O assassinato de um rapper antifascista em Atenas, pelo Partido de ultradireita Aurora Dourada, significou uma série de movimentos no tabuleiro da cena grega. Em seguida à ação fascista, grupos antifascistas, notadamente anarquistas e alguns comunistas, imediatamente responderam com uma visita nada cordial à sede dos fascistas em Atenas – com o intuito de vingar a morte do rapper e dar um recado claro: não irão tolerar nenhuma ação fascista contra seus membros ou apoiadores e, em geral, contra qualquer pessoa.
A polícia já estava preparada para a resposta anarquista e, quando os anarquistas chegaram, os policiais já formavam um cordão de isolamento na sede dos fascistas da Aurora Dourada, no sentido de protegê-la. O confronto deu-se então com a polícia, já que, curiosamente, os membros fascistas, ao que parece, não estavam em sua sede.
Se o confronto não mobilizou de forma ampla a sociedade grega (já que as respostas ao atentado deram-se, até o momento, por grupos mais específicos), a imprensa, por outro lado, analisou o episódio como uma tentativa de fazer irromper na sociedade grega uma guerra civil entre “direita” e “esquerda”, leia-se entre anarquistas – talvez também comunistas – e fascistas.
Daí a condenação orquestradas pelo partido governista ao ataque cometido pelo Aurora Dourada ter dois objetivos:
1 – Reforçar o caráter democrático-capitalista da sociedade grega, acusando o Aurora Dourada de não ser nem democrático e nem capitalista e, portanto, estar à margem da sociedade e suas ações, e nesse sentido ser criminosas, não porque matam e violam direitos pessoais e sociais, mas porque querem um regime ditatorial, antidemocrático;
2 – Coordenar uma resposta do Congresso grego no sentido de colocar o partido Aurora Dourada como criminoso e expulsá-lo da legalidade e, por consequência, tal postura vale também para os grupos de esquerda radical, já que a intenção é deixar na legalidade apenas os partidos e grupos que pleiteiam a reforma do sistema: porque temem a uma suposta e inventada guerra civil.
Assim, o governo grego ao atacar o até então tolerado grupo fascista Aurora Dourada, quer colocar no mesmo campo todos os grupos que não comungam com a democracia burguesa, mesmo que não sejam autoritários e nem racistas. Dessa forma querem legitimar a ação do Estado contra os grupos radicais que se colocam contra o plano de austeridade, que ocupam prédios vazios, que enfrentam as medidas governamentais que causam desemprego, pobreza e desespero com pedras e paus. Na verdade, ao invés de tratar do crime cometido pelos fascistas ao matar um jovem antifascista, a direita, o centro e os socialistas querem se aproveitar da situação de confronto para impor receios e medos de uma possível guerra civil e, com essa justificativa, penalizar todos os movimentos sociais, principalmente anarquistas e, na prática, manter o Aurora Dourada funcionando – já que mesmo clandestinamente o grupo fascista continuará tendo apoio da polícia e dos organismos repressores do Estado grego e transitando livremente nas ruas da Grécia. O que a meu ver ocorre é uma verdadeira inversão, talvez meticulosamente planejada.
Dessa forma, os atuais ataques contra os grupos fascistas, para o governo, parlamento e seus parlamentares servem de motivo para o estabelecimento dessa criminalização do movimento social e, particularmente, criminalização dos anarquistas, verdadeiro alvo da burguesia instalada no Congresso.
Daí a importância do Ato no próximo dia 6 de outubro contra o Fascismo e o Estado, que talvez devesse ser acompanhado por atos de solidariedade em todo o mundo.
É impossível ainda saber a extensão, mobilização e a profundidade das respostas que serão dadas nos atos e nas manifestações; o certo é que as greves que ocorrem agora deveriam se transformar em guerra de solidariedade às vítimas dos ataques fascistas, já que dias antes do assassinato do rapper, 16 integrantes do Partido Comunista foram surpreendidos em sua sede pelos membros do Aurora Dourada, resultando em 10 comunistas hospitalizados, sem que o governo, na prática, tenha feito muita coisa para coibir esse tipo de ação, além do palavrório, inclusive com a companhia do próprio Partido Comunista.
Quanto mais social e ampla for a resposta antifascista, menos possibilidade tem os congressistas de colocarem ou tratarem como se do mesmo campo fossem fascistas e anarquistas. Isso não significa que as respostas específicas devem parar, muito ao contrário, elas devem ser combinadas com movimentos de massa que coloquem o governo em posição defensiva e o obrigue, e a seus correligionários no parlamento, a tomar medidas contra a violência direitista, o racismo, o xenofobismo e homofobismo do grupo Aurora Dourada, no fundo, braço paramilitar tolerado e, no limite, cúmplice do governo e seu gendarmes, evitando que o discurso governamental se legitime e consiga levar para o campo jurídico as lutas sociais, querendo com isso que as ações fascistas covardes e desumanas contra pessoas e grupos se confundam com as guerras de classes travadas pela população nas ruas de Atenas e por toda a Grécia contra o capitalismo e a exploração aviltante, comandadas pela União Europeia.
Clayton Emanuel Rodrigues
Segunda-feira, 23 de setembro de 2013, Mitilini, Ilha de Lesbos, Grécia.
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