A 85 anos da revolução social no território espanhol queremos recordar as práticas que se originaram naquele processo revolucionário, sobretudo quando as pessoas escutam sobre anarquismo, costumam pensar que é origem do caos ou que as ideias que se promovem não podem se estabelecer como base para uma sociedade dada a visão homogênea que se tem da estrutura organizativa proveniente desde o Estado.
A implantação das ideias anarquistas nas diferentes seções obreiras de 1936 não se pode compreender sem antes mencionar, por exemplo, a chegada do anarquismo a Espanha através de Giuseppe Fanelli pelo ano 1868 e cuja missão era organizar uma seção na Espanha para a Primeira Internacional. Isto implicou em sentar as bases para a criação de um sindicato revolucionário. Assim como também, a Escola Moderna de Francisco Ferrer, a fundação da CNT em 1910 antecedidos pelos acontecimentos da Semana Trágica, sua ilegalidade em dois períodos 1911-1913 e 1923-1930 na ditadura de Primo de Rivera ou, os acordos dos diferentes congressos celebrados, 1919, 1931 ou 1936.
A revolução social espanhola de 1936 foi um processo revolucionário cuja base foi o anarcossindicalismo, associada principalmente a Confederação Nacional do Trabalho (CNT) a qual contava com aproximadamente 1.600.000 militantes e a Federação Anarquista Ibérica (FAI). O processo revolucionário se caracterizou pela horizontalidade como base organizativa, anticlerical, coletivização autogestionária (comunismo libertário).
O ponto de inflexão se enquadra no dia 17 de julho de 1936 quando se produz um Golpe Militar no lado Espanhol de Marrocos e que no dia seguinte havia se estendido por grande parte do território espanhol. No entanto, tanto nos povoados e cidades haviam se organizados os trabalhadores para fazer frente, o que resultou não só ser uma resistência ao Golpe Militar, mas que foi o princípio de todo um processo pela tentativa de mudar a sociedade e as relações tanto no social como no econômico.
Para o dia 19 de julho de 1936, tanto mulheres como homens pertencentes à CNT, FAI e as Juventudes Libertárias de Barcelona e toda Catalunha, os quais já estavam na rua desde o dia anterior defendendo-se dos fascistas, se levantam e proclamam o seguinte: “Chegou a hora de dar tudo, acabar com a reação e tudo o que representa, de que mude o estado das coisas e levar nosso sonho tão adorado, a revolução social que por fim nos libere de toda tirania. Já não haverá pobres nem ricos, nem privilegiados, será o povo que dirija seu próprio destino de maneira livre… Viva a CNT, Viva a FAI! Viva a Revolução!”.
Estes levantes foram se prologando por diferentes territórios de Espanha e tão logo os fascistas foram derrotados durante as primeiras semanas, se estabelece dois posicionamentos e a convivência por um lado de grupos revolucionários anarcossindicalistas entorno às finalidades do anarquismo clássico e outros grupos, os quais viam dentro do possível trabalhar com o regime da segunda república.
Posteriormente, surgem organizações à margem do Estado, que tem um caráter local cuja deliberação é em assembleias horizontais para tratar temas pontuais do território que as convoca e ao mesmo tempo, estas vão se federando a nível regional e nacional. As milícias libertárias assim que vão avançando na proteção de territórios, nas cidades e zonas rurais as fábricas foram ocupadas pelos obreiros, sob a influência principalmente da CNT e da FAI, a qual foi a implantação da coletivização e da prática do comunismo libertário.
Se desenvolveu a prática do comunismo libertário como a base da economia, onde o controle estava associado a trabalhadores organizados pelos sindicatos, principalmente em áreas anarquistas como Catalunha, se chegou a 75% do total da indústria. As áreas agrícolas chegaram a coletivizar-se e funcionaram como comunas libertárias. Em outros territórios, o dinheiro foi totalmente eliminado e os bens se encontravam a um custo muito menor do que tinha anteriormente e inclusive as indústrias produziam mais que antes de serem coletivizadas. Um dos maiores exemplos das indústrias coletivizadas foi a Cinematográfica, Madeira, Agrária, Hotelaria, Pesqueira, Transporte, Têxtil, etc.
Enquanto a ordem pública chegou a eliminar as forças de ordem pública clássicas (Polícia, Guarda Civil, tribunal e exército). Estas foram substituídas pelas Patrulhas de Controle formadas por voluntários, as milícias populares e as assembleias de bairro nas quais se pretendia resolver os problemas que pudessem surgir.
Na educação, aconteceram experiências importantes ao ser entendida como um pilar fundamental da construção da nova sociedade revolucionária com base no racionalismo e cuja prática é a pedagogia libertária. Por exemplo, os ateneus libertários que já tinham uma tradição dentro do anarquismo, chegou a expandir-se a tal ponto de transformarem-se em escolas primárias, secundárias, de ofícios, bibliotecas, atividades recreativas cuja participação ultrapassou as diferentes seções obreiras que não necessariamente tinham tradição de participar destes espaços ou da afinidade anarquista. Nas escolas de ofícios se formavam as pessoas a respeito de diferentes ofícios particulares.
A organização anarquista Mujeres Libres, a qual nasceu em abril de 1936 e que se preparava para publicar uma revista dedicada à cultura e documentação social, contou com cerca de 20.000 filiadas na revolução social e a qual propôs pela primeira vez na Espanha a problemática da mulher desde uma perspectiva de classe, quer dizer, a liberação feminina desde a perspectiva da emancipação obreira e cuja organização era a defesa das mulheres anarquistas frente às demais organizações feministas de diversas tendências políticas que surgiram na mesma época. Esta organização foi um precedente para o âmbito anarquista da região espanhola em tensionar e levantar campanhas sobre a mão de obra feminina nos diferentes ofícios ou inclusive nos trabalhos em torno ao processo revolucionário. Ademais, levantou discussões sobre a sexualidade, o lar, a pedagogia libertária para crianças e inclusive o mal entendimento dos companheiros de luta na questão dos postos de Trabalho.
Não obstante, o processo revolucionário tinha uma diversidade de agrupações com diferentes ideologias, além do anarquismo, estavam as correntes marxistas revolucionárias ou marxistas pró-estado estabelecidas desde a união soviética, grupos antifascistas, etc., por isso, os desenvolvimentos e avanços das práticas anarquistas eram constantemente assediadas e enfrentadas por estas outras correntes. Os anarquistas entendiam que a revolução era produzida por uma série de fatos prolongados através do tempo e que tinha sua relação na luta de classes, ainda quando se derrotara os fascistas e reestabelecia a república seguiria sendo um governo burguês e não deviam defender esse caminho. As agrupações marxistas e de esquerda especialmente o partido comunista espanhol (PCE) e o partido socialista espanhol (PSOE) relacionado ao Governo da frente popular não o viam assim, só queriam o restabelecimento da república.
Em consequência, ainda quando todos estavam combatendo o fascismo de Franco, em muitas situações as milícias anarquistas e coletivizações das indústrias, especialmente as fábricas rurais que praticavam o comunismo libertário, encontraram a traição no marxismo. O campesinato era assaltado, escolas libertárias eram tomadas por milícias do partido comunista, zonas agrárias liberadas e coletivizadas eram assaltadas e apropriadas em “nome da revolução” ou outros contrarrevolucionários, entregavam às milícias antifascistas, anarquistas ou anarcossindicalistas às milícias fascistas. O caso mais emblemático das traições por parte dos comunistas autoritários foi o POUM, organização declarada como marxista revolucionária foi traída por seus próprios “camaradas” de ideologia.
Entre estas situações levaram alguns anarquistas a tomar decisões muito ao contrário de sua postura ideológica, a qual também teve acaloradas discussões internas e enfrentavam a ideia de manterem-se firme à margem do Estado ou bem, participar dentro do Governo. Juan García Oliver, Juan López Sánchez, Federica Montseny e Juan Peiró participaram como ministros do segundo Governo da Vitória com a finalidade de que o Anarquismo fosse uma parte presente entre as decisões tomadas sob a estrutura do Governo Popular, a qual não se teve êxito. Durante esse mesmo mês, a coluna de ferro (milícia anarcossindicalista) decide tomar Valência em protesto pela escassez de provisões que lhe proporciona o Comitê Executivo Popular que naquela ocasião já estava sob a subordinação do Governo e este fato termina em enfrentamentos nas ruas entre milícias libertárias e grupos do partido comunista com mais de 30 mortos.
Esse mesmo mês, a Coluna Durruti chega a Madrid, depois de ceder ante a pressão dos possibilistas exigindo colaboração com o Estado e em 20 de novembro de 1936 Durruti morre em estranhas circunstâncias combatendo na batalha de Madrid.
Já ao finalizar o segundo Governo da Vitória, todas as milícias pertencentes à revolução haviam sido dissolvidas para que integrassem obrigatoriamente o Exército Popular, a qual estava estruturada e hierarquizada pelo Governo e o Estado.
Daqui em diante se desencadeiam uma série de fatos lamentáveis para a revolução. O partido comunista e os marxistas já fortemente posicionados no Governo (novembro de 1936) aplicaram muitas mudanças que foram apagando a revolução. Em dezembro desse mesmo ano, em Moscou publicavam que havia começado “a depuração” de anarcossindicalistas na Catalunha, já em janeiro de 37 o Governo sentencia a proibição do jornal da FAI e esta termina excluída dos tribunais populares. O governo lança um decreto que ilegaliza as coletivizações. Em agosto de 1937 se proíbe a crítica à URSS. A décima primeira divisão comunista autoritária arremete contra diversos comitês revolucionários e finalmente se suspende a publicação anarcossindicalista Solidaridad Obrera. Portanto, a revolução social, principalmente de base anarcossindicalista além de ter que lidar com os fascistas, tinha que lidar com os contrarrevolucionários da corrente comunista autoritária e do marxismo.
No entanto, frente a todas as adversidades a revolução social da Espanha pode desenvolver e pôr em prática os princípios e finalidades do anarquismo, as quais é sempre um marco recordar e estar em constante tensão as vivências de cada território onde nos posicionamos, abraçamos a organização e a luta.
Que viva a revolução espanhola como um símbolo de exemplo em nossa luta atual!
Saúde e Anarcossindicalismo!
Sindicato Ofícios Vários Santiago
Tradução > Sol de Abril
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Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!