Os grandes e inúteis eventos, como a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), em Lisboa, são mais uma forma de vender a cidade ao grande capital, o Deus venerado pelo estado português e seus discípulos empreendedores. A notícia de que o dito evento iria receber um investimento público de 35 milhões foi recebida com críticas. Carlos Moedas, sacerdote dos unicórnios e presidente da Câmara Municipal de Lisboa, diz esperar um retorno “enorme”. Esta promessa de retorno é só mais uma das muitas mentiras dos discípulos do capital e da mão invisível, para justificar o investimento público em fantasias de lucro e especulação, que continuam a beneficiar o 1%. Aproveitando a temporada católica denunciamos os 7 pecados do capital, para os quais não há redenção possível: A soberba, ou a promoção neoliberal de Lisboa no topo de rankings feitos para investidores; a avareza, ou a acumulação de prédios devolutos; inveja, ou a cobiça pelo espaço público; a ira, ou os despejos e demolições; a luxúria, ou o desejo obsceno pelo capital estrangeiro; a gula, ou o apetite de especulação; e a preguiça, ou o arrendamento enquanto atividade profissional dos gananciosos.
Chegarão os 150 confessionários no evento (feitos a partir do trabalho escravo dos presos!) para perdoar tanto pecado do capital?
A SOBERBA, que se pode caracterizar por um sentimento de arrogância e superioridade, está presente nos rankings que apontam para Lisboa como “a terceira melhor cidade do mundo com melhor qualidade de vida”, “a cidade mais feliz do mundo”, ou “a segunda cidade europeia mais barata para uma escapadinha”, tão veiculados pelos media, e servem o único propósito de atrair ainda mais especulação, turismo em massa e destruição do tecido social e comunitário das cidades. Esta propaganda neoliberal tenta esconder que Lisboa só é a cidade mais feliz do mundo para especuladores, nómadas digitais e turistas. A “Lisboa Unicorn Capital” “Oeiras Valley” “Almada Innovation District” são exemplos de city branding. Este marketing transforma as cidades em marcas que competem entre si no mundo global, em busca de turistas, investidores, celebridades.
Porém, quando Lisboa, a cidade que veste marcas como a Nova Berlim, se vê ao espelho, vê realidades que em nada condizem com o glamour do fato da moda: é a cidade com a taxa de esforço – relação entre salários e preço da habitação – mais elevada da Europa, e ocupa a sexta posição mundial neste alarmante ranking.
A AVAREZA o apego sórdido ao dinheiro para o acumular, é o que rege quem coleciona prédios devolutos, preferindo deixá-los ao abandono do que dar-lhes uma função social. A acumulação de devolutos demonstra a perversidade da financeirização da habitação: no sistema capitalista vigente, deixar um prédio vazio durante anos significa que está a “valorizar”, ou seja, a aguardar pela melhor oportunidade de negócio. Para os avarentos proprietários, habitar uma casa devoluta significa um “prejuízo”, um dano nos seus planos de acumulação desenfreada de capital. Não importa se existem pessoas que vivem na rua ou em condições degradantes, enquanto existem mais de 48 000 casas vazias em Lisboa: a santa propriedade continua a ser defendida com unhas, dentes e polícias armados. O pecado da acumulação de propriedade vazia não é só um pecado do estado ou de fundos de investimento de origens duvidosas: também a Santa Casa da Misericórdia é detentora de um vasto património de casas emparedadas à espera de serem colocadas no mercado de arrendamento privado, enquanto continua a lucrar com a pobreza.
INVEJA: A inveja é a cobiça dos privados, sempre com a bênção do estado, pelo espaço público. Incapazes de compreender a felicidade do que é partilhado e gratuito, os privados invadem as nossas ruas, passeios e (poucos) jardins com as suas esplanadas, trotinetes deixadas em cima dos passeios, feiras de rua para turistas, ou eventos como a JMJ. O património público deixado ao abandono, que poderia servir para novas creches, escolas ou centros culturais, é vendido em leilões e transformado em hotéis e condomínios de luxo. Até os transportes públicos (mas somente gratuitos para peregrinos) são oferecidos ao turismo, como acontece com o elétrico 28. Assente na lógica da comercialização da cidade-marca, feita para ricos e turistas, o espaço público acaba por ser vedado a quem não pode pagar 2 euros por um café. A privatização do espaço público acaba por acontecer de diversas formas, umas mais subtis que outras, mas com objetivos comuns: rentabilizar cada recanto da cidade e excluir os menos privilegiados.
IRA: a agressão mais intensa que o estado e o capital desferem contra o direito à habitação e à cidade é o despejo ou a demolição de casas onde moram pessoas sem outras alternativas habitacionais. A violência exercida pelo estado e a polícia no dia do despejo ou demolição e a falta de apoios subsequente gera um impacto catastrófico na saúde, vida familiar e capacidade económica das pessoas atingidas. Nos últimos meses, lutou-se contra despejos em bairros sociais de Lisboa, Porto, Aveiro e contra demolições no Talude em Loures e no 2º Torrão em Almada. Não esquecemos também os despejos da Seara, pela mão do estado e do fundo de investimento Spark Capital, ou da Casa Sílvia, em Algés, cuja proprietária era a católica Cáritas. A virtude contrária à ira dos despejos e demolições é a solidariedade, mas não há outra solução para este pecado senão o fim de todos os despejos. Entretanto, por cada despejo: 1000 ocupações!
A LUXÚRIA ou o desejo de prazeres sensuais, é no capitalismo tudo o que seja suscetível de ser vendido. A atração sensual e sexual é direcionada para processos que têm a ver com transações comerciais, posse e desejo pelo luxo obsceno. Já dizia Paddy Cosgrave, “Lisboa é a cidade mais sexy para fundar uma companhia.” A lascívia capitalista impera nas start ups e no mercado de imobiliário de luxo, que atrai nómadas digitais e residentes não-habituais com tentadores benefícios fiscais e vistos gold.
A GULA ou Especulação Financeira
Os Fundos de Investimento devoram as nossas cidades: “85% do investimento imobiliário em Portugal é feito por fundos, com os EUA a liderarem na compra de grandes portefólios”. O mercado português oferece “cidades europeias” muito baratas ao capital internacional, uma espécie de Mc’Donald’s da Europa para este tipo de investimento guloso. As casas, prédios, ruas e bairros inteiros transformam-se em ativos financeiros, isto é, deixam de ter como função primordial servir como habitação, e passam a ter como função o lucro destes fundos,que o conseguem obter controlando a oferta, e sem nenhum investimento real que aumente o valor do bem, são capazes de transaccioná-lo aumentando o seu valor em cada transação: a especulação financeira.
Quem mora, vive, ou trabalha na cidade passa fome e é obrigado a sair, porque os seus rendimentos já não permitem sentar-se à mesa neoliberal onde é servida, com empenho do Estado, a especulação imobiliária. A gula é insaciável, e eles vão continuar a comer tudo, até não deixar nada. É preciso ficar à mesa, resistir coletivamente: nas casas, associações, coletividades, bairros e cidades às quais damos vida. A cidade é para ser habitada e vivida, não vendida!
A PREGUIÇA é a falta de vontade ou de interesse em atividades que exijam algum esforço. Uma das grandes contradições do capitalismo é que, ao mesmo tempo que a classe trabalhadora é levada a acreditar que só “merece” satisfazer as suas necessidades básicas se for produtiva, por outro lado ter uma fonte de rendimento que provém simplesmente de uma propriedade é visto socialmente não só enquanto algo digno, como uma profissão. Assim, a uns basta subirem as rendas de caves bafientas para alcançarem o rendimento desejado, passando a ser “normal” para atingir esse fim explorar outros, que agora estão sujeitos a uma dupla exploração: a do seu trabalho e a do seu rendimento. Rezemos em uníssono: Casas para morar, senhorios a trabalhar!
Versículos inspiradores:
“Quem semeia a injustiça, colhe a maldade: o castigo da sua arrogância será completo” Provérbios 22:8
“É mais fácil um camelo passar pelo furo de uma agulha do que um rico entrar no reino de Deus” Lucas 18:25 e Mateus 19:24
“O amor ao dinheiro é a raíz de todos os males” 1 Timóteo 6:10
Fonte: https://stopdespejos.wordpress.com/portfolio/jornada-mundial-da-juventude-os-7-pecados-do-capital/
agência de notícias anarquistas-ana
Sol no girassol.
Sombra desenha outra flor
no corpo dourado.
Anibal Beça
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!