[Último pronunciamento em tribunal da anarquista Alexandra Dukhanina (Naumova), acusada de violência contra a polícia durante uma manifestação da oposição em Moscou, na praça Bolotnaya, dia 6 de maio de 2012, realizado em um tribunal de Moscou no dia 5 de fevereiro de 2014.]
Em um primeiro momento, pensava que todo este caso era algum tipo de engano maluco e sem sentido. Mas agora, após ouvir os discursos dos promotores públicos de acusação e após descobrir quais são os termos de condenação que reivindicaram para todos nós, descobri que na verdade querem vingança. E se vingam porque nós estávamos lá e vimos como tudo realmente aconteceu. Quem provocou os confrontos, como as pessoas estavam sendo agredidas, a crueldade injustificada. Eles se vingam de nós porque não atendemos a suas demandas e não admitimos nossa culpa inexistente: nem durante a investigação, nem durante o julgamento. Eles também se vingam porque não os ajudei com suas mentiras e me recusei a responder suas perguntas.
Deve ser bastante pesado o que consideram ser minha culpa, pois mereceria ser punida com seis anos em colônia penal. Não existem outros que recebam tal punição, somos os únicos restantes – eles têm medo de criminosos de verdade, os estranhos que estavam em seu caminho foram presos, e não irão tocar em nenhum dos seus. É sua responsabilidade, Meritíssimo, em decidir como ajudá-los a se tornarem mais felizes às custas de nossos destinos, como podem arranjar novos compromissos, subir posições na hierarquia e receber prêmios.
Mas, afinal, por que seis anos? O que são os “pelo menos oito arremessos intencionais” que eu fiz? De onde vieram? Contra quem eu estava mirando e quem eu acertei? Oito policiais diferentes? Ou oito vezes contra os dois policiais contra os quais avancei para atacar? Se isso ocorreu, quantas vezes ocorreram e contra qual deles? Onde estão as respostas para todas essas perguntas? Eles deveriam, em primeiro lugar, fornecer a descrição detalhada, assim como as provas, e somente me aprisionar após comprovadas – afinal, são seis anos da vida, não é motivo para sorrir. Mas agora não parece mais como apenas uma mentira, é uma mentira demagógica sem fatos, e uma brincadeira com a vida das pessoas. E se tivessem 188 vídeos, não 8, teriam dito então que eu realizei 188 arremessos?
Existem dois oficiais da polícia antimotim OMON contra os quais cometi violência, você os reconheceria. São duas ou três vezes o meu tamanho e estavam utilizando armadura corporal. Um deles não sentiu absolutamente nada, o outro não foi ferido por mim e não reportou contra mim. É esta a violência das manifestações massivas pela qual eu deveria ser presa por seis anos?
Ah, me esqueci sobre o kvass [bebida russa fermentada] – a garrafa por si só vale cinco anos, e oito arremessos intencionais podem contar pelo ano restante. Agora eles devem me dizer que ao menos eu saberei o preço do kvass. E será que também poderiam me dizer, quando iniciaram e terminaram minhas práticas de desordem de massas, e quando tem início a violência contra policiais? E qual é a diferença entre as duas coisas? De algum modo não compreendi: que incêndio? Ataques? Destruição de propriedade? E onde eu me encaixo no meio disso tudo? O que eu estava quebrando? O que eu incendiei? O que eu destruí? Com quem eu organizei uma conspiração? O que prova qualquer uma dessas questões? Resumindo, eu irei pegar quatro anos sob o Artigo 212 [do Código Criminal da Federação Russa, no que diz respeito a motins massivos] simplesmente porque eu estava lá? Então, minha presença em uma manifestação originalmente pacífica é o motim de massas que tomei parte? Não há nada além disso! Olhe para estas pessoas. Não são assassinos, ladrões ou golpistas. Prender a todos nós não seria apenas injusto, seria também perverso.
Muita gente sugeriu que eu confessasse, pedisse desculpas, dissesse o que o investigador gostaria de ouvir, mas sabe, não acho necessário pedir desculpas para essas pessoas. É um costume neste país que [oficiais de aplicação da lei] sejam absolutamente intocáveis, apesar de haverem muitos casos reportados dos mesmos criando redes de proteção a traficantes, cafetões, ou estupradores. Recentemente houve um caso como este na região de Lipestk.
Os conteúdos das acusações realizadas contra todos nós não são apenas ridículas, como também absurdas e baseadas unicamente nas declarações da polícia antimotim OMON. Então o que temos? Se uma pessoa tem farda, ela é a priori honesta e sagrada?
Meritíssimo, nos oito meses deste julgamento você recebeu da defesa provas suficientes sobre nossa inocência. Portanto, se enviar-nos para uma Colônia Penal, irá aleijar vidas e destinados por nada!
As autoridades querem tão desesperadamente mostrar como estamos sendo punidos a ponto de estarem prontas para tal resolução? Suspender uma sentença para um oficial, estuprador ou policial por [indiscernível] é normal; eles são os intocáveis, são como você. Mas podemos definhar na prisão – afinal, quem somos nós, nós não somos nem mesmo ricos. Mas por alguma razão eu estou certa de que mesmo na prisão eu serei mais livre do que muitos deles, porque tenho a consciência limpa e, aqueles que permanecerem livres, continuando com a sua chamada defesa da ordem da liberdade, viverão em um cárcere eterno com seus cúmplices.
Eu posso admitir meus erros, e se através da verdade e dos fatos eu pudesse ser informada e persuadida que fiz algo ilegal, teria admitido. Mas ninguém nunca me explicou nada: haviam apenas mentiras descaradas e força bruta. Pela força eles podem asfixiar, carregar… [indiscernível] e tudo isso foi feito contra mim. Mas através da força ou das mentiras você não pode provar nada. E ninguém provou a minha culpa. Estou certa de que estou correta e inocente.
Gostaria de concluir com uma citação do “Conto de Cipollino”, por Gianni Rodari:
“- Meu pobre pai! Você foi preso como um criminoso, com ladrões e bandidos.
– Do que você está falando, filho, – seu pai o interrompeu – Existe muita gente honesta na prisão!
– Mas por que estão presos? Quais foram as coisas ruins que fizeram?
– Absolutamente nada, filho. Por isso foram presos. Prince Lemon não gosta de gente decente.
– Então, estar preso é uma grande honra? – ele perguntou.
– Parece que sim. Prisões foram construídas para aqueles que roubam e matam, mas sob a ordem de Prince Lemon tudo está ao contrário, ladrões e assassinos estão neste palácio, e pessoas honestas na prisão”.
Mais sobre Alexandra Dukhanina: http://wiki.avtonom.org/en/index.php/Alexandra_Dukhanina
Fonte: http://grani.ru/tags/may6/m.224210.html#child-224195
Tradução > Malobeo
agência de notícias anarquistas-ana
A fruta aberta
revela o mistério
da raiz: néctar.
Roberto Evangelista
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!