Um chamado para abolicionistas expandirem a atual rebelião para que inclua comunas, assembleias gerais e formas coletivas de poder.
Por Abolicionistas de Chicago nas Linhas de Frente
Primeiramente gostaríamos de informar que escrevemos a seguinte declaração em terras estrangeiras, terras do Conselho dos Três Fogos: das Nações Ojibwe, Odawa e Potawatomi, bem como outras muitas tribos, na colonizada parte norte do estado de Illinois. Somos um grupo de abolicionistas negros, indígenas, pardos e brancos reivindicando solidariedade militante com a luta do movimento negro por liberdade e também demandando uma escalada na diversidade de ações permitidas pelo Povo numa união de movimentos que defendam a abolição da violência anti-negra e carcerária, bem como o fim do complexo industrial prisional global.
Queremos comunicar a todos os abolicionistas e lutadores da liberdade nas ruas – ou em qualquer outro canto – para não caírem nas armadilhas do governo branco colonizador, iludindo vocês para que pensem que ele próprio vai dissolver seu regime de violência carcerária e policial contra pessoas negras em prol do “bem comum”.
Olhando para revoltas indígenas, negras e de outros povos do hemisfério sul ou revoluções sociais ao longo da história dessa nova ordem mundial, sempre foi uma estratégia dos Estados supremacistas brancos enganar as massas legalizando certas concessões (e criminalizando outras) como um meio de desmobilizar os apelos contra o Estado, contra o capitalismo ou que clamassem pela insurreição popular. Nós vimos a desradicalização de movimentos acontecerem nos anos 60 e novamente nos anos 70. Mesmo naquela época não era apenas o COINTELPRO (Programa de Contra Inteligência) e a repressão sem precedentes históricos que destruiu o movimento pela Libertação Negra, foram também esforços de uma sociedade colonizadora para recuperar território bem como para acabar com a revolta proletária através do reformismo dos (frequentemente carcerários) “Direitos Civis” e da existência de um complexo industrial de organizações sem fins lucrativos (financiadas por fundações).
Quando o Povo começa a ser desmobilizado, quando a iminente tempestade de insurreição recua de volta para as águas frias dum pacifismo unicamente americano, esses colonizadores sempre dão um jeito de re-estabelecer o mesmo regime de violência que permitia seu domínio supremacista anterior. Existe um famoso ditado que diz que “Aqueles que fazem revolução pela metade cavam suas próprias covas”. Diante do processo revolucionário que estamos vendo emergir nos Estados Unidos e noutros estados policiais fascistas pelo mundo, façamos nosso melhor para não cavar nossas próprias covas.
É completamente razoável assumir que o governo ocupante permita algumas reformas para dividir e desmobilizar o Povo. Nós imaginamos que se eles de fato estão para “cortar o financiamento” ou “dissolver” a polícia, então veremos muito em breve a intensificação de fascistas organizados em grupos paramilitares ou exércitos privados formados com intuito de conservar os aparelhos opressivos fundamentais. Afinal de contas, essa têm sido a função central das milícias de cidadãos brancos e ordens fraternais pelo menos nos últimos duzentos anos, a partir das quais hoje temos – não graças aos reformistas – A POLÍCIA.
Vemos isso acontecer principalmente se o Povo não força o governo a transferir todas as armas para o Povo. E certamente acontecerá se o Povo não se armar enquanto despende esforços meticulosos para que a guarda nacional e a polícia estadual sejam convencidas a não só recuar como também juntarem-se a nós, ou então se prepare para a escalada de uma coalizão de militantes no movimento que visem abolir o complexo industrial prisional. Nós queremos ABOLIÇÃO JÁ! Como isso vai ocorrer cabe ao Povo decidir, mas é de vital importância que o Povo não se desmobilize sob nenhuma circunstância. Não parem de comparecer e marchar juntos. Solidariedade significa ataque! Continuem cansando o aparato opressivo e dessa forma fornecendo cobertura para que uma organização mais libertária se desenvolva.
Toda vez que uma concessão é feita (real ou não), esse é o exato momento para nos aprofundarmos, para enfiarmos nossas facas ainda mais fundo na garganta do fascismo, como uma vez disse George Jackson, e avançarmos para além dos horizontes existentes que imaginamos serem os únicos possíveis.
No contexto colonizador dos EUA, os meios de poder devem ser colocados nas mãos dos negros, pardos e indígenas, queers e pessoas com deficiências, e nas de todos os sobreviventes da violência do Estado, através dos órgãos latentes de poder popular: assembleias populares em massa. Foram nessas assembleias que começamos a falar menos a partir dum ponto de vista de “demandas” e mais partindo de uma mentalidade de (re)apropriação alheia a qualquer permissão de instituições anti-negras coloniais. Das prisões à polícia, da Administração de Fiscalização de Drogas ao Departamento de Imigração, do FBI à CIA, a todos os oficiais de comando e policiais defendendo a violenta farsa da “democracia representativa”. Nós não precisamos negociar com essas forças de ocupação uma vez que, em primeiro lugar, nunca consentimos com elas.
Além disso, precisamos lembrar que uma das causas fundamentais da sociedade carcerária é nossa programação anti-negra, nossa construção de relações de raça e gênero, e a sociologia de uma humanidade dividida entre espécies e classes.
Nós somos divididos entre aqueles que fazem as regras e aquele que não as cumprem. Precisamos eviscerar essa divisão da humanidade para restaurar e avançar. E vemos perigo real também na complacência do ato de desistir da nossa autodeterminação sem ao menos pensar a respeito disto.
Então incitemos a nós mesmos para nos aprofundarmos em nosso abolicionismo, criando assim um diferente conjunto de nossas demandas por: criação de assembleias populares revolucionárias, cooperativas de trabalhadores e comunas (ou caracoles) em cada quarteirão e em cada rua de cada quebrada. Pela falta de um termo mais apropriado, dizemos que este é um aprendizado coletivo sobre democracia direta: a conversão das pessoas de seguidoras de ordens passivas e isoladas numa base coletiva para a criação e administração social através de uma harmonia horizontal e federada, com assembleias por todo o país.
À medida que as assembleias amadurecem, sugerimos que elas:
• Formem uma federação e declarem-se o único poder nas terras que habitam.
• Armem o Povo, especialmente mulheres e pessoas queer que sejam negras ou pardas.
• Exijam a dissolução das prisões, a dissolução da polícia e do exército permanente com a transferência de todas as armas para a autoridade das comunas e caracoles.
• Proclamem a expropriação dos capitalistas e das riquezas do Estado, incluindo todos os prédios, terras e recursos sendo postos sob a autoridade das comunas e caracoles.
• Exijam a demissão de todos os gerentes nos locais de trabalho governamentais, corporativos ou sem fins lucrativos, transferindo todas as funções administrativas para os trabalhadores organizados em cooperativas.
Para sermos claros: perdoamos de todo o coração toda e qualquer forma de revolta e insurreição contra a anti-negritude global, supremacia branca, colonialismo, capitalismo e patriarcado heteronormativo. Além disso é necessária uma consciência de solidariedade proletária que se faça deliberadamente antipatriótica e oposta a todas as formas do nacionalismo estadunidense.
De forma alguma isso desviaria a energia das mobilizações correntes. Assembleias vão, de fato, dar mais legitimidade às nossas visões abolicionistas, adicionar uma base social forte e servir como catalisadoras. O ensino e o aprendizado das práticas abolicionistas podem também começar a criar raízes mais firmes em espaços públicos através dessas assembleias. Nós não fazemos coisas como abraçar policiais e esperamos que nessas ocasiões eles apareçam para nos intimidar. Pois então cantemos coletivamente “FUCK 12!” (“foda-se a polícia”) a medida que planejamos a remoção deles das nossas quebradas.
Também é preciso demandar um cuidado especial contra capitalistas e organizações sem fins lucrativos que estão esvaziando muitas de nossas pautas, muito cuidado com eles que têm um histórico de chamar policiais durante nossos movimentos e que hoje trabalham de mãos dadas com a polícia para controlar o descontentamento de outras pessoas, bem como para nos dividir entre manifestantes “bons e maus” sem nenhum sentimento de solidariedade em seus corações, embora também estejamos conscientes de como os supremacistas brancos estão de certo empreendendo tentativas de sabotar marchas e protestos para ferir pessoas não-brancas. É importante continuar a construir relações para que saibamos distinguir os reais infiltrados dos reais revolucionários.
É vital que iniciativas sejam criadas independentes ao capitalismo ou às organizações sem fins lucrativos. Os trabalhadores bem-intencionados que conhecemos nas organizações sem fins lucrativos eventualmente se juntarão a nós a medida que traçarmos um caminho independente. Devemos também advertir contra a falta de iniciativa independente entre os combatentes da liberdade, antigos e novos, de marchar sem permissão (fácil de fazer em Chicago sem repercussões), a falta de iniciativa para construir novas relações nas ruas, para recrutar, e a complacência de alguns que temem enganar o patrão, faltando ao trabalho para manter uma transformação social positiva em curso.
Não se deixem desmoralizar por nenhum intervalo ou calmaria. Desmoralização e inércia nunca nos trouxeram nada de bom. Tomem a iniciativa!
Esse é o trabalho vigilante e construtivo que achamos aguardar os abolicionistas e outros revolucionários, independente do governo fazer concessões às nossas demandas ou das assembleias forçarem esse mesmo governo através de decretos e do uso da força.
Nós estamos avançando nesse trabalho, que é lentamente ganhar espaço, e vamos abraçar cada um de vocês nas ruas, parques e através das mídias digitais. Cada um tem um papel a desempenhar nessa jornada. Essa é uma luta na base.
Não parem!
Libertem os prisioneiros!
Juntem seus povos!
Vida longa às comunas e aos caracoles!
Abolição JÁ!
Chicago, Illinois, EUA
8 de Junho de 2020
Tradução > AnarcoSSA
agência de notícias anarquistas-ana
Um solzinho fraco
Ilumina
O campo seco.
Bakusui
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!