, instituições dominadas por brancos, traia essa ideologia com a qual a Europa te escraviza enquanto você goza antevendo lucro.
Por Hamilton Borges dos Santos (Walê)
“Pra bater de frente com os bota preta.
Os camisa preta, os camisa preta” (Bonde da Reaja de Cachoeira e Feira de Santana)
Diante de um tumultuado ano de violações sistemáticas aos direitos humanos; diante da reiterada posição do Governo do Estado da Bahia (Rui Costa), contrariando a nossa humanidade, revelando seu ódio através de seus projetos e programas de segurança pública que compõem a “necropolítica” que nos caça, nos elimina e que silencia algumas lideranças negras; diante dessas lideranças que deveriam se manifestar, deveriam romper com o projeto genocida e estabelecer outra tática politica, já que a ocupação dos partidos e dos governos e dessas supostas instituições de direitos fracassou. Diante de tudo isso: nós nos mantemos firmes. Obrigamo-nos a chamar para a unidade aqueles e aquelas que escaparam dessa zona de controle racial, que acabou por fritar a alma e a dignidade de parte expressiva desse movimento negro nacional tutelado.
Alguns setores viciados e outros tantos subalternos à agenda pontual, exógena aos nossos interesses enquanto povo explorado pelo racismo e neocolonialismo brasileiro, querem cobrar de nós unidade. Uma unidade para salvar ou apoiar um projeto politico em que o povo de um modo geral e as lideranças partidárias só ficaram nas bordas, nas periferias, em um “lugar” secundário nesse projeto institucional fracassado que eles batizaram de Promoção da Igualdade. Esses mesmos deram o tiro de misericórdia contra seu projeto de igualdade quando compararam Zumbi dos Palmares com seu presidente “operário”, justamente no 20 de Novembro de 2015, ao serem comemorados os 20 anos da vitoriosa Marcha Sobre Brasília, marcha que reafirmou a imortalidade e a postura de ruptura de nosso herói de Palmares. Tangenciam sob vaias a agenda fundamental por nossas vidas, diante das agressões racistas de todos os governos contra a nossa humanidade, mas saem como leões de chácara do Lulo-Petismo-Dilmismo.
Não jogamos ninguém para a direita conservadora, não temos nem tempo. Nem fazemos nenhum discurso pró-direita, isso é o próprio partido do governo que o faz e com muita competência ao se alinhar aos banqueiros sustentados pela exploração da vida há séculos; ao agronegócio que expulsa quilombolas e mata famílias negras com alimentos envenenados por seus agrotóxicos; à indústria internacional carcerária que lucra com nossos corpos engaiolados e com as argolas eletrônicas que nos adornam os pés, como grilhões em uma época nem tão remota; e o mercado da violência e da guerra, que faz das nossas feridas, das nossas mutilações, das nossas sequelas e dos nossos sofrimentos o tilintar das moedas em sua máquina registradora. Em cima de quantos corpos negros desovados esse governo se mantém? Recusamo-nos a apoiar esse poder que nos mata seja em que coloração partidária se apresentar. Nossa tarefa é comunitária “reconstruir nosso orgulho que foi feito em pedaços” (M. Brown)
Reafirmo: lamentavelmente o governo federal atual deixou poucas possibilidades para qualquer negro ou negra que se respeite venha a defendê-lo nas ruas, na medida que uma série de alianças com a extrema direita, esses setores conservadores das elites e classe média branca que seguiu por treze anos com trânsito livre pelo palácio de planalto, drenando recursos do povo com seus lobbys, fortalecendo e duplicando as riquezas dos bancos, das empreiteiras que lucram com construção de cadeias e o agronegócio com sua madame motosserra, envenenando alimentos, matando camponeses, criminalizando os povos originários (indígenas), os povos Quilombolas, instituindo políticas de lei e ordem para justificar mandatos coletivos em nossas comunidades, ocupando uma favela com o Exército Brasileiro, confirmando nossa tese de que o governo nos trata como inimigos internos.
Não vamos fazer coro a nenhum impeachment porque essa horda de verde amarelo são inimigos, é a branquitude em estado bruto se preparando para acirrar nosso linchamento. Nem na direita, nem no centro e muito menos na esquerda, o povo negro teve lugar na mesa do banquete. Temos nossa própria pauta a defender, nenhum governo vai nos pautar como querem os servidores, funcionários, cabo eleitorais e capachos do governo.
O fato é que esqueceram as atrocidades, as barragens construídas em terras indígenas, as intimidações, as ameaças e as mortes aos milhares, celebradas a cada conferência de promoção da igualdade que não deu em nada, cada coquetel de lançamento de alguma miragem do juventude viva que só liberou algum salário e viagem para uma juventude negra viciada em editais que esqueceu como se movimentar por conta própria. Cada capitulo do fim da Seppir que se consumiu como projeto para negros e se tornou esse negócio de cidadania, reivindicado polidamente com listas de adesão pela internet, até que sucumbiram miando como gatinhos amestrados. E a escandalosa, pasmem, celebração de nossa desgraça com produções de memória com o dinheiro do Pacto Pela Vida aqui na Bahia. O mesmo “Pacto” que paga as armas, a gasolina, a bala, a ocupação de nossos territórios, todo mundo aplaudindo a contradição de ser financiado pelo maior inimigo dos negros na Bahia. Com quantas memórias de negros e negras assassinadas se faz um pacto pela vida?
Recusamos sua unidade sem cheiro ou suor. Queremos unidade com os da rua, os que queimam pneu, ônibus, que trancam as ruas, as vias, com os anarquistas, os quilombistas, os povos indígenas, Punks, Rappers, mendigos, o menino e a menina da quebrada dançando num paredão de som, a bicha esculachada pela hipocrisia das igrejas. Queremos aliança com os terreiros que não alcançam os projetos, com os evangélicos que distribuem sopa e aliviam a dor da alma, com a puta, a cafetina, essa turma que não serve ao projeto Black is Beautiful dessa fauna de consciência ingênua, militante de rashteg (#), que pensa que títulos, cargos, diplomas e desfiles de moda são escudo.
Dispensamos essa unidade feita às pressas para fazer volume em manifestações que não nos dizem respeito. Recusamos essa unidade que sempre aparece em vésperas de ano eleitoral, unidade para boca de urna, unidade para rolezinho no salão da presidenta, unidade para nada, fajuta, de gente que vive destilando ódio contra nós porque não aceitamos os brindes do palácio do planalto ou de ondina.
A Unidade que queremos já está articulada pela nacional e internacional Pan-africanista desde Espanha, México, Estados Unidos, Peru, Colômbia, Equador, Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo. Nossa unidade se articula pelos becos de Nordeste de Amaralina, Fazenda Coutos, Engomadeira e Vila Moisés. Pelas Quebradas de Itinga e Periperi, pelas ruas, pelas celas, pelos campinhos de terra.
E é esse o chamado que queria fazer a nós: nos encontremos, articulemo-nos, fortaleçamo-nos para nosso projeto próprio. E para que isso ocorra: voltem pra sua comunidade e operem a mudança, sejam a mudança.
Sem voto, sem volta, sem vacilação,
Hamilton Borges dos Santos (Walê)
Direto da Cidade Tumulo – Salvador
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Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!