[Reino Unido] A extrema direita, a esquerda e a armadilha da política eleitoral

Presa ao capitalismo e ao eleitoralismo, a esquerda estadista não tem nada a oferecer durante um período de crise e reestruturação – deixando o campo para os fascistas.

 ~BladeRunner~

Ao longo da última década, testemunhamos o surgimento de um padrão histórico familiar, com segmentos da classe trabalhadora e das comunidades mais pobres recorrendo cada vez mais a figuras de extrema-direita como Trump e Le Pen. A Áustria é o último país a dar uma guinada acentuada à direita, com o anti-imigração, pró-Rússia Partido da Liberdade (FPÖ), garantindo a posição vencedora nas eleições do último domingo, que teve uma impressionante participação eleitoral de 80%. Isto confirma uma tendência crescente observada recentemente em países como Itália, Hungria, Polônia, Brasil e França.

Os principais círculos de esquerda, frequentemente, interpretam esta mudança como um resultado das suas próprias “falhas” para encaminhar os interesses da classe trabalhadora. Um argumento comum é que ocorreu uma “reversão de classe”, com os partidos de esquerda sendo cooptados pelas educadas elites neoliberais. Outros afirmam que a esquerda tem abandonado a análise econômica em favor das políticas identitárias.

Contudo, a raiz do problema reside nas falhas do próprio sistema de democracia eleitoral. Os sentimentos de traição e desilusão decorrem do fracasso histórico da esquerda estadista em desafiar o espetáculo da política eleitoral, que serve para manter o sistema de classes a todo custo. Em vez disso, os partidos de esquerda cooptaram períodos de insurreição e agitação, durante o colapso dos ideais social-democratas nas crises econômicas na chegada do século XXI. Ao fazê-lo, a esquerda (focada atualmente no New Deal Verde, no identitarismo e nos direitos humanos) posicionou-se como um dos dois pilares da política hegemônica, sendo o outro a direita (focada na negação das alterações climáticas, no nacionalismo e na religião).

A esquerda estadista moderna enfrenta uma tragédia fundamental. Atrelada ao eleitoralismo, enreda-se na teia da governança neoliberal, não oferecendo nem soluções alternativas reais nem desafiando eficazmente o sistema capitalista durante um período de crise e de reestruturação – um momento que deveria ser uma excelente oportunidade para avançar num novo caminho. Entretanto, a elite mantém o controle, desviando os trabalhadores da ação direta e orientando-os para opções eleitorais de extrema-direita ou para motins xenófobos orquestrados. Estas distrações dão tempo à classe dominante para reestruturar a produção e os sistemas políticos para se adaptarem às duras realidades do colapso climático e do ecocídio.

Ironicamente, é a extrema direita, e não à esquerda, que prospera com falsas promessas. Os líderes da extrema-direita escondem-se numa retórica anti-establishment, posicionando-se como heróis da classe trabalhadora “esquecida”. Ao explorar mitos como a “Grande Substituição” e a degeneração da civilização ocidental, canalizam a raiva da classe trabalhadora para o nacionalismo e a xenofobia. A sua agenda mais uma vez fratura a classe trabalhadora, dividindo-a em classificações raciais, étnicas e nacionais. Uma vez no poder, a extrema-direita capitaliza o desespero econômico que inicialmente impulsionou a sua ascensão, impondo políticas de austeridade e anti-trabalhadores que aprofundam ainda mais as desigualdades.

Desta forma, reforçam tanto as barreiras materiais quanto ideológicas que protegem, dentro da cidadela, os privilegiados dos “outros” excluídos, espalhando o medo e o ódio em ambos os lados. Aos excluídos é negada a entrada nas zonas de prosperidade da Fortaleza Europa, enquanto o Estado exerce controle sobre a população “próspera”, mostrando tolerância zero para qualquer um que esteja fora dos limites do depressivo realismo capitalista.

A solução não reside na reforma dos partidos eleitorais de esquerda para alinhá-los com o colapso do sistema capitalista em curso. Está na construção de um movimento que rejeite todo o quadro da política eleitoral. A resposta está na ação direta, no apoio mútuo e na organização de base comunitária que rejeite tanto a xenofobia da extrema-direita como as promessas vazias da esquerda. Somente com uma radical consciência de classe e uma organização anti-autoritária é que as estruturas capitalistas e estatais que continuamente nos traem podem ser desmanteladas.

Fonte: https://freedomnews.org.uk/2024/10/07/the-far-right-the-left-and-the-trap-of-electoral-politics/

agência de notícias anarquistas-ana

Um aroma chegando
na brisa que sopra do mar —
é primavera!

Marco Antônio Fontolan