Por Andrea Tognina | 16/02/2020
A Suíça é o berço do anarquismo. Vestígios do movimento libertário podem ser encontrados ao longo do último século e meio de história do país. Marianne Enckell, bibliotecária do Centro Internacional de Pesquisas sobre o Anarquismo (CIRA) de Lausanne, explica o que Bakunin sonhou nos anos de luta.
Em 1872, uma organização de trabalhadores denominada Federação do Jura reuniu, em Saint-Imier, no Jura Bernês, delegados de grupos antiautoritários que se opunham ao centralismo da Primeira Internacional. A “Internacional Antiautoritária” foi então fundada. Antes disso, Karl Marx tinha conseguido excluir Mikhail Bakunin e outros anarquistas da Primeira Internacional Comunista.
Qual foi a importância do congresso de Saint-Imier para a história do movimento anarquista?
Marianne Enckell: Pode-se dizer que o movimento anarquista nasceu aqui, mesmo que o encontro de St-Imier em 1872 não tenha sido propriamente um congresso anarquista. Foi um congresso antiautoritário e federalista, em oposição ao centralismo da Associação Internacional de Trabalhadores (Primeira Internacional).
Uma das mais significativas e conhecidas decisões tomadas neste congresso foi a confirmação de que o primeiro dever do proletariado deve ser a destruição de todo o poder político. No congresso, também se selou um pacto de solidariedade entre os grupos ali representados, baseado nos princípios da autonomia e do federalismo.
A ideia era que cada pessoa deveria ser autônoma e poder associar-se voluntariamente a um grupo. Um grupo poderia juntar-se a outros grupos formando uma federação, mantendo, contudo, sua autonomia em todos os níveis. A federação serviria para desenvolver contatos e deveria permitir a solidariedade em caso de greves ou insurreições. Naquela época, no entanto, não se falava de uma revolta final.
Qual foi o papel de Bakunin?
M.E.: A ideia do anarquismo já existia há 50 anos e já tinha sido desenvolvida por Pierre-Joseph Proudhon. Mas não existiam ainda grupos de anarquistas ou um movimento anarquista. O momento chave para o nascimento do movimento anarquista foi o encontro entre Bakunin e os trabalhadores da indústria relojoeira do vale de Saint-Imier.
Bakunin trazia consigo uma longa tradição como revolucionário, tinha viajado por toda a Europa e sobrevivido às masmorras russas. Ele ainda se sentia ligado ao modelo do revolucionário da primeira metade do século XIX, saído de sociedades secretas e de pequenos grupos conspiratórios.
Em 1869, Bakunin veio à Le Locle, um vilarejo localizado nas montanhas do Jura, onde deu palestras e conheceu relojoeiros que tinham começado a formar as primeiras associações autônomas de resistência. Os trabalhadores queriam se organizar, treinar e lutar por melhores condições de trabalho por conta própria.
Foi um encontro entre um teórico revolucionário e pessoas que estavam começando a ter experiências concretas de organização política. Foi uma sedução mútua. Gradualmente, o povo da região do Jura assumiu posições anárquicas, e Bakunin começou a dedicar-se principalmente às questões práticas do movimento operário.
A Federação do Jura foi de curta duração. No entanto, o movimento anarquista sobreviveu na Suíça…
M.E.: Na primeira metade do século 1920, o centro do movimento anarquista estava localizado em Genebra, onde Luigi Bertoni editava a revista bilingue ítalo-francesa “Il Risveglio/Le Réveil”, que era publicada duas vezes por semana. Antes da Primeira Guerra Mundial, o sindicalismo revolucionário também surgiu na Suíça francófona com a Federação das Uniões Trabalhadoras.
Após a guerra, formaram-se novos grupos sindicais militantes, como a Liga da Ação do Prédio, sob a liderança de Lucien Tronchet. A partir da década de 1920, porém, a luta contra o fascismo tornou-se uma das principais atividades dos anarquistas.
Em 1917 os bolcheviques tomam o poder na Rússia. Como os anarquistas reagiram a este evento?
M.E.: A Revolução Russa sem dúvida exerceu um fascínio sobre o movimento anarquista. Mas Luigi Bertoni logo advertiu sobre a nova “burocracia vermelha”. As notícias vindas da Rússia eram escassas e muitas vezes contraditórias. Mas quando se soube que os anarquistas estavam sendo expulsos da Rússia, surgiram tensões entre comunistas e anarquistas, especialmente em Genebra, onde os comunistas tinham bastante força.
No entanto, nos anos 20, via-se nos sindicatos militantes tanto comunistas como socialistas e anarquistas. Na década de 1930, durante a crise econômica, eles se uniram em oficinas autônomas de trabalho.
E durante a Guerra Civil Espanhola?
M.E.: Lucien Tronchet entregou camiões com ajuda humanitária a Espanha sendo que, debaixo dos bens humanitários, havia armas escondidas. Ele tinha numerosos contatos que lhe permitiam atravessar as fronteiras clandestinamente. Mas seus contatos espanhóis só queriam armas, não pessoas, especialmente aquelas que não estavam dispostas a pegar em armas.
É por isso que poucos anarquistas foram para Espanha. Mas há muitos outros voluntários que lutaram nas fileiras dos anarquistas. Eles relataram não somente sobre a guerra, mas também sobre mudanças sociais e sobre a revolução.
Durante a Segunda Guerra Mundial, as atividades anarquistas foram proibidas na Suíça. Qual era a situação do movimento anarquista em 1945, depois da guerra?
M.E.: Durante os primeiros anos do pós-guerra, o movimento era ainda extremamente fraco. Luigi Bertoni e o médico de Zurique Fritz Brupbacher, que eram as figuras centrais dos anarquistas germano-suíços, tinham morrido. Havia apenas algumas atividades. Um novo impulso só veio em 1968, como em outros países. Em geral, os anos 60 reanimaram o movimento com a rebelião contra a ditadura franquista e a luta pela liberdade na Espanha.
Mas estes movimentos eram diferentes dos anteriores. Eles eram ativos principalmente entre os jovens e estudantes, com menos trabalhadores e, desta vez, sem massas. A velha geração estava sendo substituída, e os anos 68 tornaram-se a nova referência. Os anos 80 também se tornaram uma referência com o punk, assim como os anos 90 com as revoltas zapatistas no México. Finalmente, seguiram-se os movimentos críticos à globalização e o surgimento da Internet.
Falamos de muitos homens nesta conversa. E quanto ao papel das mulheres no anarquismo?
M.E.: Na história do movimento anarquista, menciona-se na verdade somente duas mulheres excepcionais: Louise Michel, que lutou na Comuna de Paris, e Emma Goldmann, uma judia russa que emigrou para a América e que se engajou na causa da emancipação das mulheres. Existem outras, mas são menos conhecidas.
Virginie Barbet da cidade de Lyon, por exemplo. Ela publicou em jornais, debateu com Bakunin, e participou da campanha pela abolição da herança e do serviço militar. Durante algum tempo ela viveu na Suíça.
Também Margarethe Hardegger, que foi sindicalista e promoveu o controle de natalidade e o amor livre. Temos ainda a francesa Nelly Roussel, que se manifestou em numerosas conferências na Suíça sobre a emancipação da mulher. Foram poucas mulheres, no conjunto, mas elas existem. E hoje em dia as mulheres estão muito presentes nos movimentos anarquistas.
Marianne Enckell
Marianne Enckell é arquivista e bibliotecária do Centro Internacional de Pesquisas sobre o Anarquismo (CIRA, na sigla em francês) de Lausanne desde 1963.
Ela publicou vários estudos sobre o anarquismo, incluindo um trabalho sobre a Federação do Jura e a origem do movimento anarquista na Suíça, atualmente em sua terceira edição.
O CIRA tem um acervo de cerca de 20 mil livros, 4 mil revistas, 3 mil manifestos, além de vários manuscritos e material audiovisual sobre a história e as ideias do anarquismo.
A maior parte da documentação está em alemão, francês, inglês ou italiano, mas o CIRA também gere publicações em outras línguas.
Anarquismo Radical
O Congresso dos Anarquistas que se realizou na primeira quinzena de agosto de 1872 em Saint-Imier, no Jura Bernês, contou com a presença de várias correntes do anarquismo social internacional. Na véspera do encontro, um dos organizadores, o sindicalista do cantão de Vaud, Aristides Pedraza, enfatizou que “nada temos a ver com violência”.
Existem, contudo, indivíduos e pequenos grupos que, em nome do anarquismo, consideram legítimas certas formas de luta armada. Um dos mais conhecidos representantes suíços deste anarquismo radical é Marco Camenisch.
Militante radical e ativista ambiental, Camenisch foi condenado a 10 anos de prisão em 1980 por um ataque a bomba contra uma torre de alta tensão no cantão de Grisões. Em 1981 ele fugiu da prisão de Regensdorf.
Camenisch viveu clandestinamente até sua prisão na Itália, em 1991. Em 1993, um tribunal italiano o condenou a 12 anos de prisão por agressão e lesões corporais graves, além ações de sabotagem contra a indústria elétrica.
Em 2002, Camenisch foi extraditado para a Suíça, onde o esperavam a pena restante de 8 anos a ser cumprida, mandados de prisão por sua fuga de Regensdorf e pela suspeita do assassinato de um guarda de fronteira em Brusio, em 1989. Ele está atualmente detido na prisão de segurança máxima Pfäffikon, no Cantão de Zurique.
O Ministério Público italiano tem investigado já há vários anos alegados grupos radicais anarquistas que agem frequentemente sob o nome de Federação Anárquica Informal (FAI). Estes grupos são considerados responsáveis por vários ataques na Itália e na Suíça.
Em seu último relatório sobre segurança no país, a Polícia Federal Suíça classificou o anarquismo radical como uma ameaça à segurança do Estado.
Fonte: https://www.swissinfo.ch/por/anarquismo-na-su%C3%AD%C3%A7a_bakunin-e-os-relojoeiros/45510368
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agência de notícias anarquistas-ana
A gaveta da alegria
já está cheia
de ficar vazia
Alice Ruiz
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!
Um puta exemplo! E que se foda o Estado espanhol e do mundo todo!
artes mais que necessári(A)!
Eu queria levar minha banquinha de materiais, esse semestre tudo que tenho é com a temática Edson Passeti - tenho…