Como a história do conservadorismo estadunidense nos ajuda a entender a marcha da Unite the Right em Chralottesville, assim como o fenômeno “anarcocapitalista” no Brasil.
Por Eduardo Migowski, no Voyager
Você pode ignorar a realidade, mas não pode ignorar as consequências de ignorar a realidade. (Ayn Rand)
O mundo assistiu paralisado às imagens dos protestos de grupos de extremistas na pacata cidade Charlottesville, no estado da Virgínia. A impressão era que a caixa de Pandora havia sido aberta. Grupos que pregavam a supremacia branca, suásticas nazistas, cruzes incandescentes, bandeiras dos confederados e do Tea Party. A imagem da Ku Klux Klan, antes desbotada pelo tempo, agora aparece colorida.
“Eu sou nazista, sim!”, gritava um homem. Essa frase estampou a manchete de vários jornais, deixando os leitores incrédulos. A intolerância e o ódio tornaram-se motivo de orgulho, de autoafirmação. Os casos particulares também chamam a atenção. Um jovem de 20 anos acelerou em direção a uma multidão, matando uma mulher e deixando outros 19 feridos. Outro garoto viajou mais de 4 mil quilômetros para participar do protesto. Todos jovens, todos com pouca experiência e pouca vivência. Mas todos cheios de certezas e em busca de justiça. Mas uma pergunta ficou sem resposta: justiça em relação a quê?
Os protestos foram convocados inicialmente para impedir a remoção da estátua do general Robert Lee. Lee comandou o exército da Virgínia do Norte durante da Guerra Civil americana. Nesse ponto é preciso cuidado, não vou aprofundar as explicações sobre quem foi essa figura obscura, porque isto não importa. O que aconteceu sábado pouco tem a ver com uma suposta “verdade histórica”. Mas era um embate político em torno da memória, que diz mais sobre o presente do que sobre o passado.
Monumentos históricos não são livres de disputas ideológicas. Muito pelo contrário, são resultados delas. Ao resolver demolir a estátua do general, o prefeito mexeu em feridas ainda não cicatrizadas. Em problemas que não estão resolvidos.
Este texto busca entender como a imagem de um general do exército confederado foi capaz de unir movimentos políticos aparentemente opostos como “libertários” e neonazistas. O que teria causado tanto ódio? Para responder essa pergunta é necessário, primeiro, entender as bases do conservadorismo norte-americano.
As origens do conservadorismo nos EUA
Já virou lugar comum dizer que os EUA são um país de imigrantes. Essa afirmação, sozinha, é tão verdadeira quanto inútil. Para compreendermos a sociedade americana é preciso ir além das generalizações. Ok, eles são um país formados por imigrantes. Mas qual o sentido e os efeitos desse fluxo de pessoas na conformação da cultura política do país? Essa pergunta é muito mais interessante e ilustrativa.
Segundo o historiador Roger Osborne, o principal efeito político de imigração foi o bipartidarismo. Ora, por serem um país de imigrantes, afirma Osborne, nenhum grupo tinha força suficiente para impor a sua agenda. Isso poderia levar a uma fragmentação ou poderia aglutinar esses grupos em duas grandes agremiações. Segundo o mesmo autor, as diferenças étnicas, culturais e raciais foram aos poucos perdendo espaço diante da crescente polarização. Essa afirmação precisa ser relativizada.
As culturas que formaram os EUA não chegaram ao mesmo tempo e não tinham o mesmo peso. O mito de origem americano começa num navio. Porém, ele não era uma “Arca de Noé cultural”, mas um pacto feito por ingleses puritanos enquanto partiam para o desconhecido. Ou seja, há um modelo bem definido do que seria o homem americano. Os imigrantes não vieram para compor um universo plural, mas precisavam se encaixar numa hierarquia predeterminada.
Com o tempo, essas fronteiras étnicas, que inicialmente eram bem demarcadas, foram sendo borradas. Assim, grupos radicais se agarravam cada vez mais às tradições e a um passado idealizado. Segundo o pensamento conservador, o verdadeiro americano seria sintetizado por uma sigla: WASP (White, Anglo-Saxon and Protestant).
Portanto, ao contrário do que propõe Osbourne, as diferenças étnicas, culturais e raciais não foram perdendo espaço, mas elas criaram outra divisão, que de tempos em tempos emerge no debate político. Tal polarização é entre os grupos culturais que buscavam espaço e os chamados WASP que, guiados por um ideal mítico de sociedade, desejavam manter o modelo aristocrático.
Essa divisão nunca desapareceu por completo. Quando os manifestantes de sábado gritavam frases como “nosso solo” ou “nossa terra”, eram essas representações que eles estavam evocando. A defesa da cultura europeia/protestante e da supremacia branca está na origem do movimento conservador nos EUA.
>> Para ler o texto na íntegra, clique aqui:
agência de notícias anarquistas-ana
Latidos ao longe —
Entre os prédios do horizonte,
a lua de inverno.
Teruko Oda
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!