Julho de 2016. Fui convocado há três semanas para o que seria a apresentação de um importante livro para o anarquismo latino-americano, mas também para a política e a literatura, por ser o autor uma notável referência para as letras na América hispânica. Tratava-se de Manuel González Prada (o professor Don Manuel, como lhe chamavam os operários anarcossindicalistas peruanos e muitos mais que o reconheciam como uma luz indiscutível), poeta, gênio de notável prosa, amante dos livros e das causas “perdidas”. Efetivamente, Prada (como simplesmente preferia que o chamassem) foi a máxima influência de toda aquela geração de escritores e políticos peruanos que viam nele um tipo notável, culto, informado, de finos e contundentes argumentos, em suma, todo um guia e sábio para a nascente intelectualidade de princípios do século XX.
Nesse âmbito das ideias, Prada aparece com dois livros de realce no que se refere ao ensaio ou ao jornalismo Páginas Livres e Horas de Luta, mas todos coincidem que é sua vertente anarquista a que faltava ler e reler (para conhecê-la e compreendê-la), pois seu máximo livro nesse sentido foi Anarquia, grande livro de doutrina libertária e contundente em seus argumentos e ideias, mas desconhecido e distante, ao fim e ao cabo. Este livro (póstumo, certamente) e que foi reunido como tal pelo filho do senhor Manuel, Alfredo González Prada e seu amigo Luís Alberto Sánchez, ambos intelectuais de realce, foi convertendo-se logo em um livro significativo, pois aparecia nomeado e indicado por distintos companheiros inconformistas em sendas antologias do pensamento libertário ou em obras específicas, onde já lhe davam uma importância enorme ao pensamento de ação de González Prada.
Assim, resgatamos o livro do esquecimento de muitos anos, em uma árduo trabalho de edição. A última edição (de forma individual) foi de 1948 como parte das obras completas que tentou tirar L. A. Sánchez, mas que ficaram incompletas pela saída abrupta do país de LAS, por razões políticas. A edição de julho de 2016 se tornaria a quinta, mas, perceba, é a primeira publicada de forma individual (sem ser parte de suas obras completas ou como volume da edição inteira) no Peru. E ademais, com um prólogo que aborda minuciosamente o anarquismo de Manuel González Prada. Aí está a importância editorial que aportará ao redescobrimento de Prada como libertário, ao vê-lo novamente nas estantes de livrarias e quiosques.
No domingo, 17 de julho, se encontraram interessadxs, companheirxs, intelectuais, e muitxs mais, no Velho auditório do local da Associação Guadalupana na Avenida Alfonso Ugarte. Esta atividade se deu no contexto da AntiFIL, um evento que se promocionou como contrapartida (e crítica) da elitista e mercantilista Feira Internacional do Livro (FIL), e que se organizou sobre a base de princípios autogestionários e de companheirismo de índole libertária, pois se propiciou a aproximação de individualidades que exerciam o “faça você mesmx” em oficinas, feiras de fanzines, veganismo, femininismo, etc. A iniciativa foi excelente, ainda que com alguns pontos baixos em certos aspectos, mas que a oxalá se corrijam nas próximas edições do evento. Nada melhor que apresentar este livro em um lugar onde abundem, ao menos, as melhores intenções de jovens entusiastas!
Pela tarde, perto das quatro, começou a apresentação com palavras introdutórias de Lutxo Desobediência, encarregado desta edição e prologuista, para dar-lhe logo a vez aos comentaristas Rodolfo Ybarra (escritor e jornalista) e Franz García (jornalista e militante libertário), que desenvolveram, cada um à sua maneira, notáveis dissertações com precisões sobre a obra de Prada e seu alcance político, dados biográficos de interesse, anedotas particulares, etc. Quem mais se beneficiou foram os assistentes, pois por fim, veio à luz uma edição crítica e de grande tiragem desde os mesmos prédios libertários, se nota que a editora Anarcrítica esteve detrás deste esforço que bem merece se chamar histórico pelas precisões antes ditas sobre a edição em particular e sobre este livro na generalidade da importância de sua publicação. Entre os assistentes, se contou com a presença de Thomas Ward, um estudioso da obra de Manuel González Prada, já com livros sobre este autor e com um catálogo de referência na web de e sobre o grande professor libertário.
Logo, logo, os editores distribuirão esta importante e por certo, bela edição. As ideias do Prada libertário devem discorrer, porque são germinais e combativas, pois não só põem o dedo onde salta o pus e é visível a ferida, senão que germinam e ainda são muito atuais e vigentes como os dos grandes libertário de todos os tempos. Com vocês, novamente o grande livro Anarquia.
Tradução > KaliMar
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