A Mamãe, A Avó, A Companheira, A Militante que sempre resistiu, a que se podia contar de tudo e, sobretudo, pedir sua opinião baseada em seu longo caminho de luta revolucionária, faleceu em 1º de abril passado.
María Esther nasceu em La Plata e ali passou a maior parte de sua vida.
Trabalhou na educação pública; foi professora dos setores mais desfavorecidos do povo, tanto no setor da cidade como no campo. Não foi por casualidade sua forma de vida, desde muito jovem abraçou a causa dos anarquistas. Desde os 15 anos foi se aproximando das ideias, participou do grupo anarquista “Voluntad” junto com Pablo Tello que foi depois seu companheiro e pai de seus três filhos desaparecidos. Até a década de 50 se vinculava com o escritor Rodolfo González Pacheco em cuja casa de férias conheceu Emilio Uriondo, um anarquista expropriador que havia feito parte do grupo de Ascaso e Roscigna; também por aquela época se vinculou com os anarcossindicalistas Humberto Correale e Carlos Kristof e o combatente da Revolução Espanhola Manuel Palanca.
Muitas ditaduras se sucederam na Argentina e María Esther se organizou para resistir a elas, foi assim como nos anos 60 seu filho maior Pablo Daniel junto a Tino e o Tano começam a organizar o grupo que mais tarde se chamou Resistência Libertária. Em palavras dela: “Pouco a pouco fomos nos incorporando a outros. Seus dois irmãos, eu mesma, Perinola, Cristina, a Turca, Yogurt, Hernán e Elsa que eram do grupo dos anos 50 e outros, muitos dos quais não conheci diretamente. [Noto aqui que 50% eramos mulheres]. Quase todos haviam terminado a Universidade ou a haviam abandonado e se haviam somado ao trabalho assalariado e se haviam incorporado às lutas sindicais. A organização se estruturou no início, em duas frentes: de bairro e sindical e se ampliou com a integração de outros muitos militantes de Buenos Aires e Córdoba sobretudo que a enriqueceram em todos os sentidos. A singular composição de nosso grupo, com uma proporção tão equilibrada de mulheres e onde as tarefas não se diferenciavam por sexo, dava pouco lugar a reivindicações de tipo feminista. As atitudes machistas pareciam fora de contexto ou totalmente insustentáveis. Recordo a nossa querida “Perinola” e a Elsa Martínez enfrentando a polícia que reprimia nas ruas de La Plata uma manifestação, com o mesmo ardor e eficiência com que o faziam seus companheiros masculinos. As duas morreram tragicamente e sua lembrança nos enche sempre de emoção como também o de Yogurt que era soldado quando desapareceu e Cristina que havia passado a outro grupo. Dentro da organização interna do grupo de La Plata, a autogestão era uma prática essencial e indiscutível. Funcionava como estilo de vida e como solução ao muito que empreendíamos dados nossos recursos mais que mínimos. Estava a carpintaria na qual trabalhavam meus três filhos e outros companheiros cujo número variava e durante um tempo, uma oficina de expressão infantil inspirada nas experiências de educação libertária históricas que incorporamos criticamente. Iniciávamos as crianças na expressão plástica, corporal e musical. Creio que todos compartilhávamos uma muito forte sensação de plenitude, de vivermos a fundo, de amar-nos e de amar a luta e tudo o que ela encarnava de mais autêntico.”
Entre 75 e em 76 começa uma forte perseguição contra o grupo Resistência Libertária pelo que seus membros decidem levantar acampamento e reacomodar-se em diferentes lugares, alguns vão a Buenos Aires, outros a Córdoba outros ficam em La Plata. María Esther no começo de 76 viaja à Europa, mas tira uma passagem de avião com a ideia de voltar para poder alojar-se junto a seu filho Marcelo em Córdoba. Este reencontro não será possível já que em dois meses Marcelo desaparece. Exilada na França contribui para fundar grupos de solidariedade com os desaparecidos e prisioneiros políticos na Argentina e na Comissão de Boicote à copa do mundo de 78 entre outros. No ano de 1978 desaparecem seus outros dois filhos, Pablo Daniel e Rafael, junto com Hernán e Elsa Ramírez e outros companheiros do Resistência Libertária.
Em 1984 volta a Argentina e começa a militar nas Madres de Plaza de Mayo (Mães da Praça de Maio) de La Plata, nesse mesmo ano começam os julgamentos contra os genocidas, e se produz o indulto do Governo, María Esther volta a iniciar os julgamentos contra os genocidas mas esta vez na França. Nunca baixou os braços e esse é seu maior legado, caminhou por todos os lados sempre levando seus princípios ao alto, manteve seus ideais nas boas e nas más horas, como maioria e como minoria, com apoio e sem ele, nunca se cansou de lutar. Soube estar sempre vinculada aos setores populares em luta, soube dar ouvidos a jovens e não tão jovens e soltar algumas palavras que serviram para seguir construindo.
Sempre predisposta ao debate soube brindar-nos uma bela palestra no ano de 2007 em nossa biblioteca onde falou sobre a experiência do anarquismo nos anos 70 e como boa militante soube ver as inquietudes de alguns jovens e sem pressa mas sem pausa, organizou uma mateada em sua casa para continuar com o debate com a perspectiva de seguir organizando a luta.
Tristes nos deixa sua partida, mas sua luta deixou uma marca que nenhum tipo de autoridade poderá jamais apagar.
María Esther Tello sempre teus e da Anarquia!
Comissão Administradora da Biblioteca Popular José Ingenieros
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Tradução > Sol de Abril
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Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!