Em 28 de fevereiro de 2023, ocorreu uma colisão frontal entre dois trens na região da Tessália, na Grécia, matando pelo menos 57 pessoas, tornando-se o desastre ferroviário mais mortal da história grega.
E desde o início uma onda de indignação foi sentida em todo o país. Protestos e manifestações são realizados diariamente, sendo alguns deles os maiores dos últimos tempos. Especialmente massiva até agora foi a de 8 de março, quando uma greve nacional de 24 horas coincidiu com manifestações de mulheres. De acordo com diferentes estimativas, havia entre 60.000 e 100.000 pessoas na cidade de Atenas apenas naquele dia, com mobilizações em mais de 80 outras cidades gregas.
A reação do Estado e de seus lacaios meios de comunicação de massa foi a esperada – muita repressão policial contra os manifestantes, enquanto a mídia leal ao partido governista de extrema-direita Nova Democracia tenta omitir o elemento sistêmico que levou a tragédia e colocar toda a culpa nos funcionários ferroviários. Esta é uma tática bem conhecida que eles também empregaram no passado.
Existem vários componentes sistêmicos que levaram a esse desastre. Por um lado, destaca-se a recente privatização por parte do operador privado Hellenic Train. Por outro lado, havia a corrupção e lentidão da burocracia estatal grega que, mesmo após a privatização, manteve a gestão da infraestrutura por meio da estatal OSE. E todos esses fatores pioraram muito depois de anos de austeridade imposta pelos tecnocratas da UE e pelo FMI.
Enquanto as burocracias estatais e privadas deixaram em decadência esta crucial infraestrutura pública, apesar do aprofundamento da crise social e ambiental, havia trabalhadores que alertavam há muito tempo para as más condições do sistema ferroviário. Eles têm tomado diversas ações para evitar a tragédia que se aproxima, como entrar em greve para exigir melhorias na segurança. Mas sem sucesso, pois a administração não estava disposta a ouvir.
E é exatamente isso que frustra a sociedade grega: o perigo era conhecido há muito tempo, mas os poderosos tinham outras prioridades. E este é o principal problema de todas as esferas da vida moderna – elas são estruturadas de tal forma que retiram qualquer poder de decisão daqueles diretamente envolvidos e afetados, tanto no nível social quanto ecológico, e o transferem para pequenas elites gerenciais, que só se preocupam em lucrar e manter sua posição privilegiada. No mínimo, este caso da colisão ferroviária nos mostra que se os trabalhadores pudessem tomar e implementar decisões – sem a aprovação de burocratas gerenciais ou investidores privados – então a tragédia provavelmente seria evitada.
A burocracia, em todas as suas formas (incluindo a capitalista dominante!) é, como David Graeber insistiu em seu livro “Utopia das Regras”, uma forma de organizar a estupidez, já que ela se caracteriza por estruturas imaginárias extremamente desiguais, que existem por causa da violência estrutural. A todo momento, vemos o quão disfuncionais são as burocracias do Estado e privadas: entre outras coisas, elas nos levaram a um desastre climático de caráter existencial.
Felizmente, existem vozes, como as do coletivo político Aftenergeia, que defendem uma alternativa muito necessária às formas dominantes de gestão e propriedade; aquele que está enraizado na autogestão e socialização popular. Uma baseada nos próprios trabalhadores, por meio de assembléias, que administram o funcionamento dessas infraestruturas cruciais, enquanto a sociedade em geral contribui por meio de comitês populares. Este é um modelo muito mais racional que dará poder àqueles cujas próprias vidas dependem dele. Nada menos que colocar na prática o slogan “Vidas acima do Lucro”.
Não podemos ter ilusões: isso não pode ser feito dentro dos parâmetros do complexo Capital-Nação-Estado. Uma grande mudança social é urgentemente necessária, baseada na igualdade política total e na participação direta, que requer ir além da política e do capitalismo. E essa mudança só pode surgir a partir de mobilizações populares e auto-organização – como a que temos visto desde a mortal tragédia ferroviária de 28 de fevereiro.
Cabe ao povo decidir se vai alterar a situação atual ou vai permitir que um sistema completamente falido nos leve a um colapso social e ecológico.
Yavor Tarinski
Tradução > Contrafatual
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Anibal Beça
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!