
“Uma bala no coração de Alexis para acabar com o ciclo da onipotência da máquina estatal. Uma mancha de sangue na rua de pedestres de Messolonghi para iniciar o ciclo de revolta que destruiu a ordem legal e espalhou caos e anarquia em todas as cidades da Grécia… Alexis é agora parte integrante dessa história; não sei como seria se os acontecimentos fossem diferentes, ou melhor, se isso é mais do que o espírito interior dos feridos. Mas posso te contar o que Alexis era antes de morrer pelas balas do policial. Na sua curta, mas aventureira vida, viveu de forma autêntica, era um jovem insurgente fascinado pela ideia de anarquia como aqueles que hoje ocupam as ruas da cidade jogando coquetéis molotov em policiais e incendiando carros de polícia, era indisciplinado e teimoso, um homem honesto de alma bondosa e motivos altruístas em tudo que fazia. Ele era alguém que vivia intensamente as suas paixões e frustrações”
– Nikos Romanos, Requiem para uma jornada sem retorno (Requiem for a journey of no return)
29/11/2015
Dezessete anos se passaram desde o assassinato, pelos policiais Korkoneas e Saraliotis, do estudante anarquista Alexis Grigoropoulos em Exarchia, na interseção das ruas Messolonghi e Tzavella. O local, assim como o que aconteceu nas horas e dias seguintes, não foi coincidência. Já antes da sangrenta noite de 6 de dezembro de 2008, Exarchia era um ponto de referência para todos que queriam questionar a autoridade e a aparente onipotência do Estado e do capital. Os inúmeros confrontos com as forças da repressão na Politécnica, na Praça Messolonghi e em todos os cantos do bairro, nas ocupações, e todas as lutas sociais e de classes que ocorreram em Exarchia juntos formaram um mosaico de resistência e antiviolência social contra o voraz motor de poder que quer destruir todos os sonhos e desejos dos de abaixo. Assim, Alexis, companheiro anarquista de 15 anos, desde muito jovem buscou o caminho da resistência nas ruas estreitas de Exarchia, rejeitando para sempre o caminho da inação e da passividade. Exarchia generosamente lhe deu as pedras, as garrafas e as ferramentas para fazer a sua parte na guerra social e de classes e para lutar ao lado dos oprimidos. Foi nesse papel que foi assassinado, como lutador que desde muito jovem escolheu o lado da história que exige um mundo de igualdade, solidariedade, o domínio da revolução social e da anarquia.
O assassinato estatal de Alexis Grigoropoulos não foi um evento aleatório. Alexis, como lutador, e mais, como jovem lutador cheio de apetite por mudar o mundo, foi deliberadamente assassinado pelo Estado grego numa tentativa de desmontar a resistência social e o mundo da luta e de enviar uma mensagem punitiva a crianças, jovens homens, mulheres de que o único caminho que podem escolher é a subjugação. Porém, as marés da história lhes mostraram a derrota. O assassinato estatal de Alexis Grigoropoulos não só foi insuficiente para subjugar pelo terror o mundo da luta, foi a faísca para a chama da revolta de dezembro de 2008, a radicalização de dezenas de camaradas que, em frente à viela ensanguentada de Messolonghi, juraram vingança e derrubaram a normalidade não só do centro metropolitano de Atenas, mas da normalidade imposta pelo aparato estatal. Até mesmo os estudantes, alvo de repressão e dando exemplo, não só não recuaram, passaram a ocupar as escolas, tradição que continua até hoje, todo 6 de dezembro, e participaram de passeatas, comícios e ataques a delegacias de polícia. As relações forjadas desde então até hoje, com a participação compartilhada do povo do bairro Exarchia nas lutas locais e sociais, construíram relações de confiança e solidariedade. Há inúmeros exemplos de moradores de Exarchia oferecendo as próprias casas como abrigo contra gás lacrimogêneo e ataques policiais. Incontáveis são as lutas nas quais o movimento radical se sentiu em casa em Exarchia e lutou por ela.
Exarchia é um lar para todo indivíduo em luta, é ponto de encontro, lugar de socialização, de organização e centro de resistência. Nas ruas de Exarchia, na colina, na praça, coletivizamos as ansiedades e medos, as dificuldades do dia a dia, as alegrias e a raiva. Encontramos soluções e respostas, às vezes espontâneas, outras, organizadas, construindo barricadas de solidariedade de classe e auto-organização social.
Exarchia, como berço de ideias e revoltas antiautoritárias, e como bairro de solidariedade e ajuda mútua, onde moradores e frequentadores vêm construindo relações de solidariedade e desafiando o poder há décadas, é alvo do Estado e do capital. A criação de uma estação de metrô na praça, a tentativa de transformar o prédio Gini em jardim na cobertura e a esterilização da Politécnica Inferior, as centenas de policiais acampados na Colina Strefi e no bairro para proteger os desejos do capital, todas escolhas políticas que trabalham em benefício do capital e às custas das camadas mais pobres e contrapoderosas da sociedade. Esses fatores levaram a uma mudança nas características de Exarchia, ao desaparecimento dos seus poucos espaços públicos e ao deslocamento da sua base social. O avanço do capital, pelo turismo, com inúmeras lojas, AirBnB e o rápido aumento dos aluguéis, desloca as pessoas do bairro, transformando em entretenimento, em resort turístico estéril, onde o seu caráter político e social se transforma em mercadoria e espetáculo.
Como aconteceu em 2008, pode acontecer de novo. Isso ficou comprovado nos últimos anos com os assassinatos estatais de X. Michalopoulos, K. Fragoulis, N. Sambanis, K. Manioudakis, com o ataque quase mortal ao antifascista Vasiliki, com a morte por tortura de Mohamed Kamran na delegacia de polícia de Agios Panteleimon, o assassinato estatal de 600 imigrantes em Pilos, com a previsível desvalorização da infraestrutura pública e do transporte que levou a Tempe, com inúmeros “acidentes industriais” e com muitos outros assassinatos estatais conhecidos ou desconhecidos em campos de trabalho, hospitais, fronteiras, centros de detenção, delegacias e prisões. O acampamento de centenas de assassinos fardados no bairro, que atacam predominantemente jovens circulando fora do contexto de consumo em Messolonghi, na Colina Strefi e nas ruas de Exarchia, com bullying diário, checagens “padrão” de identidade e prisões, cria a condição para a repetição do assassinato policial.
O ataque a jovens também ocorre nas escolas, como aconteceu em 5 de novembro de 2025 no Colégio 46 de Atenas, que fica no bairro de Exarchia, e estava sendo ocupado em resposta ao chamado nacional dos professores universitários contra a degradação das escolas públicas e universidades, contra a desvalorização e repressão de alunos e professores. A polícia fez uma operação surpresa brutal contra a ocupação estudantil, resultando na prisão violenta de um estudante de 13 anos e na sua detenção por uma noite na delegacia de Exarchia. O estudante foi alvo de intimidação, abuso e coleta de impressões digitais sem a presença de tutor ou advogado, enquanto a sua mãe foi impedida de vê-lo e ameaçada de prisão. É evidente que, dentro do quadro geral de repressão exercido pelo Estado na sociedade, o aumento de estudantes e jovens como alvo não é acidental, é uma escolha consciente. Desde as novas disposições direcionadas a menores no Novo Código Penal até a constante propaganda na mídia e práticas repressivas em espaços públicos, o objetivo é suprimir todas as vozes jovens, enfraquecer a resistência antes mesmo que se forme, cortar os jovens dos seus desejos e experiências e integrá-los de forma ordenada à lógica do sistema. Isso porque sabem que as gerações mais jovens são a base de uma sociedade que se desenvolve por meio da luta coletiva, capaz de imaginar um mundo diferente.
No nosso caso, defendemos o legado insurrecional de dezembro de 2008 e o fio histórico da resistência no bairro, e resistimos à transformação de Exarchia em um bairro genérico, predominantemente povoado por turistas, apartamentos de luxo e lojas caras, e frequentado por consumidores caríssimos e egocêntricos e interessados na sua carreira. Defendemos um bairro vivo que seja acolhedor para imigrantes, que vá às ruas diante da violência estatal, que abra as portas para aqueles que lutam, resistem e se organizam. Convocamos o povo do bairro e do mundo de luta a se unirem ao chamado da Ação Coordenada na Defesa de Exarchia para se reunirem na Praça Exarchia em Tsamadou, no sábado, 6 de dezembro, às 16h30, para seguir juntos à manifestação da marcha de memória do estudante anarquista Alexis Grigoropoulos e da revolta de 2008.
– O bairro, armado com solidariedade, vai às ruas em 6 de dezembro. Deixamos as nossas portas abertas aos manifestantes.
– Quebramos a ‘linha vermelha’ do nosso bairro, não deixamos mais espaço para a repressão estatal.
– Todos às ruas. Todos para Exarchia.
– Reunião na Praça Exarchia na rua de pedestres de Tsamadou às 16h30 e marcha para Propylaea às 18h30
NESTAS RUAS, NESTA SOCIEDADE, HÁ LEVANTES, NÃO HÁ DEVANEIOS
TEREMOS A ÚLTIMA PALAVRA: ESTES DIAS SÃO PARA ALEXIS
KYRIAKOS XYMITIRIS, UM DE NÓS: CAMARADA PARA SEMPRE NAS RUAS DO FOGO
Ação Coordenada na Defesa de Exarchia
Fonte: https://bentley.noblogs.org/post/2025/12/01/alexis-grigoropoulos-one-of-us/
Tradução > CF Puig
agência de notícias anarquistas-ana
Cicatrizes antigas –
a pele guarda revoltas
que os livros apagaram.
Liberto Herrera
Obrigada por compartilhar! Tmj!
opa, vacilo, vamos corrigir... :^)
compas, ollas populares se referem a panelas populares, e não a ondas populares, é o termo usado pra quando se…
Nossas armas, são letras! Gratidão liberto!
boa reflexão do que sempre fizemos no passado e devemos, urgentemente, voltar a fazer!