por Juliano Angelin
“Quanto mais miséria tem, mais urubu ameaça”.
Foi a frase que ficou na minha cabeça ao longo do dia.
Fiquei pensando sobre como é estar do lado detrás da câmera registrando um desastre desse.
Como registrar e comunicar o acontecimento e a situação sem chover no molhado e sem explorar a condição delicada dessas pessoas? Muitas vezes tive vergonha de mim por estar ali numa situação de privilégio, preocupado em pegar bons takes e entrevistas, enquanto as pessoas acabaram de perder sua moradia, seus pertences e seus entes queridos.
Por um momento tive a impressão de ser o único ali incomodado com esse comportamento carniceiro da mídia. Quer dizer, único não, havia um grupo de crianças revoltadas gritando para não serem filmadas ou fotografadas. Ainda assim, a mídia fez (e está fazendo) seu papel: espreme a ferida para o sangue jorrar.
Isso sem contar com as especulações e boatos sobre a causa do incêndio. Histórias confusas e até com requintes de crueldade. Cheguei a ouvir que um casal brigando ateou fogo num bebê de 5 meses e o incêndio começou (!!!).
Claro, para o senso comum, as pessoas que moram em ocupações são maníacos selvagens capazes dos atos mais terríveis.
E a história do aluguel… Realmente, aquelas pessoas pagavam para uma galera, que se dizia do movimento e que na hora do desastre evaporou, ninguém sabe onde está. E mais uma vez, depois de tudo, quem leva a culpa é o pobre. Já que essa história do aluguel vai ser mais um argumento para criminalizar os movimentos sociais e combater as ocupações.
Conversei com uma repórter que pediu para não aparecer no vídeo. Quando perguntei para ela “Será que a corda não vai estourar novamente para o lado mais fraco”, ela me respondeu com a pergunta “Você trabalha para quem?”
Quando questionei um jornalista que filmava, sem autorização e de forma bastante invasiva algumas crianças dormindo, ele se escondeu atrás da câmera e focou em mim, como se o equipamento de filmagem fosse ao mesmo tempo um escudo e uma arma que o tornasse invencível contra qualquer lei ou ética.
O cenário é bastante desolador e triste. Na volta para casa, passei pelo show da CUT (Central Única dos Trabalhadores), e não entendi como era possível haver aquilo ali, enquanto a poucos metros trabalhadores e trabalhadoras estavam sem ter onde dormir ou queimavam debaixo dos escombros.
Em entrevista, uma das sobreviventes disse chorando: “…Mas a vida continua“.
Voltei pensando: “Continua, mas nunca será como antes”.
> Assista o vídeo (06:42) aqui:
https://www.youtube.com/watch?v=Ib26zu-oNuw
agência de notícias anarquistas-ana
que flor é esta,
que perfuma assim
toda a floresta?
Carlos Seabra
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!