Houve um tempo, antes da chegada de milhares de migrantes a nossa costa em pleno século XXI, no qual os próprios espanhóis fugiam sem rumo até a outra margem da África. Desde o Sul da Europa. O pesquisador José Antonio Jiménez Cubero trouxe à luz uma história inédita. A de um grupo de anarquistas andaluzes que desesperados pelo cerco policial, esperaram em maio de 1950 que o Comitê Regional da CNT na Andaluzia organizasse sua fuga até a cidade de Casablanca.
por María Serrano | 12/05/2019
A operação estava prevista para 29 de maio, mas resultou num autêntico fracasso. Quatro daqueles maquis foram abatidos fugindo das forças policiais. Dois deles foram fuzilados, quase os últimos dos que se tem registro no cemitério de Sevilha no ano de 1952. A guerrilha se extinguia de um golpe. 75 por cento de seus membros foram eliminados. Fugiam desesperadamente em busca de uma saída.
O pesquisador sevilhano, Jiménez Cubero, narra em sua pesquisa “A funesta noite de 29 de maio: Algeciras 1950”, como “desde finais de 1949, os membros do Comitê Regional da CNT da Andaluzia estabelecido em Sevilha, tinham claro que a situação começava a ser sumamente perigosa e corriam um alto risco mas conseguiram abandonar o país”.
Antonio González Tagua, Secretário do Comitê Regional da Andaluzia recebeu uma notificação do Comitê Nacional do Exílio. “Naquele documento se indicava que a organização não poderia enviar-lhe dinheiro nem documentação por carecer de meios”. Teriam que atuar com seus próprios recursos, sem ajuda de nenhum tipo, ainda que o risco os levasse a uma morte quase certa.
A eliminação da guerrilha em 1951
No final de 1949 as guerrilhas que operavam na Andaluzia, A Fermín Galán, a Agrupação Roberto e o restante da 3ª Agrupação, estavam em sua reta final. “Praticamente todos os Comitês Comarcais da CNT (única organização que ainda apoiava as guerrilhas) de Jerez, Ubique e Cazalla da Sierra, assim como a Regional de Sevilha haviam sido desmanteladas pelas forças policiais de Franco e a maioria de seus membros assassinados ou encarcerados”.
Cubero assinala a Público [jornal] como os informes da Guarda Civil no começo de 1951 indicavam como “a situação piorava de mês a mês com a prática eliminação de suas redes de conexão e abastecimento na maior parte dos territórios onde operava”.
Os Comitês Comarcais iam caindo lentamente em cada um dos povoados onde a guerrilha tinha conseguido uma importante força. Em Cazalla da Sierra (Sevilha) “desaparecia” Manuel Soto Martín. E logo, o restante dos guerrilheiros não tardou em mobilizar-se. Jiménez Cubero recorda a Púbico como vários deles, González Tagua, Juan Caballo e Francisco Garabitas começaram a planejar a absurda “forma de abandonar o país mediante a compra de um barco que os levaria ao exterior”. O desespero daqueles dias era mais que evidente. E é que tal e como afirma o pesquisador Cubero, “as sucessivas detenções de vários de seus membros terminaram com mais de 75 por cento do movimento guerrilheiro apagado do mapa”.
O historiador José Luis Gutiérrez Molina, destaca a Público que o clima de terror que se estabeleceu naqueles anos para mitigar a esperança da guerrilha era assustador. “Quando terminavam com alguns guerrilheiros dos grupos nos montes, deixavam os cadáveres algumas horas na praça” de alguns povoados. O objetivo, era dar uma lição para aqueles vinculados que puderam ajudá-los em seu futuro na serra”. Eram os momentos finais, morreram praticamente todos. Muito poucos conseguiram salvar suas vidas. “Todos eles iam caindo em enfrentamentos ou foram detidos e executados em Conselho de Guerra. Desde o final da Segunda Guerra Mundial viram como os aliados não acabaram com a ditadura”. Tentam sair através de Gibraltar. Gutiérrez Molina afirma que esta expedição não foi isolada. “Houve uma rede de pagamento e de cartilhas de embarque com barcos que operavam no Estreito. Inclusive alguns por desespero decidiram sair a nado”.
González Tagua e o restante dos guerrilheiros utilizaram esse sistema, sem medo do que poderiam perder. A figura de González Tagua foi muito destacada. Era um lutador anarquista infatigável, não era só mais um guerrilheiro que tinham jogado ao monte ao final da guerra. Ocupou a Secretaria do Comitê Regional da CNT da Andaluzia em um tempo muito difícil. E foi condenado em Conselho de Guerra em abril de 1939 e mandado posteriormente a um Destacamento Penal de trabalhos forçados em Miraflores de la Sierra (Madrid). “Sabia o que enfrentava mas não diminuiu seu empenho de tentar dar uma saída a si e a todos os seus companheiros”.
Ante a falta de meios por parte do Comitê Central, os anarquistas González Tagua, Caballo e Garabitas começaram a traçar o plano. “Se reuniam com os companheiros escondidos em tabernas do centro de Sevilha como foi o bar El Punto, do bairro de San Julián ou na Flor de Toranzo, situado na praça de Santa Marina”. Aqueles vinculados também seriam duramente represaliados pela polícia que queria estabelecer o clima de terror de 1936. Muitos deles passaram anos na Prisão Provincial de Sevilha conhecida como ‘Ranilla’.
No mês de fevereiro de 1950, González Tagua, comunica a vários dos companheiros a necessidade de partir até a Linha para terminar de fazer os contatos e planejar finalmente a operação. Manuel Padilla, membro destacado do Comitê em Jerez, assinala a importância de um translado iminente dos membros que se encontram escondidos em Jerez até um esconderijo seguro em Sevilha.
Um erro de última hora ou uma delação?
O destino a Casablanca era recorrente naqueles anos. “Em Marrocos, tanto em Tânger como em Casablanca, havia uma nutrida colônia de republicanos exilados assim como de várias dezenas de guerrilheiros que haviam conseguido sair do país, através das diversas redes de evasão organizadas pela CNT, desde os portos de Sevilha e Cádiz”.
O dia anterior a saída, 28 de maio de 1950, “dois taxistas partem de Sevilha como agentes de ligação para o translado dos guerrilheiros”. No carro ‘Pato’ (nome em código) de sete praças, que conduzia Miguel El Gordo, condenado por esta manobra a dois anos de prisão, levaria a seu ajudante Antônio El Grifo e os guerrilheiros Juan Caballo, Juan Palacios, Dionisio Carreras e os irmãos Juan e Francisco Muñoz Bermúdez. O segundo carro, Crysler, era conduzido pelos agentes de ligação Agustín Luna López e Antonio Núñez Domínguez. Também foram condenados duramente como agentes de ligação. Nele viajariam, Antonio González Tagua, José́ Barea Reguera, Bienvenido, Juan Virgil de Quiñones, Juanito, Cristóbal Ordoñez López, Aniceto, Antonio Morillas, Francisco Páez e Francisco Garabitos Sánchez.
Os dois carros iam separados para não levantar suspeitas. E uma delação terminou de dar a pista do paradeiro das embarcações clandestinas. A operação foi assaltada antes de que alguns de seus membros pudesse embarcar rumo ao Marrocos. “Um grupo de forças da Guarda Civil aguardava apontando com as armas”. Assim que chegaram foram alvejados, Antonio González Tagua, Juan Virgil de Quiñones (Juanito), Cristóbal Ordóñez López (Aniceto) e Francisco Ruiz Borrego (O Peque). O restante foram feridos e posteriormente condenados no processo 308/50, que se encontra, nos dias de hoje, no Arquivo do Tribunal Territorial Militar Segundo de Sevilha.
Manuel Liáñez foi o único agente de ligação que conseguiu passar a Gibraltar, e os dois barqueiros contratados, dos quais não se conhece a identidade. “O restante seria detidos nos dias, semanas e meses seguintes”. Junto a eles também foram detidos e processados o dono do bar ‘El Punto’, assim como vários companheiros, vizinhos e familiares que lhes ajudaram a ocultar-se depois do fracassado embarque.
Os últimos fuzilados em Sevilha dos quais se tenha registro
José́ Barea Reguera, aliás Bienvenido, foi um dos dois guerrilheiros fuzilados em 1952, que fez parte da Agrupação Guerrilheira Fermín Galán. Antonio Núñez Pérez, Bartolo, da mesma Agrupação Guerrilheira foi um dos últimos fuzilados da cidade de Sevilha. Cubero conta que “seria fuzilado nos muros do costado direito do cemitério de San Fernando de Sevilha na quinta-feira 28 de fevereiro de 1952”.
A terrorífica maquinaria franquista julgaria também no mesmo processo a filha e mulher do guerrilheiro Juan Caballo. Carmen Caballo Granados agia como correio do Comitê Regional da CNT da Andaluzia. Detida junto a sua mãe em 23 de agosto de 1950. Foi processada e condenada a quatro anos na prisão de Sevilha. A esposa de Caballo, Isabel Granados Sánchez, teve a mesma sorte, sendo condenada a dois anos.
Socorro López Trillo, conhecida como Socorrito, era a companheira de Antonio González Tagua. É outro dos nomes que chama a atenção no Processo 308/50. Foi detida em seu domicílio em 23 de agosto de 1950, passou vários meses no cárcere sem chegar a ser processada. “Em meados de janeiro de 1951 fugiu de seu domicílio antes de ser detida de novo por sua relação com Tagua”, destaca Cubero em sua pesquisa.
Fonte: Cómo el franquismo acabó con una partida de guerrilleros anarquistas en los años 50
Tradução > Sol de Abril
agência de notícias anarquistas-ana
Folha de jornal
vem no vento ao meu pescoço;
cachecol de letras.
Anibal Beça
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!