Sem apoio econômico e direcionado na difusão de ideias, há cinco anos que estas editoras se fortaleceram em várias cidades do país. O seu trabalho, longe da industria literária tradicional, é resgatar autores clássicos como Kropotkin ou Malatesta e difundi-los sem pretensão de lucro. “É mentira que na Colômbia as pessoas não gostam de ler; não leem porque aqui os livros são muito caros”, dizem.
Por Andrés J. López – Ilustração por Enka
“Tem você todo o direito de copiar este livro de forma total ou parcial, e por qualquer meio de impressão. O seu conteúdo não está protegido por nenhum monopólio cultural ou comercial; foi um livro livre ao longo da história. Ninguém o vai culpar, multar ou encarcerar por difundir ou copiar; ao contrário, estaremos muito agradecidos se o faz. O conhecimento é para difundi-lo de forma livre”. Poucas vezes se abre um livro e se encontra esta declaração, não restritiva – como é a regr a geral – se não permissiva.
Essa tem sido a premissa na qual intelectuais, poetas, estudantes e seguidores do anarquismo tem estado publicando, de maneira independente e em maior medida desde há cinco anos, textos próprios e alheios. Estas editoras fizeram-no escolhendo uma melhor apresentação e apontando na produção de tiragens maiores, diferentemente dos panfletos e fanzines publicados faz mais de 20 anos nas universidades e outros espaços libertários.
Alguns livreiros colocam a origem destas editoras anarquistas na Feira do Livro Independente e Autogestionada (FLIA), que começou em Buenos Aires (Argentina) e a partir de 2010 se transladou a Bogotá. Desde a primeira edição, os visitantes que chegavam a este evento literário começaram a familiarizar-se com uma produção diferente, clandestina e artesanal, na qual os animou a produzir os seus próprios livros. Um deles foi Fabián Serrano, membro da editora bumanguesa “Imprenta Comunera”. “O bom de ter u ma editora independente é que escapamos da imposição de autores e figurões e só nos concentramos naqueles personagens que consideramos importantes”, disse Fabián, que, junto a outros dois companheiros, conseguiu editar oito publicações em apenas cinco meses.< /font>
Eles, o mesmo que os seus colegas em outras editoras, não se preocupam por gerar lucro, mas sim difundir os seus pensamentos e ideias entre a maior audiência possível. Por isso, todo o tempo fazem resgates editoriais de anarquistas reconhecidos mas pouco comerciais como Emma Goldman, Piotr Kropotkin, Errico Malatesta, Uri Gordon, Henry David Thoreau e de pessoas com mais renome mas com um lado libertário pouco conhecido, como Oscar Wilde ou Noam Chomsky. Para estas reedições é mais complicado conseguir o texto que publicá-lo, pelas suas poucas cópias existentes; os autores de esta corrente independente difundem sua obra sem nenhuma restrição. “Sentimos que quando criamos algo isto já deixa de nos pertencer, então, que as pessoas o assumam como seu é maravilhoso”, diz Iván Darío &Aa cute;lvarez, escritor, pensador anarquista e marionetista, fundador do teatro “La Libélula Dorada”.
“Pie de Monte” é uma das editoras que faz estes resgates, mas que também quer apostar em novos escritores. Atualmente trabalham com textos de amigos e conhecidos, mas o seu objetivo é que depois mais gente se anime a publicar os seus trabalhos originais. “Fizemos isto porque a ideia é que as pessoas saiam das dinâmicas editorias e dos blogs e resgatemos o oficio do livreiro. Isso sim, o único que não tem discussão é que quem publique conosco deve deixar os direitos da obra livres”, comenta Santiago López, membro desta editora.
A conjuntura é outro fator importante nos resgates ou escritos originais: muitos publicam-se em determinado momento para demonstrar que as ideias anarquistas de há várias décadas continuam vigentes. Assim ocorreu com a última publicação de “O Rei Nu”, da editora de Iván Dario e do poeta Juan Manuel Roca, “USA nasceu de lunáticos”, uma recompilação de fragmentos de um ensaio que o novelista Henry Miller fez após o fracasso estadunidense no Vietnam. Um texto que acabam de lançar como critica ao atual governo de Donald Trump.
Embora os livros sejam o formato preferido pelas editoras anarquistas, os folhetos, agendas e jornais não ficaram esquecidos. “El Aguijón”, uma editora criada dentro da Universidade Nacional de Medellín em 2006, lançou uma seleção de contos curtos e está começando o segundo, mas ocasionalmente sai o jornal “El Aguijón – Klavando la duda”. Por ele recebem um apoio econômico para poder desenvolver os seus projetos. Na sua página se pode baixar grátis.
O dinheiro investido recupera-se na maioria das vezes, mas para reduzir custos ou acelerar o processo, é comum que algumas editoras unam forças. “Rojinegro” e “Gato Negro” lançaram um conjunto de textos como “Estratégia e táticas na prática anarquista”, de Errico Malatesta, e “Anarquismo e poder popular: teoria e prática sul-americana”, uma compilação de teorias e opiniões sobre o anarquismo e o poder popular. O número de exemplares varia e assim algumas vezes alcançam as 300 cópias, outras vezes saem umas 30.
Pelo desconhecimento dos autores, ou prejuízos que há perante o anarquismo, são poucos os lugares que tem estas publicações nas suas estantes. Em Bogotá, os mais comuns são “La Valija de Fuego”, “Rojinegro”, “La Libélula Dorada”, “Luvina”, “El Dinosaurio”, “Árbol de Tinta” e “La Madriguera del Conejo”. Oscar Vargas, um dos fundadores da “Gato Negro”, tentou chegar a outros espaços mas não lhe saiu bem. “Isto foi ir contra um muro porque em várias livrarias cobravam entre uns 30% e 40% sobre o pre&cc edil;o de venda, então eles tinham ganâncias por algo que nós não temos. Só com uns poucos podemos fazer negócio”, explica Óscar.
Mas nem a clandestinidade, nem o baixo orçamento que lidam, foi impedimento para que cheguem a outras partes do mundo. Por meio de conhecidos ou com trocas por kilos, as editoras colombianas chegaram a levar textos até Argentina, Chile, Equador, México, Perú, Uruguai, Brasil e Espanha. Os livros que lhes são enviados, comercializam para recuperar o dinheiro investido ou, como no caso de “Rojinegro”, incluem-nos no Centro de Documentação Ácrata, uma livraria que se encontra no seu local e que qualquer um pode consultar ou fotocopiar.
Nos preços está a chave para chegar a mais gente: a maioria dos livros vendem-se entre sete mil e quinze mil pesos [entre 7 e 15 reais], aproximadamente. “Verificamos que nas feiras independentes os metaleiros ou punks sacrificam o dinheiro porque se interessam no que fazemos. É mentira que na Colômbia as pessoas não gostam de ler; não leem porque aqui os livros são muito caros”, explica Fabián.
Às editoras libertárias na Colômbia falta-lhes ter uma maior difusão, mas sentem-se conformes com a situação atual e que cada vez mais pessoas queiram sair da realidade do comércio e se atrevam a publicar ou a piratear o trabalho de autores que incomodam a outras editoras, incluindo ao Estado. A sua aceitação é cada vez maior e este mês, por exemplo, uma tradução do livro de Iván Darío Álvarez e Juan Manuel Roca, “Dicionário anarquista de emergência”, começou a ser distribuído na França.
Para Roca, isto é um sinal de inconformismo latente que persiste na humanidade. “O anarquismo é como Drácula, que em todos os finais do filme matam-no mas em cada emboscada desperta e está mais vivo que os próprios vivos. Quantos anos lhe declararam a sua morte e você vê que todos os movimentos exploratórios das juventudes e os que não fazem parte de um partido canalizam-se de uma maneira tão vigorosa e sem formas”, afirma.
Tradução > Joana Caetano
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