Mais uma vez, muitos anarquistas se deixaram arrastar, pegos por eventos que não esperavam e não conheciam (ou queriam) para influenciar com suas próprias palavras e ações. Muitos anarquistas são facilmente seduzidos por tudo o que tem um caráter “massivo”, sem parar para pensar um pouco o que é o que eles estão realmente apoiando e sem saber, poder ou querer participar com seu próprio discurso, eles só querem estar onde as “pessoas” estão e ver o que ocorre mais tarde.
Sobre a “vontade popular” e a “legitimidade das massas”:
Muitos anarquistas têm estado nas ruas nestes últimos dias, participando de protestos junto com muitos outros, mas o que é realmente exigido nestes protestos? Quem são esses “outros” envolvidos nessas mobilizações? Embora seja verdade que alguns dos manifestantes vêm da esquerdista independentista ou de outras formações esquerdistas não necessariamente nacionalistas, mas que apoiam ou têm querido simpatizar com a causa da independência catalã, sendo que alguns anarquistas podem encontrar algumas afinidades com este tipo de manifestantes, a grande maioria daqueles que saíram às ruas são os cidadãos corretos, amantes da ordem, do civismo, e das boas maneiras, muitos eleitores da direita conservadora catalã, representado pela CIU, ANC… etc.
Há vista estão as demandas dos manifestantes, bem como suas ações. Da mesma forma que eles rejeitam e são hostis à Guarda Civil ou a Polícia Nacional, eles dão flores para os Mossos (polícia catalã) e os aplaudem como se fossem heróis. Parece que esses anarquistas têm algum tipo de compromisso para apoiar sem questionar o que foi classificado como “vontade popular”, ainda sendo esta vontade popular para criar um estado próprio com uma política marcadamente conservadora-direitista, com as suas próprias fronteiras, com a sua própria polícia, com as suas instituições, prisões, leis, capitalismo e miséria, mas com uma bandeira diferente e nova imagem de libertação.
Parece que para alguns, o patriotismo catalão é mais aceitável do que o patriotismo espanhol, lançando-se em mil e uma desculpas para se justificarem, mas o nacionalismo é nacionalismo no final, como todas as pátrias são opressoras dos povos que habitam seus domínios, e aqueles que não são é porque eles ainda não tiveram a oportunidade. Para aqueles que não sabem o fascismo catalão é tão repulsivo, conservador e rançoso como o fascismo espanhol ou qualquer outro. Ainda assim, os anarquistas foram para as ruas junto com todas essas pessoas, adotando o discurso dessas pessoas, participando nas chamadas dessas pessoas… deixando-se levar por essa imagem de “rebelião”. Por acaso se a vontade da maioria das pessoas fosse um Estado Catalão do tipo nazi/fascista, os anarquistas deveriam também apoiar tais pessoas neste caso? Do nosso ponto de vista, uma característica essencial da anarquia, independentemente de sua corrente ou posicionamento, é questionar e saber como olhar com um espírito crítico, especialmente antes de lançar-se de cabeça em uma piscina que acaba por ser um pântano.
A repressão da polícia nacional e da Guarda Civil tem sido algo que tem inflamado os espíritos de muitos, dando a impressão de que ela estava realmente tomando uma espécie de revolta ou situação de rebelião, nada mais longe da realidade, pois o que tem ocorrido é um estratagema bem planejado desde o início pelo Governo. Desde o início, foi procurado exatamente o que aconteceu, foi buscada a foto da polícia (espanhola) batendo em pacíficos cidadãos catalães indiscriminadamente, fazendo menção específica de que ninguém tentasse resistir ativamente e ter-se silenciado os poucos atos de resistência ativa e luta contra a polícia, enquanto as imagens de brutalidade policial têm sido amplamente espalhadas por todo o mundo. Aqui os anarquistas (e o resto dos que participaram desta farsa) têm sido pouco mais do que os tolos úteis, que serviram como isca para tomar pancadas e sair na foto, tudo como tem sido visto, como parte de uma manobra política do governo para tentar ganhar legitimidade e atrair a atenção do mundo, sendo que no último minuto não havia nenhuma declaração de independência ou qualquer coisa realmente inovadora com o Estado espanhol, se não propostas para o diálogo e negociação. E assim aconteceu que temos visto anarquistas votando, ou fazendo campanha para ir votar, como se fosse algo “rebelde” participar de um evento organizado e dirigido desde cima, com a única utilização de legitimar as instituições existentes e futuras.
O que dizer sobre a “greve geral” acordada, controlada e organizada desde as instituições e das patronais? Uma greve que foi um desfile patriótico de trapos, pacificada pela força para insinuar rumores e ameaças, mesmo por parte dos anarquistas e da esquerda “radical”, fazendo chamadas para estar atento aos “infiltrados e provocadores” e para expulsar das mobilizações quem está encapuzado ou que não tem uma atitude “apropriada”. Assim, vimos os bons cidadãos afastando “os caras maus” e dando vivas à polícia catalã como bons cordeiros, enquanto insultavam e expulsavam das mobilizações e até mesmo atacavam aqueles que não cumpriram o dogma do bom manifestante.
O slogan foi claro: sem violência, sem capuzes ou blocos negros, sem provocações ou respostas à polícia ou as bandas espanholas-fascistas que têm vindo a bater em toda Barcelona. Nada além de uma caminhada sob o do hino patriótico e as bandeiras esteladas, símbolos da “libertação” de um povo sem medo, que tudo siga como planejado. E se há violência, tem que deixar-se ser espancado para que todos vejam no dia seguinte nas capas dos jornais e das notícias do meio-dia quem são os bons democratas pacíficos e quem são os fascistas ruins, aconteça o que acontecer você tem que seguir o jogo do Governo.
Conclusões:
Alguns vieram a catalogar isso como uma revolução, mas se isso é realmente uma revolução, é sem dúvida uma revolução cidadanista liberal-democrática. Embora tenham ilusões ou tentam vender a ideia dizendo que a independência é a única solução ou o remédio definitivo para todos os males mesmo que ninguém tenha expectativas de qualquer emancipação real ou libertação ou mudar absolutamente nada, apenas a cor da bandeira ondulante. De qualquer forma, em nossa opinião, essas mobilizações têm uma data de validade, tendo produzido o “momentaço” dos primeiros dias de outubro, e agora está vindo a desaceleração junto com a descida das calças do Governo. Não vamos dizer que tudo volta ao normal, porque a normalidade nunca se foi, a ordem atual não foi quebrada, na verdade, foi fortalecida. Este é o verdadeiro vencedor desta situação, o Estado e as instituições. Talvez nós estejamos errados e há realmente uma escalada que não podemos prever, mas se isso ocorre, os anarquistas devem sair à rua com um discurso próprio, vigoroso e sem medo de atacar e mostrar os dentes contra quem se coloque na frente, evitando cair na armadilha ou ser fantoches nas mãos de estadistas ou de interesses nacionalistas, evitando fazer o jogo do asco patriótico, embora disfarçado como “rebelde” ou “anticapitalista”. Vamos para a rua.
Vamos aprender com os erros e lições que a história distante e próxima nos deixou e ter cuidado quando se trata de escolher os amigos. O mais lucrativo de toda esta questão seria a capacidade de tornar a situação transbordante e criar as tensões necessárias para escalar a um novo nível de conflito, não só contra o Estado espanhol ou o governo catalão, se não contra o mundo que cria e precisa dos estados e nações.
Abaixo todos os Estados, todas as pátrias, todas as nações!
Para quebrar a paz social!
Alguns anarquistas de Barcelona
Tradução > Liberto
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