O que há de errado em uma caminhada¹ que pede mais “respeito, segurança e tranquilidade” e vai até o governo do Estado pedir mais policiamento? Muita coisa.
Pedir respeito, segurança e tranquilidade para a sociedade sem levantar a questão da violência policial nas comunidades da periferia, contra a população de r
ua, contra os movimentos sociais e sem mencionar toda violência sistematizada praticada pelo aparato estatal e pela própria sociedade contra os mais pobres é um pedido que só defende uma parcela da população enquanto garante a opressão do resto.
Pedir mais polícia é pedir a prisão de mais inocentes, já que quase metade das pessoas que estão dentro das penitenciárias ainda aguardam julgamento – o que pode durar vários anos (não é incomum que a demora seja mais longa do que as sentenças de quem é julgado e considerado culpado). É pedir a prisão dos mais pobres, que sem dinheiro para um advogado competente acabam sendo presos por crimes leves – que jamais levariam à prisão alguém de classe média ou alta. Pedir mais polícia é pedir mais opressão nos bairros da periferia, onde a população vive com medo da polícia, que chega atirando, invade residências sem mandado judicial, bate, tortura e mata impunemente. Pedir mais polícia é pedir mais vigilância, perseguição e repressão a quem não concorda com o funcionamento do sistema e se mobiliza por mudanças.
Pedir mais polícia é pedir mais tranquilidade para os ricos que têm seus luxos bancados pela exploração dos mais pobres, garantindo que quem não está contente continue calado, aceitando a situação. Achar que mais polícia é ter mais tranquilidade é ignorar os séculos de opressão da população negra pelas forças policiais – e que continua ainda hoje.
E isso é mais bizarro ainda quando essa marcha contra a insegurança é puxada pelas mesmas pessoas que organizam a Serenata Iluminada, um evento frequentado por jovens presumivelmente não conservadores, que passam a noite bebendo cerveja artesanal e fumando maconha – e quer mais polícia? Que curte fazer ou ver intervenções pela cidade – que quando são feitas por pobres e negros e estes são pegos pelos policiais, pode significar um espancamento na beira do rio Guaíba.
É bizarro porque a segurança na própria Serenata Iluminada não depende da presença de policiais. Na verdade, não seria seguro fazer parte do que se faz nesses encontros caso houvessem policiais. Um evento que reúne tantas pessoas a noite em um local considerado dos mais perigosos da cidade poderia levantar questionamentos mais importantes, como a compreensão de que o que gera segurança efetiva não é a polícia, mas sim a presença do povo nas ruas, as relações comunitárias e de apoio mútuo, etc.
Se for para marchar pela “segurança” e pedir mais polícia em frente ao Palácio Piratini, pelo menos tenham a decência de assumir o que esse protesto realmente significa: pedir mais segurança e tranquilidade para a classe média e alta, branca e privilegiada e para quem não procura mudanças, e a opressão dos demais.
[1] https://www.facebook.com/events/1561344040846068/
Fonte: https://fagulha.org/caminhada-iluminada-um-convite-a-repressao/
agência de notícias anarquistas-ana
Sob o ipê florido
embelezam de amarelo
as flores que caem.
Sandra Hiraga
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!