De Bakunin a Nechayev, o movimento anarquista possui correntes diferentes e até opostas, mas o objetivo ainda é uma sociedade sem Estado e desigualdades
por André Nogueira | 28/11/2019
Uma das mais radicais ideologias de esquerda, o anarquismo visa, principalmente, o fim de todo e qualquer tipo de dominação. Críticos ferrenhos do capitalismo e do próprio Estado, os anarquistas tem como horizonte uma sociedade baseada na auto-gestão e na cooperação entre seus integrantes. Para alcançá-la, porém, teóricos do movimento discordam e concordam entre si, criando diferentes vertentes dentro da ideologia revolucionária.
Conheça alguns dos principais nomes do anarquismo no mundo.
1. Piotr Kropotkin – Anarco-comunismo
Nascido numa abastada família nobre da Rússia, Kropotkin (1842-1921) é considerado por muitos o fundador do anarco-comunismo pacifista. Geógrafo, tinha uma visão racionalista e organizada do anarquismo, em que a violência e os símbolos do anarquismo, como a bandeira negra e a caveira, deveriam ser deixados de lado.
De tendências mutualistas, o anarquista russo abominava a violência e acreditava num mundo sem desigualdades baseado na dissolução do Estado e na cooperação voluntária e mútua entre homens livres, onde o salário não seria relevante e as ações sociais se pautassem na necessidade popular.
2. Pierre-Joseph Proudhon – Mutualismo
Também ligado ao pacifismo, Proudhon (1809-1865) foi economista e teórico político que carregava uma descrença na revolução violenta, creditando a desobediência civil como método correto. Como um dos fundamentadores de termos básicos do anarquismo, (mutualismo, cooperativas de crédito e federalismo) ele foi um dos primeiros a se autodeclarar anarquista, sendo chamado de socialista utópico por Marx, de quem foi próximo.
Proudhon escreveu diversos textos sobre a propriedade privada, chegando à famosa frase “A propriedade é um roubo!”. De tendências pragmáticas, sua ideologia seguiu o objetivo de encontrar alternativas cabíveis à realidade capitalista, defendendo a criação de cooperativas e um banco operário. Entretanto, suas obras não sobreviveram as oposições do próprio movimento.
3. Mikhail Bakunin – Coletivismo
Um dos maiores nomes do anarquismo, o revolucionário russo tinha como principio norteador a noção de liberdade, onde os militantes de esquerda deveriam lutar sem cair na armadilha de se tornarem os próximos tiranos. Assim, teve uma forte desavença com Marx, seu amigo pessoal, criticando o autoritarismo da proposta socialista.
Sua principal contribuição foi a conceitualização de coletividade, que é vista por ele como elemento essencial da liberdade. Na visão coletivista, que é bastante crítica a Proudhon, indivíduo e a sociedade são categorias defensáveis e com relações, e Bakunin (1814-1876) propõe uma análise dialética que permita o entendimento da sociedade capitalista com o objetivo de destruir o Estado e a propriedade privada.
4. Lev Tolstoi – Anarquismo cristão
Entrando para a História como um dos maiores escritores da Rússia e do mundo, Tolstói (1828-1910) foi também um teórico do anarquismo. Partindo de uma teologia política, ele acreditava que a corrente, como realidade social sem desigualdades e baseada na humanização das relações, era um elemento básico para a leitura dos Evangelhos.
A singularidade do russo está na superação da esquerda cristã do século 19, que defendia o fim das estruturas sem citar alternativas, enquanto Tolstói era a favor do fim da sociedade ortodoxa com o objetivo de atingir um Governo Soberano de Deus, com princípios anarquistas. Pacifista vegano, ele entendia que um dos principais problemas da Rússia era a dominação da população civil por um Estado fundido à Igreja.
5. Errico Malatesta – Voluntarismo
Com mais de 60 anos de militância anarquista, é difícil estabelecer o pensamento conciso do autor. Um dos principais elementos necessários é: Malatesta, que era essencialmente pragmático. Não tinha o objetivo de ser um teórico da política, ele foi um importante agente político em favor de greves e insurgências na Itália.
Defensor da noção pura de anarquismo, ele defendia não só o fim do Estado, mas o fim dos governos e, portanto, da ordem padronizada. A sociedade anarquista seria baseada na ação voluntária.
Negando as correntes hiper-racionalistas e futuristas no anarquismo, Malatesta defendia que é impossível se fundamentar uma sociedade sem moral, e que ela não deveria ser um alvo em si dos anarquistas. Ou seja, mais do que querer um mundo sem moral, era necessário extinguir a moral burguesa e fundamentar uma comunidade em que todos seriam legitimados pela cooperação interna dela.
6. José Oiticica – Anarquismo no Brasil
Mais conhecido como um profissional das letras do que teórico do anarquismo, Oiticica (1882-1957) entrou para a História do Brasil por suas atuações em São Paulo em nome da melhoria da vida dos trabalhadores e a criação de uma comunidade autônoma e igualitária.
Deixou sua marca durante a Greve Geral de 1918, inspirada na Revolução Russa. Além disso, foi jornalista, dramaturgo e poeta, criando e mantendo veículos que difundiam arte e discussões políticas do anarquismo.
Oiticica também tem relevância na História da Educação, pois foi um dos principais nomes da organização das Escolas Anarquistas do ABC, em que uniu as necessidades populares dos operários a quem ensinava com os princípios da sociabilidade anticapitalista, desenvolvendo um projeto de ensino e alfabetização verdadeiramente revolucionário.
7. Sergey Nechayev – Anarquismo Niilista
Um dos nomes mais renegados do anarquismo, Nechayev (1847-1882) integrou a uma espécie de escola conhecida como Anarquismo Niilista, que ao mesmo tempo em que não via sentido inexorável em nenhuma instância da vida, também negava uma forma única e funcional de realizar uma revolução. Para ele, a ordem era: fomentar a mudança utilizando qualquer meio necessário. Ou seja, violência política e terrorismo eram opções.
8. Emma Goldman – Anarcafeminismo
Nascida na Lituânia, Goldman (1869-1940) foi uma importante fomentadora de movimentos trabalhistas na América do Norte e creditada pela relevante união entre anarquismo e feminismo. Escreveu sobre temas diversos, como o capitalismo, as prisões, liberdade de expressão, aborto e contracepção, militarismo, casamento, amor livre, educação e homossexualidade. Sempre carregava um livro consigo, sabendo da possibilidade de ser injustamente presa.
Uma das pioneiras da luta pela emancipação das mulheres nos EUA e Canadá, ela é responsável por diversos ensaios e conferências que reuniam milhares de pessoas. Nunca separou a questão de gênero da questão de classe, associando sua luta de emancipação às questões sindicais, laborais e legais.
9. Buenaventura Durruti – Anarco-sindicalismo
Esse importante sindicalista espanhol foi um dos principais líderes da esquerda durante a resistência contra Franco na Guerra Civil Espanhola, comandando milhares de pessoas numa coluna que foi o maior agrupamento militar do período.
Um exímio crítico às estruturas engessadas da esquerda e ao pistoleirismo patronal das centrais sindicais espanholas, Durruti (1896-1936) destacando-se na Confederación Nacional del Trabajo, de caráter anarquista.
Seu papel operacional ganhou destaque na formação das milícias anarquistas que colaboraram com os republicanos no combate ao fascismo. Nunca escreveu nenhum tratado sobre o anarquismo e não se dedicou a uma teoria, mas sua atuação e seu legado são reconhecidos pelos grandes anarquistas, principalmente por ser de origem humilde, trabalhar como operário e organizar a insurgência armada.
10. Nestor Makhno – Plataformismo
O importante organizador militar da Ucrânia marcou a historia do anarquismo por seu confronto direto não apenas com os czaristas e conservadores, mas também com os antigos aliados comunistas durante a Guerra Civil Russa. Contra o autoritarismo de Lenin, comandou a Revolução Ucraniana, onde, a partir dos ideais anarco-comunistas, desenvolveu uma comunidade com pretensões igualitárias.
Quando foi exilado da Rússia, durante os expurgos bolcheviques, se deu conta do nível de desorganização de sua unidade, fazendo-o refletir e estabelecer a doutrina plataformista.
Segundo Makhno (1888-1934), faz-se necessário um nível organizativo e disciplinar sério para o sucesso do projeto anarquista, ou seja, a estruturação prática militar faz parte do projeto de emancipação, em que a unidade de libertação possui coesões ideológicas e de projeto, mas alguém dita as ordens táticas. “Fazer do anarquismo na luta de classes não uma questão episódica, mas um fator relevante”.
Saiba mais sobre anarquismo pelas obras abaixo:
1. Notas sobre o anarquismo, de Noam Chomsky – https://amzn.to/37LeH1V
2. Os Grandes escritos anarquistas, de George Woodcock – https://amzn.to/37KDB1C
3. História do Anarquismo, de Jean Préposiet – https://amzn.to/37IsshV
4. Anarquismo: O que significa?, de Emma Goldman – https://amzn.to/2qTyQ5g
agência de notícias anarquistas-ana
Som do vento, apenas…
E, na árvore, uma coruja —
Início de noite.
Marco Aurélio Goulart
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!