Bloco a bloco se desfazem os muros
Se nos tiram os espaços, multiplicamos a solidariedade
No ano de 2014, um grupo de moradoras de Compostela okupamos o antigo local da agrupação de baile e canto tradicional “Cantigas e Agarimos” fechado desde 2011. O C.S.O.A. Escárnio e Maldizer aparecia assim como um espaço para as pessoas no casco velho da cidade desenhado hoje para o turismo massivo e distante das necessidades dos moradores. Durante três anos trabalhamos intensamente neste projeto; reabilitamos o edifício; o enchemos de ideias diversas, que procediam de diferentes tradições políticas e sociais. Com o passar do tempo, esse frio edifício em ruínas se converteria efetivamente no Escárnio e Maldizer erigido contra as mais profundas raízes que sustentam o hétero patriarcado capitalista; dizemos solidariedade, apoio mútuo, autonomia, horizontalidade, autogestão.
Neste 30 de maio de 2017 desalojavam o Escárnio e Maldizer: cobriam suas portas com um muro de cimento que permanecerá na memória coletiva como o irônico símbolo da injustiça e do insuportável; do que o Estado faz com o que não pode suportar. Mas os muros estão feitos para conter o que em princípio não pode ser contido. De novo, se confirmava a engrenagem sistêmica: desde o Estado e sua polícia, até os governos vários, até a específica Construtora a Rosaleda e sua Empresa Alpanide, responsável pela execução da obra. Por dinheiro aceitamos e por medo esquecemos.
Durante dois dias, as ruas de Compostela sustentaram uma resposta multitudinária e contundente: a cidade recuperou sua voz – se, se recupera só o perdido e deixou claro que isto não iria ficar assim. A brutalidade policial contribuiu para desatar a raiva, a profunda raiva. A insubmissão é o lugar a que se chega quando compreendemos o que ocorre quando é a obediência a que faz a história.
Frente aos posicionamentos vazios; aos argumentos armadilhas, só existem duas possibilidades: defender ou não defender o movimento autônomo e autogestionado, defender ou não defender os centros sociais, defender ou não defender o Escárnio e Maldizer.
Estaríamos enganadas se pensássemos que o desalojo do C.S.O.A. Escárnio e Maldizer é um caso isolado ou o resultado de um conflito particular de uns proprietários que reclamam o que pensam que lhes pertence.
Somos muitas as pessoas que nos vimos reprimidas nos últimos tempos: independentistas galegas, anarquistas, migrantes, trabalhadoras, estudantes, etc. A luta que hoje nos ocupa vai mais além do Escárnio e Maldizer: a centralização do poder do Estado espanhol, imerso em uma crise de regime que demonstra sua debilidade, passa pela desarticulação de todo movimento social e expressão popular, de tudo o que verdadeiramente o questione.
A okupação é uma ideia radical que começa por desafiar a lógica da propriedade privada que condena ao povo à miséria. É fácil compreender por que assistimos desde faz uns meses a uma campanha midiática nos meios de desinformação contra a okupação; campanha que sem dúvida prepara o terreno para recrudescê-la legislativamente. Realmente o que perseguem é a especulação: negócios para uns poucos e empobrecimento para o resto.
Desafortunadamente para eles nossas ideias não se desalojam. Não é esta outra bandeira. O mesmo pensamento que nos levou a okupar o Escárnio e Maldizer, nos levará a okupar outros espaços se não podemos recuperar este. Espaços construtivos, espaços para nossas vidas. Neste sentido, somos incorrigíveis, insubordinadas.
Reiterando os agradecimentos das mostras de solidariedade e apoio, convidamos a toda pessoa e coletividade a participar da grande mobilização que percorrerá as ruas de Compostela no próximo sábado 10 de junho. Uma mobilização sustentada na convicção de que qualquer maneira de expressar a raiva é legítima.
10, 100, 1000 centros sociais!
Tradução > Sol de Abril
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