Afinal, o Estado está fazendo sua parte: construindo mais presídios, experimentando a privatização do sistema carcerário, criando leis mais rígidas, adestrando mais policiais para repressão, etc. E o que nós estamos fazendo?
O tema dos cárceres é ainda um tema tabu entre a sociedade e surpreendentemente entre nós anarquistas, pois é um assunto complexo e cujas reflexões não nos levarão à respostas programadas ou conclusões definitivas. É uma luta constante e cada vez mais necessária. Na verdade sempre foi muito necessária e estamos verdadeiramente em atraso. Por isso nos organizamos e seguimos esta iniciativa da criação de um evento solidário voltado para a situação carcerária utilizando-se da tatuagem, do piercing e modificação corporal, de toda expressão anti-estética, como ferramenta para criar uma vivência, um espaço físico e de calor humano que resgate a situação carcerária da amnésia da memória social e dê uma visibilidade às pessoas presxs nas masmorras do Estado, e onde inclusive podemos questionar as práticas e lógicas carcerárias em nossos próprios cotidianos.
A Prisão é uma instituição do esquecimento, as pessoas não desejadas pelo Estado são jogadas em caixas com tampas fechadas, para que cada revolta, cada desacordo com o existente seja oculto na indústria da morte que produz o sistema carcerário. Frente a isso também sentimos o intuito de dar visibilidade a essa realidade oculta, e fazer disso uma temática recorrente em nossas buscas/práticas, objetivando transformar em solidariedade real axs lá detidos. Gostaríamos de trazer situações, palavras e lutas dessas pessoas, servir de telefone-sem-fio para os gritos, desabafos e opiniões dxs presxs. Buscamos também que nossas iniciativas se projetem dentro das estruturas carcerárias, no aqui e agora, em tempo real para cada vez mais conectar a realidade “de dentro” com a “de fora” e romper esta linha de separação, tão fictícia quanto real.
A tatuagem/piercing/expressão anti-estética vem sendo usada como ferramenta para criação de eventos conectados com a temática anti-cárcerária em diversos outro locais do globo, e vamos sendo influenciados por estas iniciativas. É um evento que se destaca a liberdade de expressão do corpo como afronta e negação dos moldes sociais dominantes e consumidos, uma busca pela reapropriação de nossa identidade pessoal e coletiva e de nossa capacidade de manifestação de vida. Utilizando-se também da tatuagem para arrecadar uma grana afim de manter um fundo de apoio à luta anti-carcerária, fundo este para emergências para xs compas que se envolvam em armadilhas judiciais, como dar um aporte para os que lá já estão presxs, também para manter nossa capacidade de estarmos gerando informação/divulgação e a continuação de eventos solidários. Tiramos proveito disso através de valores arrecadados com as tatuagens, colocação de piercing, e com diversas formas de arte e expressão que possam ser compartilhadas no evento.
Já foram duas edições do Solidariedade à Flor da Pele, o primeiro realizado em novembro de 2013 em Porto Alegre e o segundo em junho de 2014 em Pelotas, sendo encontros produtivos e que nos estimularam a seguir esta experimentação. Vivemos um momento conturbado de pós-Copa e de eleições nacionais, onde a máscara da paz social neste país finge esconder todos os processos repressivos, os abusos de poderes contra xs pobres e todo o esquema de saqueio da Terra e seus bens naturais se intensificam, de maneira oculta mas progressiva. Por isso, e por todo nosso desejo de liberdade e de destruição das estruturas de domínio, é que existe a necessidade da continuidade de eventos/espaços de discussão e prática.
A terceira edição do evento Solidariedade à Flor da Pele será nos dias 16, 17 e 18 de janeiro de 2015, em Porto Alegre (RS). Aproveitamos para convidá-los para construirmos juntxs essa nova edição, com as idéias mais afiadas, com as práticas mais intensas, e com as nossas afinidades… à flor da pele!
Visite o nosso blog: aflordapele.noblogs.org
Contato: aflordapele (@) riseup.net
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e eu no telhado
Rosa Clement
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!