[França] Que Venezuela queremos?

Enquanto libertário, a Venezuela que desejaria não é a atual oficialista nem a que propõe a Oposição institucional. Nem uma nem outra são projetos de justiça social e ainda menos de uma sociedade de igualdade e funcionamento horizontal. As duas inscrevem a economia nas estruturas do capitalismo global: com a primazia do Capital sobre o Trabalho. Quer dizer: tudo o contrário do que os libertários desejamos.

Dito isto e sendo consciente de que desejar não é suficiente para conseguir o que se deseja, é óbvio que só avançaremos para isso defendendo nosso projeto de sociedade e que é mais possível fazer isso em uma sociedade dominada pelo projeto neoliberal (o da oposição venezuelana) por ser claramente capitalista. Posto que na sociedade dominada pelo projeto socialista-chavista não só as liberdades democráticas são menores ou inexistentes, mas que, além de ser mais limitada nossa possibilidade de ação, é o ter que lutar contra esta demagógica falácia o que faz aparecer o projeto neoliberal como melhor alternativa cidadã e que o povo explorado renuncie a lutar por sua emancipação.

Isto é o que está acontecendo na Venezuela, onde a necessidade de lutar contra a Ditadura, para voltar à Democracia, bloqueia o processo histórico emancipador, como aconteceu na Rússia, China, Cuba…

Daí a necessidade de ser conscientes da urgência de sair das ditaduras populistas para que o dilema volte a ser capitalismo e barbárie ou socialismo autenticamente libertário.

Octavio Alberola

Anexo abaixo a mensagem que me enviou desde a Venezuela o companheiro Rafael Uzcátegui:

Mensagem como venezuelano a meus amigos dentro do movimento anarquista e punk internacional

Feliz dia. Pessoalmente, durante muitos anos, fui vítima da incompreensão sobre nossos alertas e denúncias sobre o que significou o modelo de dominação bolivariano. Hoje, os setores populares do país são os principais protagonistas da rebelião contra uma monumental fraude eleitoral ocorrida em 28 de julho passado, do qual para os interessados existem todas as evidências fáticas.

Ontem, 29 de julho, ocorreram pelo menos 210 protestos em todo o país. A indignação das multidões fez realidade qualquer sonho anarquista sobre a revolta: Estátuas de Hugo Chávez derrubadas, ataques e incêndios contra instituições estatais e sedes policiais, em protestos autoconvocados, sem centro e de atuação descentralizada. Para hoje se espera que a resposta repressiva seja cruel e feroz. Peço-lhes que deem uma olhada horizontal ao que está acontecendo, e não só à disputa das elites sobre o poder. Só gente como nós lhe pode dar um conteúdo autônomo, e potencialmente anárquico, a essa energia popular transbordada nas ruas da Venezuela. Tudo o que possam amplificar das lutas DAS PESSOAS ajudará a dissipar a miopia imposta pelas esquerdas hegemônicas internacionais sobre a Venezuela, da qual lamentavelmente boa parte do anarquismo internacional decidiu amplificar dita cegueira.

Finalmente, não há possibilidade de atuação para os movimentos sociais autônomos e autogestivos em ausência dessas liberdades democráticas que qualificamos como “burguesas”. Só regressando ao jogo democrático, com direitos humanos, é que pode voltar a se pensar para a Venezuela uma possibilidade de construir uma alternativa antiautoritária, de inspiração ácrata, para as maiorias.

Um abraço

Rafael Uzcátegui

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

no parque vazio
duas árvores abraçam-se
em prantos de chuva

Eugénia Tabosa