A seguir publicamos o discurso escrito e lido por Lucía Sánchez Saornil durante a abertura Festival Artístico de Solidaridad Internacional Antifascista (SIA), que teve lugar no Teatro “Gran Liceo”, em Barcelona, por ocasião do segundo aniversário da Revolução Espanhola em 19 de julho de 1938. Pouco mais de 85 anos nos separam desse texto, que ainda permanece atual diante da barbárie que o mundo aparentemente civilizado continua a promover sob patrocínio neoliberal contra os “Condenados da Terra”, para usar aqui a expressão célebre de Frantz Fanon. Dentre suas vítimas preferenciais, estão as crianças árabes executadas pelo Estado de Israel na Faixa de Gaza (Palestina), as crianças yanomamis estupradas por garimpeiros ilegais em Roraima (Brasil), as crianças pretas vítimas da violência policial no Alabama (Estados Unidos), dentre tantas outras que estão nas periferias e nos centros do capitalismo. Almejam destruir as sementes da resistência antes que elas germinem e floresçam. Como nos lembra Lucía Sánchez Saornil, salvar as crianças da morte (física e espiritual) é garantir a possibilidade de um futuro livre e igualitário para toda a humanidade. A tradução do espanhol para o português é de Diego Silva.
Por Lucía Sánchez Saornil
Vocês se esquecerão, momentaneamente, que não muito longe daqui – os quilômetros já não são mais contados por centenas – as bocas dos fuzis não descansam. Talvez, neste exato momento, o ferro e o fogo inimigos chovem sobre alguma população indefesa, semeando a morte e o desespero.
Não vamos reprová-los por este esquecimento, mas temos que colocá-los em vigilância contra a sugestão de seu enfraquecimento. Para isso acreditamos que bastará passar antes aos seus olhos a imagem de uma criança. É estranho que com a silhueta infantil pretendamos incitar o espírito subtraindo-o de visões de paz para lançá-lo, em seguida, às inquietações turbulentas, não é mesmo?
Até ontem ainda, diante da visão das crianças, os seres humanos sentiam seus ódios fraquejarem e suas violências derreterem como a cera de seus corações. Diante da imagem da criança, os seres humanos sempre selavam seus compromissos de paz, mas hoje… a lembrança da criança é precisamente o que enche nossos dias de angústia e inunda de ódio o coração de todos os antifascistas espanhóis. Aqueles que, sem escrúpulos, romperam a negociação tradicional dos seres humanos diante da imagem infantil não podem ser perdoados.
Para esses, sangue de crianças, muito sangue de crianças tingiu o pavimento de nossas cidades; fossas profundas foram abertas para recolher especificamente os restos de crianças trituradas; os lábios apenas balbuciantes de nossos filhos já beberam rios de amargura; existem pezinhos débeis que conhecem as correias intermináveis das estradas e pescoços caídos que anseiam a proteção dos tenros braços maternos.
Aqui estão as razões do porque, a nosso pesar, a imagem da criança serve para incitar nossos espíritos evitando que se deixem influenciar pela placidez de uma honesta distração. As horas, trágicas e heroicas, que vivemos exigem uma atenção permanente que nos dê garantias contra a astúcia e a traição contumaz com a qual o inimigo nos rodeia.
A guerra, camaradas, não se faz e nem se ganha apenas nas trincheiras; a guerra se faz e se ganha também nas cidades. No fronte se ganha destruindo; na retaguarda reconstruindo. Mas para reconstruir precisamos de um exército tão forte, tão poderoso e tão unido como aquele destinado ao combate militar; é preciso refazer constantemente; não somente coisas objetivas, coisas materiais, mas coisas incomensuráveis, mais elevadas e mais profundas: é preciso refazer lares, é preciso refazer vidas, é preciso refazer seres. É necessário revolver e escavar entre os escombros morais de um povo deixado em ruínas, para descobrir sua última palpitação vital e extraí-la e fecundá-la novamente. Para esta obra, repetimos, precisamos de um exército tão unido e tão forte como o da linha de fogo. Este exército, camaradas, já temos. Este exército é SIA.
Solidaridad Internacional Antifascista soma as vontades e valoriza a potencialidade criadora de nossa retaguarda. Por detrás das linhas de fogo, vão construindo vidas e seres humanos. Fortalecendo e elevando o que ameaça cair, aglutinando o que começa a se desagregar. O primeiro passo no caminho deste dever é salvar a infância, não apenas da morte física, mas de algo a mais, do aniquilamento espiritual. SIA já começou esta obra. Sua presença aqui assegura a ela sua confiança e seu apoio. Obrigada.
agência de notícias anarquistas-ana
depois de horas
nenhum instante
como agora
Alexandre Brito
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!