por Rubén Caravaca Fernández | 24/04/2018
A nova edição de ‘Mi desilusión en Rusia’ é uma boa oportunidade para recordar à lituana Emma Goldman, uma das grandes rebeldes do século passado. Considerada uma das pessoas mais perigosas nos EUA, mas também para os líderes da Revolução soviética. Uma referência inquestionável e insubornável da luta do movimento obreiro, do feminismo e do pensamento libertário.
Sempre fiel a seus princípios, combateu sem descanso injustiças e discriminações. Os pensamentos da autora da frase “Se não posso dançar, não quero estar em sua revolução”, a mesma que reconheceu que sua melhor escola foi o cárcere, a que só um derrame cerebral calou, seguem estando vigente. Seus escritos são um bom antídoto ante realidades que parecem inevitáveis.
Emma Goldman é uma referência inquestionável da luta do movimento obreiro, do feminismo e do pensamento libertário. Em 21 de dezembro de 1919, junto com outros 248 presos políticos, foi expulsa dos Estados Unidos, país a que havia chegado com apenas 16 anos, fugindo de sua Lituânia natal e da pretensão de seu pai de casá-la em tão jovem idade.
Poucos anos depois, um acontecimento marcará toda sua vida.
No sábado 1º de maio de 1886 o sindicato American Federation of Labor (AIL) convocou uma greve geral com o objetivo de conseguir a jornada laboral de 8 horas. O manifesto da convocatória dizia assim:
“Um dia de rebelião, não de descanso! Um dia não ordenado pelas vozes jactanciosas das instituições que tem encadeado o mundo do trabalhador! Um dia em que o trabalhador faz suas próprias leis e tem o poder de executá-las! Tudo sem o consentimento nem aprovação dos que oprimem e governam. Um dia em que com tremenda força a unidade do exército dos trabalhadores se mobiliza contra os que hoje dominam o destino dos povos de toda nação. Um dia de protesto contra a opressão e a tirania, contra a ignorância e a guerra de todo tipo. Um dia em que começar a desfrutar oito horas de trabalho, oito horas de descanso, oito horas para o que nos dê vontade”.
As mobilizações continuam no dia seguinte, reprimidas, com um balanço trágico de vários assassinados por armas da polícia. Os trabalhadores, encabeçados por Adolf Fischer, redigem, imprimem e distribuem um manifesto chamando à mobilização para a terça-feira seguinte, 4 de maio. Em uma das concentrações, que se produzem ao longo do dia, uma pessoa anônima arremessa uma bomba, com o resultado de vários obreiros e sete policiais mortos.
As autoridades responsabilizam daquele ato aos convocantes das mobilizações. Cinco deles são condenados a morte, outro se suicidou, os restantes foram condenados a prisão perpétua. A todos eles se conhece como Os Mártires de Chicago. Em sua recordação se celebra cada 1º de Maio o Dia Internacional dos Trabalhadores.
Aqueles acontecimentos impressionaram a jovem Emma convertendo-a, com apenas 20 anos, em uma militante anarquista até o final de seus dias. Anos de luta, encarceramento e repressão como consequência de um ativismo político, feminista, pacifista e antimilitarista sempre ativo, sem claudicar ante nenhum poder ou situação que considerasse injusta. J. Edgar Hoover, primeiro diretor da Oficina Federal de Investigação dos Estados Unidos, mais conhecida como FBI, a qualificou como “uma das mulheres mais perigosas da América”.
Como já se comentou, uns dias antes do Natal de 1919 é expulsa dos Estados Unidos, junto a seu companheiro Alexander Berkman. Em consequência disso se translada a Rússia a bordo do navio Buford. Se acabavam de completar dois anos do triunfo da revolução de 1917, momento idôneo para regressar ao Velho Continente e colocar-se a serviço de um processo que queria mudar definitivamente o mundo.
Após o fervor revolucionário inicial dos primeiros meses, as diferenças entre bolcheviques e anarquistas começam a manifestar-se e com o passar do tempo passam a ser incompatíveis.
A sublevação dos marinheiros de Kronstadt, os mesmos que protagonizaram a de 1905, reclamando uma terceira revolução onde os obreiros fossem realmente os responsáveis da organização do povo e não os soviets, foi a ponta que afundou com o massacre cometido pelo Exército Vermelho, enfrentando os próprios marinheiros e a população civil, a mando de Leon Trotsky, nos primeiros dias de março de 1921.
Em Mi desilusión en Rusia (Ed. El Viejo Topo), Goldman relata em primeira pessoa aquilo quase dois anos – abandonou o país definitivamente em 1º de dezembro de 1921 – de ilusões, esperanças, contradições, amarguras, decepções e raiva.
O faz com a honestidade e lealdade que sempre a caracterizou, sem poupar detalhes, nem críticas tanto às cabeças visíveis da Revolução – Lenin, Trotsky, Zorin -, como a seus companheiros libertários. Aos delegados internacionais confortavelmente convidados que ignoravam ver à nova classe dirigente surgida em nome do proletariado. A supressão da liberdade de imprensa, de expressão, a censura. Aos abusos e crimes da checa [polícia secreta soviética] que controlava absolutamente tudo. As prisões, os campos de concentração do gélido norte, ao exílio siberiano. As diferenças econômicas e de trato entre filiados ao Partido Comunista e os que não o eram, ou pertenciam a outras organizações, que apoiaram e lutaram pela revolução. A uma economia planificada militarmente encaminhada ao colapso e com isso a que os mais desfavorecidos vivessem em situações de autêntica penúria. Ao trabalho obrigatório. A requisição de coletas, o suborno, a corrupção.
Também sua admiração por seus companheiros e companheiras silenciados, perseguidos ou escassamente reconhecidos: John Reed, Piotr Kropotkin, Anzhélika Balabánova, Bertrand Rusell, integrante de uma Delegação Obreira Britânica, Nestor Makno, a muitos trabalhadores e trabalhadoras, e a personagens anônimos que lutavam todos os dias por um mundo melhor.
Ela, que havia apoiado a Revolução com admiração e sem reservas, sendo consciente de que as mudanças de tal magnitude sempre trazem consigo violência e despropósitos. A mesma que se felicitava de sua expulsão dos EUA, já que graças a isso poderia contribuir para a construção da Rússia revolucionária, ansiosa de trabalhar com os bolcheviques. Esses anseios não podiam impedir ver, escutar, perceber, conhecer e julgar com equanimidade. Não poderia calar ante a realidade de um povo que se levantou contra a ditadura dos czares e que pouco a pouco ia perdendo todo tipo de direitos, como bem descreve: “não podia permanecer indiferente ou neutra”.
Quando em 1922 publicou os primeiros textos sobre aqueles acontecimentos, recebeu ataques desde múltiplos lugares e pessoas. No prólogo da primeira edição do livro comentava: “Não só minha preocupação pelo povo russo motivou a redação deste volume; se trata de meu interesse pelas massas de todos os lugares do mundo”. Aquela edição se publicou mutilada, desaparecendo 12 capítulos, que a edição de El Viejo Topo inclui agora.
Goldman falecia em 14 de maio de 1940 em Toronto (Canadá). Toda uma vida ativa. Militante de ação e de escritório, de armas e de prosa. Colaborou com o Governo republicano espanhol viajando a nosso país em plena guerra em três ocasiões. Um de seus artigos mais conhecidos foi Durruti morreu, mas vive, que publicou ao morrer o conhecido libertário.
A nova edição de Mi desilusión en Rusia é uma grata notícia. Se integra em uma ampla literatura existente dela, e sobre ela. E nos permite seguir conhecendo a uma das mulheres rebeldes mais irrefutáveis do século passado. Atual e referência então e agora.
Fonte: https://elasombrario.com/emma-goldman-mujeres-peligrosas/
Tradução > Sol de Abril
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Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!
Um puta exemplo! E que se foda o Estado espanhol e do mundo todo!
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