Por Regina Helena Santos
“As coisas mudam, para ficar tudo do mesmo jeito.” Com esta frase a educadora Isabel Dessotti faz sua reflexão sobre o caminho percorrido pela educação brasileira nos últimos cem anos. É claro que importantes avanços aconteceram — para citar apenas um, a garantia de acesso de todos os brasileiros à escola. Porém, depois de se dedicar à pesquisa de como era a educação dos operários, que dentro das fábricas de tecido ajudaram Sorocaba e Votorantim a despontar como importantes forças econômicas, Isabel chegou à conclusão que em pleno século 21 muitas dificuldades daquela época ainda persistem.
Professora universitária e supervisora de ensino da rede municipal de Votorantim, Isabel acaba de defender, na Unicamp, sua tese de doutorado sobre o tema. Dentre os pontos de destaque, a luta do movimento operário, no final do século 19 e início do século 20, para que a educação atendesse aos anseios daqueles trabalhadores — que não queriam apenas aprender o básico, mas o que lhes desse oportunidade de “crescer” na vida. “Tanto as políticas de governo como o movimento operário incentivavam a educação. Porém, de maneiras distintas, porque os interesses eram diferentes.” Para o governo e o capital, não era interessante que os operários tivessem uma formação mais abrangente. “A educação oferecida moldava o cidadão republicano. E o movimento operário, com grande incidência de imigrantes, queria a libertação, no sentido de ter entendimento de mundo.”
O movimento operário lutou por uma escola nos moldes da escola moderna, uma concepção pedagógica do espanhol Francisco Ferrer, que era uma educação para a emancipação da pessoa: para ambos os sexos, que se preocupasse com a ciência e não fosse tão ligada à igreja. Eram as chamadas escolas anarquistas. A proposta inovadora até foi aceita inicialmente, mas à medida que as escolas eram formadas e os patrões começavam a ver que a ideologia anarquista era muito forte, passaram a ser perseguidas e até destruídas. Sorocaba teve uma escola nestes moldes, por volta de 1912. “Ela não era formalizada, não era do Estado. Era mantida pela União Operária. Mas o responsável se envolveu em questões políticas. Como era estrangeiro, foi preso e expulso do país.” A escola foi fechada. “Para uma cidade industrial, o ensino primário e uma escola profissionalizante estava bom. Essa era a visão daquele tempo.”
Adultos e crianças
Falar da educação operária também não é restringir as etapas iniciais do ensino às crianças e adolescentes. Naquele tempo, os bancos escolares eram ocupados por muitos adultos, pois o analfabetismo era grande. Porém, ainda que estes fossem livres para buscar uma vaga e frequentar as aulas, dificilmente conseguiam. “Houve, por exemplo, iniciativas de cursos noturnos, para adultos e meninos com mais de 14 anos, mas com aulas começando às 18h. Frequentar era impossível para os operários, que saíam das fábricas 19h30, 20h”, conta Isabel. O ensino existia, mas era para poucos e não tinha, na prática, o resultado esperado. “Fazia-se a lei, mas não havia como aplicar. Essa era a maior queixa dos operários.” Se esses fossem mulheres ou crianças, a situação era ainda mais complicada. “Quando o grupo escolar foi instalado, com o objetivo de atender todas as crianças, isso não aconteceu. Não havia vagas para todos e estas acabaram sendo ocupadas apenas pela elite.”
Semelhança
Quando se tenta imaginar como as coisas funcionavam há um século, é difícil não fazer uma relação daquela situação com os dias atuais. Hoje, ainda que todos tenham garantida por lei sua vaga na escola, como há cem anos, o ensino oferecido nem sempre vai ao encontro dos anseios — um exemplo é a atual discussão sobre o papel e perfil da formação no ensino médio. “As políticas públicas cumprem a lei, que diz que a educação é direito de todos. Porém, ainda temos uma escola dividida entre pública e particular. Continuamos tendo um ensino para pobres e para ricos. E, infelizmente, muitas pessoas ainda acham que para pobres, “basta” uma escola pobre.”
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agência de notícias anarquistas-ana
vaga tristeza
vaga lume
vaga só
Alonso Alvarez

Perfeito....
Anônimo, não só isso. Acredito que serve também para aqueles que usam os movimentos sociais no ES para capturar almas…
Esse texto é uma paulada nos ongueiros de plantão!
não...
Força aos compas da UAF! Com certeza vou apoiar. e convido aos demais compa tbm a fortalecer!