Por Lisa Hofmann-Kuroda
Para as anarco-feministas, a luta contra o patriarcado é uma parte inerente da luta pela abolição do estado e do capitalismo, já que a própria estrutura do estado é patriarcal.
Apesar de haver um histórico global e muito rico de pessoas de cor e/ou movimentos anarco-feministas, dentro dos Estados Unidos não é estranho que espaços anarquistas sofram com grandes pontos cegos quando trata-se de raça e gênero. Sabendo que o anarquismo, ainda mais do que o socialismo e o comunismo, explicitamente denuncia qualquer forma de hierarquia em organizações políticas, é especialmente irônico quando homens brancos anarquistas falham ao reconhecer as maneiras com as quais eles reproduzem hierarquias ao participar de dominações de raça e gênero contra camarades.
Aqui vai, então, uma breve introdução ao anarco-feminismo, resumidamente definido como um movimento filosófico e político cujo objetivo não é somente abolir o estado capitalista, mas também todas as formas de dominação do patriarcado. Anarco-feministas não separam os propósitos do feminismo e do anarquismo; aliás, elas vêem o feminismo (na sua forma real) como uma forma de anarquismo e vice-versa. Para o anarco-feminismo, a luta contra o patriarcado é inerente à luta pela abolição do estado e do capitalismo, já que a própria estrutura do estado é patriarcal.
Em um manifesto intitulado “Anarcho-Feminism: Two Statements“, as autoras ressaltam: “nós acreditamos que o movimento revolucionário das mulheres não deve imitar, mas destruir todos os vestígios da estrutura de poder dominada por homens, o estado em si, com todo o seu aparato arcaico e sombrio de prisões, exércitos e roubo à mão armada (taxações); com todo assassinato que ele traz, com a sua legislação grotesca e repressiva e atentados militares, internos e externos, que interferem na vida privada das pessoas e de livres associações que vivem por sua conta e risco.
Abaixo, listamos algumas mulheres e grupos anarco-feministas, tão históricos quanto presentes, para te introduzir ao tema:
Emma Goldman (1869-1940):
Muitas vezes chamada de mãe do movimento anarquista moderno, Emma Goldman nasceu em uma família judia onde hoje fica a Lituânia (parte do império russo na época), em 1869. Em seguida, emigrou para os Estados Unidos. Diferentemente dos seus contemporâneos, Goldman não apoiava o movimento sufragista, já que ela acreditava que ele só servia aos interesses capitalistas de alguns burgueses e mulheres brancas de classe média. Ela foi uma grande defensora da autonomia das mulheres sobre seus corpos e foi presa diversas vezes por distribuir ilegalmente contraceptivos.
He Zhen (1884-1920):
何震 (pseudônimo que significa “trovão”) foi uma anarco-feminista chinesa que escreveu manifestos e ensaios sobre a exploração da mão de obra de mulheres e sobre a necessidade de reverter o sistema patriarcal e capitalista. Ela se politizou em Tóquio por volta da virada do século, quando muitos jovens anarquistas chineses estavam se reunindo e publicando suas ideias. Seu ensaio “On The Question of Women’s Liberation” (Sobre a questão da libertação das mulheres), de 1907, é aberto pela declaração de que “por milhares de anos, o mundo tem sido dominado pela regra dos homens. Essas regras são marcadas por distinções de classe sobre as quais homens, e somente homens, possuem direitos de propriedade. Para corrigir esses erros, devemos primeiro abolir a regra dos homens e introduzir igualdade entre os seres humanos, o que significa que o mundo deve pertencer igualmente a homens e mulheres.
Suga Kanno (1881-1911):
管野須賀子 uma anarco-feminista japonesa, Suga Kanno foi jornalista e escreveu inúmeros artigos sobre a opressão das mulheres no Japão e no resto do mundo na virada do século. Em um cenário de crescente fascismo e do governo imperialista no Japão, que promoveu medidas cada vez mais brutas contra as facções anarquistas e socialistas, Suga chegou à conclusão de que violência tática e, eventualmente, uma revolução violenta eram uma necessidade inevitável. Ela acabou por ser sentenciada à morte em 1911 depois que a polícia de Tóquio descobriu que ela e diversos outros anarquistas estavam planejando assassinar o imperador do Japão.
Lucy (Gonzalez) Parsons (1853-1942):
Uma mulher de ancestrais negros, indígenas americanos e mexicanos que nasceu sob escravidão (provavelmente onde hoje é o Texas), no final do século XIX, Parsons foi uma anarquista e organizadora dos trabalhadores muito prolífera. Ela ajudou a fundar o IWW (Industrial Workers of the World), uma união internacional de trabalho fixada em Chicago, Illinois, que continua a lutar pelos direitos dos trabalhadores até hoje em dia. Seu trabalho era focado em ações revolucionárias a favor dos presos políticos, de pessoas de cor, mulheres e dos sem teto. Ela também trabalhou incansavelmente para defender os direitos dos ativistas do trabalho e afro-americanos que tinham sido injustamente acusados pelo sistema legal, como foi o caso do Scottsboro Five.
Luisa Capetillo (1879-1922):
Uma organizadora de trabalhadores em Porto Rico, Luisa Capetillo foi uma escritora e anarquista de descendência espanhola e italiana cujo foco era organização de trabalhadores de fábrica da indústria do tabaco primeiro em Porto Rico e depois na cidade de Nova Iorque, onde ela contribuiu com a organização dos trabalhadores do ramo do tabaco, imigrantes de Porto Rico e Cuba. Ela também defendia os direitos das mulheres porto-riquenhas ao voto e ajudou a passar a lei do salário mínimo na assembleia governamental de Porto Rico. Ela foi presa em 1919 por ser a primeira mulher a vestir “roupas masculinas” em público.
Mujeres Creando:
Fundado em 1992 por duas mulheres bolivianas assumidamente lésbicas, o Mujeres Creando é um coletivo contemporâneo anarco-feminista que participa de ações diretas, teatros de rua e produção de propaganda com um viés anti-pobreza.
As fundadoras do grupo começaram a conceber o projeto durante o final de 1980 como resposta ao que elas percebiam como um uma cultura boliviana de esquerda totalitária, anti-feminista e homofóbica.
Em 2001, o grupo ganhou atenção do mundo todo quando se fez presente na ocupação da Autoridad de Supervisión del Sistema Financiero (ASFI), uma agência financeira que enganava as pessoas, fazendo com que elas assumissem dívidas sem que pudessem ler ou compreender, sendo assim extorquidas. As anarquistas ocuparam o prédio com dinamite e coquetéis molotov, exigindo o completo cancelamento das dívidas para seus devedores.
Tradução > Calinhs
agência de notícias anarquistas-ana
Frases compostas
no sol que passeia
sob minha caneta.
Jocelyne Villeneuve
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!