A Justiça da Bolívia encerra caso Caza & Safari: não investigará mais a empresa argentina que promovia a caça de jaguares

Por Iván Paredes Tamayo | 16/12/2025

A Justiça da Bolívia encerrou o caso Caza & Safari, no qual se investigava uma empresa argentina que vendia pacotes turísticos para viajar à Bolívia e matar jaguares na região do Pantanal. Os demandantes acusam a Promotoria de Santa Cruz de não revisar as provas apresentadas e de evitar dar informação sobre o processo.

O dono da companhia Caza & Safari, Jorge Néstor Noya, é acusado na Argentina de ser o principal artífice do maior caso de tráfico de fauna silvestre desse país.

O jaguar é uma espécie protegida na região. Estima-se que na Bolívia só restam um pouco mais de 3000 indivíduos, segundo o biólogo Huáscar Bustillos. A lei proíbe sua caça e os especialistas pedem que se mude sua categoria de vulnerável para em perigo.

Na Bolívia, Noya levou clientes de maneira irregular para caçar jaguares na zona oriental desse país. O fez durante mais de 30 oportunidades desde a década de 1980. Noya foi processado em seu país e a investigação teve relevância regional, já que o negócio deste caçador também chegou ao Paraguai, Brasil e inclusive alguns países da África.

Rodrigo Herrera, advogado boliviano que levou o caso com a parte demandante, que é a ativista Lisa Mirella Corti e o guarda parque Marcos Uzquiano, explicou a Mongabay Latam que na Bolívia se introduziu uma demanda penal em dezembro de 2024 e que logo se formou uma comissão de investigação formada pela Promotoria do município de San Matías (fronteira com o Brasil), a Promotoria especializada em delitos ambientais de Santa Cruz e a Promotoria Geral, que tem sede na cidade de Sucre.

“Todo este tempo, como parte demandante, apresentamos à Promotoria muitas provas, muitas evidências e também se remeteu o informe oficial da promotoria argentina no qual se mostra informação coletada do telefone celular do senhor Noya que confirmava que ele estava na Bolívia em novembro de 2023 realizando a caça ilegal do jaguar”, detalhou Herrera.

O advogado acrescentou que esperaram a resposta da Promotoria boliviana e que em julho deste ano o processo já não se encontrava no sistema digital do Ministério Público da Bolívia. “Na Promotoria de Santa Cruz nos disseram que o promotor de San Matías havia encerrado o caso por insuficientes provas”, disse. Herrera disse que não foram notificados na data com a extinção do processo e afirmou que seguirão insistindo em um julgamento contra Noya na Bolívia.

No marco deste caso, na Argentina se fizeram 12 buscas na província de Buenos Aires, na cidade de Buenos Aires e na província de Santiago del Estero. Também embargaram 37 veículos automotores, os quais eram propriedade dos acusados, vários deles de alta gama. Embargou-se também um imóvel de grande valor situado na costa atlântica argentina que era propriedade de um dos supostos chefes da organização e também foram embargados os três terrenos de caça nos quais se haviam feito as caçadas ilegais.

Esse processo se instalou na Promotoria Federal 1 de Lomas de Zamora, que é a que instruiu a investigação, e também interveio o Tribunal Federal 2 de Lomas de Zamora. Neste caso, segundo a investigação, também se apreenderam 44 armas de fogo, que haviam sido utilizadas para entregá-las aos clientes estrangeiros do argentino Noya, com as quais haviam realizado as atividades cinegéticas (técnicas e mecanismos para caçar) ilegais.

A provisão de armas de fogo aos clientes de Noya se fazia – segundo a investigação – sem que estes tivessem permissões para caçar nem tampouco permissões para usar armas de fogo na Argentina e na Bolívia.

Os “troféus”

Durante os operativos se apreenderam 7951 taxidermias, quer dizer, animais dissecados para conservá-los com aparência de seres vivos. Este processo de taxidermia se realizava – segundo a investigação – em oficinas ilegais na Argentina e logo esses “troféus” eram enviados aos países dos clientes caçadores.

Na investigação incluem-se detalhes das viagens e clientes de Noya. O caçador argentino recebia seus clientes, a maioria de nacionalidade estadunidense e espanhóis, na Argentina. Desde ali, os levava até a cidade de São Paulo e logo a Cuiabá, perto da fronteira com Bolívia. Desde Cuiabá ingressava com os caçadores em pequeno avião a vários destinos do oriente boliviano, onde buscavam jaguares para matá-los.

Lisa Mirella Corti, que é uma das denunciantes do caso na Bolívia e parte do coletivo El llanto del Jaguar, explicou a Mongabay Latam que na Bolívia a demanda se apresentou em dezembro de 2024, após conhecer os atos que havia cometido Noya na Bolívia, principalmente na Área Natural de Manejo Integrado (ANMI) San Matías, que é a segunda maior reserva da Bolívia.

“Admitiu-se a denúncia, mas no processo de investigação a rejeitaram. Nos tiraram do sistema digital faz uns meses e agora não podemos acessar a informação do caso. Nos disseram que rejeitaram o caso porque o promotor de San Matías disse que não há provas suficientes, mas isso é incorreto, já que apresentamos todas as provas, como uma foto de Noya com um jaguar morto na Bolívia”, disse Mirella Corti.

A ativista acrescentou que na Bolívia não se fez nenhuma busca e que não se gastaram recursos econômicos para levar adiante a investigação. “Este é um crime transnacional. Nós vamos reativar o caso e queremos que se impute Noya para pedir sua extradição”, ressaltou Mirella Corti.

Mongabay Latam contatou com a Promotoria de Santa Cruz para pedir informação e confirmou que esse caso foi encerrado pela Promotoria de San Matías. Esta última dependência evitou dar declarações sobre o tema.

A Promotoria de Santa Cruz explicou a este meio que no marco desta investigação pediu-se, por exemplo, informação ao Instituto Nacional de Reforma Agrária (INRA) para determinar se o prédio onde ocorreram os delitos é um imóvel particular ou é uma reserva nacional. Ademais, esta instância detalhou que separado de Noya se investigava um cidadão espanhol, que ingressou na Bolívia com o empresário argentino para matar jaguares.

Segundo detalhou Mirella Corti, a parte demandante apresentou fotografias que são profundamente indignantes e cruéis: se vê Noya posando com seus clientes com os jaguares abatidos. Há felinos mortos pendurados em árvores e ao lado dos caçadores lançando sorrisos.

A investigação argentina confiscou os telefones dos imputados, especialmente o de Noya. Em uma das comunicações, os chefes da organização conversam com um cliente panamenho que queria caçar um “bicho que come cavalos”, referindo-se ao jaguar. As datas não estão claras na investigação, mas essa caçada pode ter sido em julho de 2024. O panamenho nunca pôde caçar um jaguar em seu percurso pela Argentina e seu sonho era ter um troféu desta espécie. Como não conseguiu seu intento em solo argentino, Noya convidou o caçador panamenho para ir caçar na Bolívia sem nenhum custo.

A rota de Noya

Para conseguir esse objetivo na Bolívia, Noya primeiro tomou um vôo da Argentina para o Brasil e desde ali um pequeno avião para a Bolívia. O vôo desse avião era ilegal porque não se registrou sua passagem na fronteira do Brasil à Bolívia. Noya fez saber que a caça se realizaria no oriente boliviano. Até aí chegaram com o cliente panamenho e se desconhece se o caçador conseguiu levar seu “troféu” a seu país.

Noya oferecia alojamento na Argentina e diversos tipos de caças. Seus clientes chegavam a pagar muito dinheiro por cada “troféu”: quanto mais raro, mais difícil de ver ou mais escasso era o animal a caçar, se considerava mais valioso. A caça de um jaguar na Bolívia chegou a custar até 50.000 dólares. Os clientes de Noya seriam personagens reconhecidos em seus países.

Um deles é um destacado médico espanhol que tem inclusive um Museu da Fauna Selvagem na Espanha. Era o segundo estrangeiro investigado na Bolívia.

A rota que realizava Noya e seus clientes para chegar à Bolívia tinha duas escalas no Brasil. Saiam de Buenos Aires para São Paulo e daí chegavam a Cuiabá, que está muito perto do ANMI San Matías. Todas essas rotas a faziam em vôos comerciais, segundo a investigação. Desde Cuiabá, muitas vezes ingressavam ilegalmente em pequenos aviões. Esse espaço aéreo é dominado pelas máfias do narcotráfico. Outras vezes realizavam viagens pela via terrestre, também, violando os controles migratórios, já que na investigação boliviana não existe um registro migratório oficial de entrada e saída por parte do empresário argentino.

Na investigação argentina se confirmou que Noya viajou a Bolívia com seus clientes e inclusive com as fotografias tomadas com o telefone celular de Noya se verificou com aplicações digitais que essas imagens foram realizadas em território boliviano. Mongabay Latam contatou com o advogado de Noya, mas o jurista não respondeu os requerimentos.

Fonte: https://es.mongabay.com/2025/12/bolivia-cierra-caso-caza-safari-empresa-argentina-caza-jaguares/

Tradução > Sol de Abril

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