A cem anos da morte deste destacado intelectual e escritor, seu cru diagnóstico da sociedade peruana do século XIX tem uma surpreendente atualidade ante a crise que vivemos.
Este domingo [22 de julho de 2018] completaram cem anos da morte de Manuel González Prada (1844 – 1918) – um dos intelectuais mais destacados de nossa história – e as duras críticas à classe dirigente de sua época não perderam vigência, apesar das décadas transcorridas.
Foi uma figura sempre a contracorrente. Tendo se criado em uma família aristocrática e muito religiosa, se converteu em um dos primeiros pensadores que dirigiu suas críticas ao poder político da jovem república, à Igreja Católica e à exclusão do índio da ideia de nação.
González Prada nasceu em Lima em 5 de janeiro de 1844. Seguiu estudos no Seminário de Santo Toribio e no Convictorio [colégio] de San Carlos [hoje Centro Cultural da Universidade de San Carlos], mas sua formação foi, basicamente, autodidata. Em 1881 se alistou como combatente para defender Lima ante a invasão das tropas chilenas na Guerra do Pacífico. Tomada a cidade, é conhecida sua decisão de não sair de casa, em protesto, durante os quase três anos que durou a ocupação.
Segundo assinala o sociólogo Gonzalo Portocarrero, González Prada passa primeiro pela literatura e logo à política, motivado por sua enorme decepção após a derrota peruana na Guerra do Pacífico. Entre suas obras se encontra importantes ensaios como Pájinas libres, Horas de lucha ou Anarquía, além de poemários como Minúsculas, Presbiterianas ou Exóticas.
Em março de 1912 foi designado diretor da Biblioteca Nacional, em substituição de Ricardo Palma. Ocupou este cargo até que renunciou em fevereiro de 1914, em protesto pelo golpe de Estado de Óscar R. Benavides. Um ano depois foi recolocado no cargo pelo presidente constitucional José Pardo.
Em seus últimos anos se voltou ao anarquismo, apoiando a organização da classe trabalhadora. Sua influência foi tomada por ideólogos como Víctor Raúl Haya da Torre, José Carlos Mariátegui ou Luis E. Valcárcel. À luz da conjuntura atual, seguramente os escândalos de corrupção que envolvem o nosso sistema de justiça não o teriam surpreendido. Resulta, lamentavelmente sintomático, que suas análises sobre o Peru feitas há mais de cem anos pareçam escritas na atualidade.
No entanto, González Prada era também um idealista, alguém esperançoso na capacidade transformadora da juventude. É assim que a vigência de seu pensamento a podemos ver também na indignação e nas mobilizações cidadãs, que respondem a seu chamado no Discurso do Politeama: Os velhos à tumba, os jovens à obra!
Esperança na juventude
Jorge Valdez Morgan: Historiador e docente da PUCP
Um dos temas principais nos ensaios de González Prada é o da corrupção. Essa preocupação se deve em parte à época que viveu. O Peru estava em crise após a Guerra do Pacífico, e, nesse contexto, ele fez denúncias muito fortes sobre este mal. Sua obra pode analisar-se perfeitamente desde o presente porque o país, em geral, não mudou muito em vários dos pontos que ele criticava.
De outro lado, ele via na juventude uma esperança purificadora. Se estivesse vivo, creio que teria sentimentos contraditórios, pois essa juventude não transformou muito o país. Mas ao ver a capacidade de mobilização desde as redes sociais, sua esperança teria se mantido.
Severo crítico do ‘establishment’
Cristóbal Aljovín de Losada: Historiador e doutor em Filosofia pela Universidade de Chicago
González Prada desenvolve uma forma de pensar o Peru desde uma perspectiva muito dura contra o establishment. Na atualidade, certamente seria um severo crítico do funcionamento do Estado, da crise de corrupção no Poder Judiciário e também de como a Igreja Católica e, sobretudo as outras igrejas cristãs, interferem de forma tão forte na política.
Tanto em sua faceta positivista como em sua faceta anarquista, ele tem uma posição muito dura contra a Igreja. Creio que sua maior contribuição é, precisamente, essa postura crítica ante as instituições e estruturas de poder. É, definitivamente, um dos pensadores peruanos mais influentes do século XX.
Fonte: https://publimetro.pe/actualidad/noticia-manuel-gonzalez-prada-y-vigencia-su-pensamiento-76703
Tradução > Sol de Abril
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Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!