[Espanha] A Libertalia existiu?

Saudações!

Parece-me que questionar se existiu ou não a comunidade de Libertalia é algo capcioso. É como perguntar se a Terra é redonda ou, talvez de forma menos contundente, se existiu a Utopia, me refiro à obra de Thomas More. Naturalmente a obra existiu, traduzida para muitas línguas. Naturalmente também existiu a sua utopia ou, como diz Leyla Martínez, na sua obra publicada no ano passado Utopia não é uma ilha, já que existem muitas comunidades como a descrita por More, é muito mais do que uma ilha, é, são, muitas ilhas, é um movimento contínuo. Perguntar-se pela existência de algo tão potente como a utopia é o mesmo que perguntar pela sua utilidade, e isso foi deixado bem claro por Eduardo Galeano quando, em um debate com o cineasta argentino Aguirre em Cartagena de Indias, na Colômbia, um dos presentes perguntou sobre a rentabilidade da utopia e sua resposta foi: “A utopia está no horizonte. Eu sei muito bem que nunca a alcançarei, que se eu caminho dez passos em direção a ela, ela se afasta dez passos, e quanto mais eu a buscar, menos a encontrarei: ela vai se afastando à medida em que me aproximo. Para que serve a utopia? A utopia serve para isso, para caminhar, para continuar avançando”. Hoje, é mais moderno falar em distopia, ou seja, ser moderno é o mesmo que ser reacionário.

Acredito que a pergunta deveria ser: O que foi a Libertalia? Não me sinto qualificado para me aprofundar na história da Libertalia, seja uma história real ou uma história utópica; o importante é saber o que se estava criando no final do século XVII e início do XVIII, em uma região tão distante da Europa quanto o norte da ilha de Madagascar. Ali nasceu — evidentemente não nasceu do nada, sem mais nem menos, trazia consigo uma bagagem de experiências vividas, de lutas contra os oficiais bárbaros em barcos… — uma comunidade de piratas e escravos libertos, vindos do mar do Caribe e do Índico, que fundaram uma comunidade onde todas as decisões eram submetidas a votação em assembleia, onde o álcool não era bem visto, nem a blasfêmia, nem a obrigação de trabalhar, etc. Ao se estabelecer em Libertalia, os liberti — nome dado aos escravos libertos — renunciavam sua antiga nacionalidade, criando comunidade entre pessoas de diferentes raças, onde o dinheiro era abolido, onde todos eram piratas, agricultores, pastores. Daniel Defoe, autor da obra História Geral dos Roubo e Assassinatos dos Mais Famosos Piratas, publicada sob o pseudônimo de Charles Johnson, também fala sobre as mulheres vivendo em condição de igualdade com os homens, participando das assembleias com voz e voto, e nos diz também que “De qualquer forma, a história de Libertalia representa a expressão literária das tradições, práticas e sonhos do proletariado atlântico.” Ou, em outras palavras: no século XVII e XVIII, muitas colônias fundadas por escravos libertos, piratas e migrantes vindos das metrópoles ocidentais funcionaram de fato com base em princípios coletivistas e libertários.

A história de Libertalia é a história “de magia, mentiras, batalhas navais, princesas sequestradas, caça a seres humanos, reinos de cargas preciosas e embaixadores fraudulentos, espiões, ladrões de joias, envenenadores, adoração satânica e obsessão sexual, que é o que subjaz à origem da liberdade moderna”. Assim começa a história que nos conta David Graeber, o antropólogo anarquista que foi demitido da Universidade de Yale, em seu livro Ilustração Pirata: Bucaneiros, Alegres Lendas e Democracia Radical (2024). Ou seja, Libertalia está ali, está aqui, nos livros, nas ideias, nas ruas, nas reuniões… onde queremos olhar para frente e caminhar. Está nos livros e artigos que nossos avós escreveram no início do século XIX sob a nomes de Salud y R.S. (Saúde e Revolução Social). É ali que encontramos a utopia, não no sofá adormecidos assistindo televisão.

Simón Peña

Fonte: https://www.portaloaca.com/opinion/existio-libertalia/

Tradução > Alma

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O grilo.

Edércio Fanasca

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