Guardada desde faz meses nas gavetas do governo, a lei de imigração impulsionada por Darmanin [Ministro do Interior] sai do Senado carregada de emendas tiradas diretamente do programa de extrema direita, votadas com o apoio dos funcionários eleitos do partido presidencial. Ante estes ataques racistas contra exilados e imigrantes sem documentos estão se organizando mobilizações.
O projeto de lei para “controlar a imigração, melhorar a integração” ou lei Darmanin, logo será examinada pela Assembleia após a emenda do Senado em 14 de novembro. Este projeto de lei, “o mais duro e firme dos últimos trinta anos”, segundo palavras de seu autor, foi descrito inicialmente, inclusive em alguns meios de comunicação de esquerda, como um equilíbrio entre a regularização dos trabalhadores sem documentos e a firmeza para os infratores. Para simplificar, há que “ser mau com os maus e amável com os bons”, diz o ministro do Interior.
A nova lei prevê impor automaticamente uma OQTF[1] aos solicitantes de asilo cuja solicitação seja rechaçada em primeira instância. Em caso de rechaço, até agora podiam recorrer ante a CNDA, um tribunal composto por dois juízes e um perito. Esta colegialidade permitiu, em teoria, ganhar tempo para uma entrevista séria com eles.
A reforma pretende reduzir o jurado a um só juiz e generalizar a vídeo conferência das audiências. Ante mais de dez casos por dia, podemos temer que este juiz único simplesmente ratifique o rechaço da solicitação de asilo pronunciado pela OFPRA[2]. Ademais desta lei, o governo pretende dotar-se de meios para expulsar as pessoas objeto de um OQTF. Aumenta a capacidade dos centros de detenção administrativa existentes (Mesnil-Amelot) e constrói outros novos (Mérignac) para alcançar 3.000 praças adicionais daqui a 2027.
Falsas promessas dadas aos reformistas
A garantia oferecida à esquerda foi a eliminação do período de espera de seis meses durante o qual os solicitantes de asilo não podiam trabalhar (quer dizer, a duração teórica do exame de sua solicitação). O problema é que neste caso, depois de haver sido postos a trabalhar durante seis meses, um grande número deles seriam deportados se se rechaçava sua solicitação de asilo. A outra promessa foi a criação de uma permissão de residência específica para os trabalhadores de ofícios “estressados”, renovável a cada ano com a condição de que seu setor ainda enfrente escassez de mão de obra. Portanto, não se trata de modo algum de uma abertura, mas de um substituto do visto de trabalho que garantiria uma permissão de residência durante três anos.
Ao finalizar os confinamentos, se retomaram um grande número de obras paralisadas que requeriam uma importante mão de obra. No entanto, milhares de trabalhadores sem documentos, cansados da exploração a que estão sujeitos, recorreram ao auto empreendimento e, em particular, à revenda. Resulta que, sob a pressão do governo, 2.500 revendedores e revendedoras sem documentos foram despedidos por Delivere em setembro de 2022. Um grande número ficou sem recursos e recorreu a profissões chamadas “de escassez”, com a promessa de uma regularização (provisória). Com a aprovação desta medida, se a demanda de trabalhadores nas obras de construção, nas cozinhas e nos serviços de manutenção diminuísse, o Estado teria todas as possibilidades de expulsar a quem mantinha a economia do país.
Um projeto inspirado no programa RN [Le Pen]
No entanto, inclusive estas medidas que serviam menos aos interesses dos trabalhadores sem documentos que aos de seus patrões foram eliminadas depois de serem aprovadas pelo Senado. O centro e a direita senatoriais de então, mediante uma bateria de emendas, reorientaram esta já desastrosa reforma para modelá-la segundo o mortífero programa da RN sobre imigração. Estas medidas incluem: o estabelecimento de quotas migratórias, o endurecimento da reagrupação familiar e o acesso a permissões de residência por motivos familiares, a criação de novos casos de denegação de expedição de uma permissão de residência, o condicionamento da obtenção de uma primeira permissão de residência de estudantes a um depósito, a transformação da ajuda médica estatal (AME) em ajuda médica de emergência unicamente, o condicionamento das prestações sociais a cinco anos de residência certificada no território ou inclusive a reinstauração do “delito de residência ilegal”.
O Senado desenhou uma reforma racista, mas em continuidade com a política governamental. A AME e a CMU foram abolidas em Mayotte em 2005 com um foco colonial, e os territórios de ultramar serviram geralmente como lugar para a experimentação social antes de estender este tipo de medida ao resto do país. As emendas do Senado permitiriam generalizar esta supressão da AME, apesar do recente alerta de um coletivo de 3.000 cuidadores sobre os riscos para a saúde que gera esta medida. Há muitos motivos para preocupar-se de que outras práticas experimentadas no estrangeiro se estendam por todo o país.
Os estudantes estrangeiros são os mais afetados pelas medidas discriminatórias desde a muito tempo. Aumento de dez vezes as taxas de matrícula para estudantes não europeus em 2019, suspensão de vistos em setembro deste ano para estudantes malienses, nigerianos e burkineses. Se faz todo o possível para dissuadir os nacionais de antigas colônias de estudar na França, baseando-se no preconceito racista de que não são verdadeiros estudantes.
Uma mobilização a longo prazo
Inclusive antes desta aberrante acumulação de emendas destinadas a fazer a vida cada vez mais impossível aos sem documentos no território, os coletivos e seções sindicais de trabalhadores sem documentos apoiados por organizações de apoio não se equivocaram e se mobilizaram contra o projeto de lei de Asilo e imigração. A Marcha de Solidariedade lidera desde a um ano uma campanha de concentrações e manifestações destinadas a protestar contra este projeto. Uma onda de greves coordenadas afetou 33 marcas em 17 de outubro, incluída a ocupação das obras da Arena por centenas de grevistas e seus seguidores, a obra de construção mais importante dos Jogos Olímpicos na qual trabalham muitos trabalhadores sem documentos. Estas lutas obtiveram um procedimento de regularização para os grevistas do local e demostraram que a implacabilidade legislativa e policial está longe de ter vencido a determinação e a solidariedade dos ativistas. Esta mobilização não cessou e tem como objetivo reabrir os mostradores físicos para a apresentação de solicitações de permissão de residência na prefeitura.
Podemos temer que a atenção centrada na questão da AME sirva de alavanca para que Darmanin negocie a aprovação de seu projeto. As manifestações declaradas em 18 de dezembro e as demais mobilizações organizadas até então em toda a França a instâncias de mais de 200 organizações[3] devem ser mobilizadas massivamente por nosso campo político se queremos obter um rechaço total deste projeto. Papeis para todos! Agora!
Comissão Antirracismo da UCL
Notas
[1] Obrigação de abandonar o território francês
[2] Escritório Francês para a Proteção dos Refugiados e Apátridas.
[3] Veja-se a ordem do dia no site web Antiracisme-solidarite.org.
Fonte: https://www.unioncommunistelibertaire.org/?Un-projet-de-merde-dans-un-pays-de-merde
Tradução > Sol de Abril
agência de notícias anarquistas-ana
Dentro da lagoa
uma diz “chove”, outra diz “não”:
conversa de rã.
Eunice Arruda
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!