O futuro da nossa corrente: carta aos lutadores do povo e militantes revolucionários

Por Antônio Galego

“Podem estar certos de que o trabalho não será perdido — nada se perde neste mundo — e as gotas de água, por serem invisíveis, nem por isso deixam de formar o oceano.” Mikhail Bakunin

A situação política nacional teve mudanças significativas na última década. Há dez anos atrás estávamos na véspera da insurreição popular de junho de 2013, num contexto social e político explosivo, em que uma semana valia mais que um ano. Desde então houveram mudanças gerais nos agrupamentos das classes e na correlação das forças políticas no Brasil. Vivemos hoje a maior crise da classe trabalhadora e do socialismo desde a redemocratização, uma situação de isolamento e fragmentação que não atinge apenas as organizações anarquistas mas também todas as forças socialistas autênticas, somadas à diminuição desde 2016/2017 do número de greves (série histórica do Dieese) e de ocupações de terras (CPT) e ao fortalecimento do autoritarismo estatal e da exploração dos trabalhadores (seja em seu modelo conservador ou desenvolvimentista). Enfim, vivemos uma situação histórica de defensiva do proletariado.

Nos dirigimos aqui aos velhos e novos militantes que ainda se mantém firmes nas ideias socialistas revolucionárias e na luta classista. Nosso objetivo aqui é apresentar um balanço do último período, tendo como base a experiência em organizações que ajudamos a construir, em especial a UNIPA (União Popular Anarquista) e a FOB (Federação das Organizações Sindicalistas Revolucionárias do Brasil), com base também em análises de conjuntura e das diferentes tendências do movimento de massas. A partir disso pretendemos traçar linhas gerais para a retomada de uma atuação classista e revolucionário. Não haverá futuro se não entendermos nosso passado, onde estão os acertos e erros, não só aqueles que viveram e que acumularam cicatrizes físicas e emocionais, mas também aos jovens militantes.

De onde viemos? De uma trajetória de duas décadas de militância no Distrito Federal, que passam pela formação do MPL (com participação no encontro nacional de 2006, organização de protestos, trabalho de base, etc.), os encontros contra as reformas neoliberais e a formação da Conlutas, intervenção e ruptura com a Conlutas, fundação e expansão da RECC (Rede Estudantil Classista e Combativa), participação das jornadas de 2013, fundação e estruturação da FOB, e uma militância de linha bakuninista desde 2007 através da UNIPA. Não se trata de listar esses fatos como argumento de autoridade, isso seria ridículo (deixamos isso aos vaidosos e pós-modernos do “lugar de fala”), mas ressaltar que as reflexões que seguem são frutos de uma militância real, anônima e compromissada com a causa do povo.

Pensada coletivamente, essa trajetória do início dos 2000 até mais ou menos 2017 apresentou uma certa constância e evolução, quantitativa e qualitativa, com o crescimento nacional do bakuninismo e de uma corrente sindicalista revolucionária, basicamente por conseguir dar respostas corretas às conjunturas e problemas concretos enfrentados nacionalmente e localmente no trabalho militante. O auge da atuação bakuninista foi no levante de 2013. Mas ao longo do governo Temer, e relacionado a um refluxo das lutas que vem desde então, os erros e desvios (políticos, teóricos e organizativos) ficaram cada vez maiores até que se tornarem insustentáveis durante os anos de pandemia e de governo Bolsonaro. As organizações UNIPA e FOB não são mais aquelas que nos doamos de corpo e alma na primeira década dos anos 2000.

Assim, se por um lado partimos da experiência em organizações concretas, e faremos aqui um balanço de seus erros e acertos, por outro não nos limitamos a elas. Essa não é uma carta à UNIPA e a FOB nem aos seus membros. É uma carta aos socialistas revolucionários de forma geral, sobre a crise e o futuro da nossa corrente. E, se, por muitos anos disputamos internamente essas organizações, e desde a nossa ruptura permanecemos em silêncio, achamos que agora é hora de romper esse silêncio, o contexto político exige um posicionamento.

Entendemos nosso esforço com pé no chão, sabemos de nossas limitações (orgânicas e conjunturais), não temos a pretensão de dar resposta sobre tudo, sabemos que o desafio é do tamanho do problema. Nosso esforço é apenas uma parte que se junta a outros esforços valorosos que estamos acompanhando com atenção, que se não estão em completo acordo conosco, perseguem com algumas diferenças o mesmo objetivo ou respondem a inquietações e perguntas muito similares às nossas. Diante do contexto atual, o dever básico dos revolucionários é não se desesperar, lamber a ferida, aprender com os erros e recomeçar a luta.

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agência de notícias anarquistas-ana

E tu, aranha
como cantarias
neste vento de outono?

Matsuo Bashô