autonomia dos povos amazônicos e à integridade dos ecossistemas que sustentam a vida na região. A Foz do Amazonas, rica em biodiversidade e lar de inúmeras comunidades tradicionais, está sendo colocada em risco por decisões tomadas sem a devida consulta e consideração dos impactos a longo prazo. A flexibilização do licenciamento ambiental não apenas ameaça o equilíbrio ecológico, mas também perpetua a lógica colonial de exploração e expropriação dos recursos naturais em benefício de poucos.
 
A justificativa de que os recursos provenientes da exploração petrolífera serão utilizados para financiar a transição energética é falaciosa. Na prática, essa narrativa serve para mascarar a continuidade de um modelo econômico baseado na extração desenfreada e no consumo insustentável. Enquanto isso, alternativas verdadeiramente sustentáveis e respeitosas com o meio ambiente e as culturas locais são negligenciadas. A dependência de combustíveis fósseis, além de contribuir para as mudanças climáticas, reforça as desigualdades sociais e econômicas existentes.
 
Como anarquistas, devemos denunciar e resistir a essas políticas que colocam o lucro acima da vida. É imperativo fortalecer as redes de solidariedade com os povos da Amazônia, apoiar suas lutas por autodeterminação e promover modelos de desenvolvimento que respeitem a natureza e os direitos humanos. A verdadeira transição energética e social só será possível através da ruptura com as estruturas de poder que perpetuam a exploração e a opressão. A defesa da Amazônia é, portanto, uma luta contra o capitalismo e por um mundo mais justo e livre.
 
Liberto Herrera.
 
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agência de notícias anarquistas-ana
 
na folha orvalhada,
gota engole gota,
engorda, desliza e cai.
 
Alaor Chaves