Iru Moner, ativista do meio libertário em Barcelona, fala sobre a perseguição que estão sofrendo os anarquistas nos últimos anos.
Iru Moner é um conhecido ativista do meio libertário, ademais de militante de diferentes assembleias libertárias como a mítica “Kasa de la Muntanya” do bairro barcelonês de Gracia. No dia 16 de dezembro de 2014, este espaço foi invadido pelo Mossos d’Esquadra [polícia catalã] durante a “Operação Pandora” contra o terrorismo anarquista.
Foram detidas quatorze pessoas. Eram acusadas, entre outras coisas, de fazer parte do suposto emaranhado de células dos chamados Grupos Anarquistas Coordenados ou GAC- filial espanhola, segundo a polícia, da Federação Anarquistas Informal-Frente Revolucionária Internacional (FAI/FREI)- ao que se atribuía a autoria de diferentes atentados terroristas e atos de vandalismo. O manifesto da fundação do GAC tornou-se público através da w eb “alasbarricadas.org”. A única menção tática à violência consistia em se referir ao uso da sabotagem como ferramenta política legítima.
Você fez parte do GAC?
Não, nunca participei naquilo.
Ao que se refere com aquilo? Ao grupo terrorista do que falava a polícia? A uma coordenadora de grupos anarquistas ou, como mantém alguns, a uma espécie de fábula criada na dispensa do Estado e de algumas administrações autonômicas como a catalã?
Pelo que entendi, era uma agrupação criada para coordenar aos distintos grupos anarquistas de todo o Estado. Depois do 15M e de ambas greves gerais, deu na telha do Governo catalão que os setores mais críticos da sociedade haviam se radicalizado em torno do anarquismo e começou a dedicar a nós parte dos recursos que antes destinavam à luta contra o ETA. Cada distrito de Barcelona dispõe de dois agentes que se ocupam de investigar os movimentos sociais e, por alguma razão, se usou a coordenadora como testa de ferro. Criaram um relato completamente fictíci o de acordo ao qual anarquistas estavam se organizando para fomentar a violência e produzir uma resposta aos cortes e à crise muito mais radical. Estes supostos atentados dos quais não sabemos nada e presuntivamente cometidos por alguns grupos da coordenadoria deram asas a sua tese. Depois, a Audiência Nacional lhes comprou o filminho e se produziu a primeira operação “Pandora”, à qual seguiria uma segunda. No meio de ambas, se produziu a operação “Piñata”, esta de âmbito estatal. E mais recentemente, a “Ice”, na que caiu Nahuel, ainda preso. Todas elas tinham como objetivo enfrentar ao “terror anarquista”.
Alguns dos artefatos explosivos eram muito reais.
Tudo o que sei sobre esses ataques é o que afirma a imprensa sobre a bomba do Pilar e acerca das explosões em caixas eletrônicos. Mas uma coisa é que, três pessoas levem a cabo um ataque e outra é fabular toda uma trama sobre uma enorme organização criminal e estender a sombra da dúvida sobre o conjunto dos anarquistas. E com essa sombra, com semelhante desculpa, irromperam em quatorze centros sociais e espaços liberados altas horas da noite e confiscaram material escrito e informático que ainda não devolveram. O GAC era uma coordenadora de vários grupos estatais que ficou conh ecida como um compacto grupo violento com a ajuda da imprensa. Mas, inclusive, o tribunal que condenou os chilenos pela bomba da basílica do Pilar descartou que se tratasse de uma organização terrorista. Nem possuíam os recursos logísticos necessários nem a organização precisa.
O juiz terminou por arquivar Pandora II e reprovou aos Mossos que não aportaram nenhum indício contra os nove anarquistas imputados.
Os quatorze imputados por Pandora I, ainda estão a espera do julgamento. Pandora II se arquivou porque não tinham nada. Mas graças a isso, conseguiram informação de como trabalhamos, quem somos e que capital manejamos. E, acima de tudo, aterrorizaram ao movimento. De fato, foi um golpe duro para o meio libertário porque muitas pessoas se foram com medo, ou reduziram seu nível de comprometimento.
Quem continua na prisão é Nahuel, por pertencer ao coletivo “Straight Edge”, de corte anarquista e por seus supostos ataques contra agências bancárias madrilenhas.
Straight Edge é uma tendência emparentada com o punk hardcore, que se opõe ao consumo de drogas e a ingestão de produtos de origem animal. Fomentam o veganismo e o amor verdadeiro. E, em tal sentido, se opõem à comercialização dos afetos. Organizavam conferências, concertos… e careciam de um projeto político. Se referiam a eles como se fossem terroristas. A leitura que fazemos desde o movimento libertário é que atuaram contra eles a modo de revanche pelos policiais feridos durante as marchas da dignidade. Difundiram a ideia de que Straight Edge estava por trás dos distú ;rbios e Nahuel foi o bode expiatório.
E porque você acredita que a Interior lhe inquieta tanto o anarquismo?
Viram que somos um agente social e político em crescimento e nosso discurso não pode ser absorvido e neutralizado pelo sistema, tal e como acontece com os grupos mais reformistas que acabaram no Governo.
Nunca escondemos que nossa luta tem por finalidade mudar o sistema político e social e isso não pode ser recuperado nem desviado para melhorar o capitalismo. Não pode ser assimilado para provocar mudanças…
Você diz que são um coletivo em crescimento… O que você diz sobre o espírito do 15M?
Sim, o espírito do 15M era de certa maneira anarquista. De fato, muitos de nós participamos naquilo. Claro, cada vez que surge uma força política dessa magnitude aparecem agentes dispostos a instrumentalizar ou absorvê-la. Foi o que fez Pablo Iglesias [líder do partido Podemos] e o tratou de fazer IU [Esquerda Unida], sem êxito. Agora que tomaram a iniciativa em Barcelona compreenderam que o poder político é uma minúcia, frente aos da polícia, o estado profundo, os militares, a imprensa ou as oligarquias econômicas… E então, toda essa ilusão que haviam capitalizado est& aacute; se diluindo. Para dar a volta à desigualdade social ou as injustiças que potencia este sistema não basta votar a um ou outro partido. É preciso dar a cara cada dia. No trabalho, na PAH [Plataforma de Afetados pela Hipoteca], na obra social…
Então, é nesse dia a dia, onde se desenvolve a luta do movimento libertário?
Durante muitos anos, o anarquismo pecou ao planejar objetivos demasiados abstratos e inabarcáveis. Agora queremos ir pouco a pouco, recuperando direitos, arrebatando espaços, dividindo aos ricos, à patronal… e, sobretudo, combatendo essa ideia que nos associa, como há um século, às bombas ou a uma moda juvenil ou que nos equipara a uma espécie de crença utópica. Perdemos a batalha midiática, mas da operação Pandora aprendemos a cuidar da comunicação. O espírito do 15M continua vivo e se recrudesce a crise, renascerá com força.
Fonte: http://www.publico.es/politica/inventaron-trama-organizacion-criminal.html
Tradução > KaliMar
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